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Crítica | A Aventura da Cozinheira de Clapham, de Agatha Christie

Nunca despreze a simplicidade.

por Luiz Santiago
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Publicado pela primeira vez no The Sketch (jornal semanal britânico focado em notícias e entretenimento para a alta sociedade e aristocracia britânicas) em 1924 e já editado em uma coletânea no ano seguinte, A Aventura da Cozinheira de Clapham é um dos contos do livro Os Primeiros Casos de Poirot e narra a história de como o detetive belga passou a dar atenção também aos casos mais triviais, banais, desinteressantes que lhe parecessem à primeira vista. Sendo parte da primeira e longa fase de contos e romances da Rainha do Crime, A Aventura da Cozinheira de Clapham traz alguns pequenos atropelos ou ausências narrativas que não veríamos nas obras da escritora já poucos anos depois. Todavia, este caso de Poirot é inteligente, engraçado e, para enervar qualquer leitor metido a detetive, cheio de surpresas tiradas a partir do óbvio, o que torna tudo ainda mais prazeroso quando revelado.

A aventura começa com uma conversa entre Poirot e seu amigo e assistente Arthur Hastings (uma espécie de Watson), que lê algumas tragédias em um jornal capaz de transformar tudo em sensacionalismo e pergunta ao detetive em qual daqueles casos ele estava interessado, ao que o belga responde: em nenhum. Ele precisava de um dia para fazer algumas coisas pessoais e apenas um caso muito importante, algo de impacto nacional, poderia tirá-lo de seus planos naquele dia.

Neste ponto é que começa a ser plantada a “moral da história”, já adiantada no primeiro parágrafo desta crítica. Essa visão de mundo, a valorização tanto do que parece ser extremamente importante quanto do que parece ser algo estupidamente comum se estabelece como um mandamento essencial para Poirot, fazendo-o descobrir coisas realmente importantes durante as investigações sobre a cozinheira Eliza Dunn, que desaparecera da casa de sua patroa sem deixar informações precisas, um mistério que ele inicialmente desprezara.

O texto de Agatha Christie não é amplamente detalhista quanto aos lugares, comportamento dos poucos personagens centrais (embora o único que realmente é afetado por isso seja o Inspetor James Harold Japp, detetive da Scotland Yard, que recebe apenas uma vaga citação de Poirot), ambientes e “pistas falsas”, até porque se trata de um conto. Dentro dessa forma, tal disposição textual é aceitável, embora não sem ressalvas. Se olharmos para a trama fechada, veremos que ela é até bastante simples, mas sutilmente marcada por MacGuffins que são a “chave perdida” para a solução final que nos escapa e com os quais a autora claramente se deixa brincar, manipulando o público.

A Aventura da Cozinheira de Clapham é a prova de como a simplicidade de uma história pode enganar muita gente. Até a última página o leitor pensa que está terminando uma “historinha menor” de uma “investigação que não deu certo”, uma surpresa em se tratando de Agatha Christie. Mas os eventos, em dado ponto, se fecham de forma rápida e com poucos diálogos somados de um salto abrupto — o que não é necessariamente algo negativo, mas chega a incomodar — gerando uma situação a partir da qual temos a resolução do caso, cruel até demais para o que se escondia na superfície plácida de um simples relato de uma cozinha desaparecida.

A Aventura da Cozinheira de Clapham (The Adventure of the Clapham Cook) — Reino Unido, 1924
No Brasil: Os Primeiros Casos de Poirot, Editora Nova Fronteira
Autora: Agatha Christie
12 páginas

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