12 Monkeys, série do canal Syfy que estreou em janeiro de 2015, tem uma base extremamente complexa, duas obras de ficção científica que fizeram escola e marcaram seus tempos, uma dando origem a outra e, juntas, despertando os produtores Terry Matalas e Travis Fickett (que já haviam trabalhado juntos como roteiristas em Nikita e Terra Nova) a entrarem de cabeça em um show que definitivamente não é para fracos, para impacientes e para pessoas que têm preguiça de pensar.
Baseada em La Jetée / A Pista (1962) e em Os 12 Macacos (1995), a série desponta como uma jornada de difícil digestão a princípio, podendo facilmente afastar espectadores apressados e que não estão muito interessados em ver o final da temporada para encontrar algum sentido em toda a saga. E devo dizer que estes espectadores estão cobertos de razão. Aliás, é esta a razão que faz com que esta primeira temporada de 12 Monkeys não seja uma aventura brilhante. Toda a primeira parte e suas cansativas repetições do mesmo motor dramático para dar em mais uma realidade distópica e objetivos frustrados acaba enjoando o espectador. Mas estamos nos avançando demais aqui. Tentemos do começo…
Era uma vez, James Cole. Interpretado pelo ator Aaron Stanford (o Pyro de X-Men 2 e O Confronto Final), ele é uma peça de suma importância para a salvação do mundo. O ano da trama é 2043, e o planeta Terra foi praticamente dizimado por um vírus. Poucas pessoas sobreviveram à praga, tornando-se imunes, todavia, a sociedade restante não se organizou de forma nem um pouco harmônica, mesmo sob essas circunstâncias “finais”. Cole e seu grande amigo José Ramse vão parar em um local onde estão fazendo testes para mandar as pessoas ao passado e tentar mudar, na origem dos acontecimentos, aquilo que futuramente iria acabar com a humanidade. Cortar o mal pela raiz, o vírus antes de ser liberado. Então as viagens no tempo começam e muitas linhas temporais se abrem. Muitas mesmo.
É muito importante que o espectador de 12 Monkeys tenha visto, se não as duas, pelo menos uma das obras que inspirou a série. Isso é importante para que não haja falsa expectativa e que se entenda aonde os produtores querem chegar. Ao conhecer o que veio antes, o público já sabe o que será de Cole no final (a não ser que a série mude isso, mas acho difícil), de modo que essa “surpresa” não é a grande coisa em pauta, mas sim o processo que o personagem faz até chegar àquela situação.
A equipe de roteiristas investiu em uma dinâmica procedimental em basicamente todo o início e miolo da temporada, com alguns episódios mais bem construídos que outros, uns ruins e outros bons, mas todos eles marcados pelas estranhíssimas idas e vindas que o público custa a se acostumar. A este problema sequencial, temos Aaron Stanford e Amanda Schull, Cole e Cassandra, que não mostram muita coisa no início e, a meu ver, passam quase a temporada inteira tentando entregar performances palatáveis, acertando o tom apenas nos três episódios finais. Claro que isso é um ponto a ser levado em conta, pois temos séries em que os atores jamais acertam o tom, em temporada alguma, mas o fato de estarmos em um drama de complicados paradoxos, encontros e desencontros através do tempo, fica difícil não cobrar ainda mais da dupla que encara a maior parte da narrativa.
A produção tem um bom resultado no uso de tecnologia e mostras das realidades visitadas. A direção de fotografia normalmente utiliza o azul e o verde para o futuro distópico (solidão e podridão) e destaque de cores neutras para o presente (2015, principalmente) onde boa parte das coisas acontecem. Em dado momento, o vermelho passa a ser uma cor que motivará um grupo misterioso, com uma Testemunha que fala, prevendo acontecimentos.
Após os primeiros contatos entre Cassandra e Cole, sabemos onde eles irão se encontrar e isso tira um pouco o gosto das surpresas, mas acaba funcionando a longo prazo. Os diretores e diretoras também imprimiram bom ritmo aos episódios, todos eles, com destaque para os que narram algumas versões do encontro do vírus ou a fuga de Cole de alguns problemas encontrados ao longo de sua jornada. Em todo esse tempo praticamente não há trilha sonora destacável e, mesmo quando ela tende a aparecer de maneira mais intensa, ao final, não combina muito com o episódio, parece um corpo estranho. Canções não se tornam um elemento muito bem vindo nesse Universo, apenas peças instrumentais, usadas com moderação.
Quando chegamos ao capítulo 11, Shonin, o melhor episódio da temporada, absolutamente tudo faz sentido e, a bem da verdade, é aí que a série começa. O espectador entende e até gosta da forma como a coisa foi construída, olhando a partir dessas informações preciosas o que já viu, mas a condução repetitiva de toda a série até aquele momento não é apagada e contribui para uma recepção mais fria de todo o ano.
Os roteiros ainda nos apresentam diversas realidades dentro de cada linha temporal, principalmente em 2015 e 2043. Essas linhas são interessantes porque trazem ameaças para cada uma das realidades, que se confrontam estando afastadas por 28 anos e espalham pelo tempo e pelas vidas de algumas pessoas desejos particulares e corporativos completamente diferentes. Esse tipo de enfrentamento me lembrou bastante as temporadas 3 e 4 de Continuum, com a diferença de que aqui temos planos de realidades querendo neutralizar-se a partir de um projeto monumental que, ao longo dos episódios, nos prova que não é algo tão bom assim. Claro que estamos falando de tecnologia de ponta e viagens temporais, mas a coisa toda não é simples, não se faz sem sacrifícios e há algumas importantes limitações, o que particularmente acho sábio, caso contrário, abriria as portas para ações que simplesmente acabariam com a graça da série em pouco tempo.
A partir de Shonin, a maioria das interações ficam claras e interessantes para nós. As atuações melhoram e alguns ótimos encontros começam a acontecer. Todavia, o fato de estarmos no final da temporada traz também o pequeno incômodo de novidades que só serão respondidas na fase seguinte. E isso é bom? Sim! Convenhamos que a forma como é colocado não se mostra tão maravilhosa, mas o seu resultado — neste final, já estamos lidando com improbabilidades e coisas não pré-programadas; fora do destino e do controle daqueles que testemunharam o tempo, acrescentando um pouquinho de enigma a um enredo já bem conhecido — finaliza a temporada com um estado das coisas que é impossível não animar a qualquer um para continuar acompanhando a série.
De uma grande empresa de biotecnologia, teorias da conspiração, exércitos organizados desde a infância de seus soldados, viagens no tempo, múltiplas linhas temporais e motivações escusas, 12 Monkeys conseguiu, a muito custo, um resultado positivo em sua temporada de estreia. Há muito ainda a ser conquistado, mas os produtores provaram que, mesmo tropeçando nas repetições, conseguem dar verdadeiro sentido a tudo o que fizeram e armam uma cama de gato através do tempo da qual nenhum de nós consegue sair. Parece coisa do destino.
12 Monkeys – 1ª Temporada (EUA, 2015)
Criadores: Terry Matalas, Travis Fickett (inspirado no roteiro de La Jetée, de Chris Marker e no roteiro de David Webb Peoples, de Os 12 Macacos).
Direção: Jeffrey Reiner, David Grossman, Michael Waxman, David Boyd, Alex Zakrzewski, John Badham, T.J. Scott, Magnus Martens, Mark Tonderai, Dennie Gordon
Roteiro: Terry Matalas, Travis Fickett, Natalie Chaidez, Rebecca Kirsch, Richard Robbins, Christopher Monfette, Sean Tretta, Oliver Grigsby
Elenco: Aaron Stanford, Amanda Schull, Kirk Acevedo, Barbara Sukowa, Demore Barnes, Emily Hampshire, Andrew Gillies, Noah Bean, Tom Noonan, Todd Stashwick, Murray Furrow, Alisen Down
Duração: 43 min. (em média, cada episódio)