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Crítica | A Possessão do Mal

por Lucas Borba
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Ao ler o subtítulo desta crítica, “e a proposta?“, é compreensível que você fique no mínimo insatisfeito. Afinal, é totalmente destoante do título e anticlimático para um texto sobre uma obra de terror.

Pois adivinhe, leitor ou leitora, é exatamente isso que você sentirá ainda pela metade deste longa com menos de uma hora e meia de duração: que sua proposta se perde no meio do caminho. Na trama – dirigida por David Jung, que também trabalhou no roteiro -, o documentarista Michael King (Shane Johnson) – profissão que não ganha mais dimensão para o protagonista além da conveniente ao filme – decide provar a inexistência do sobrenatural submetendo-se a todo tipo de ritual satânico ou de possessão.

O argumento para essa iniciativa do documentarista é bem construído logo no começo do longa, de modo coerente, verossímil, com o próprio King registrando essa justificativa. Há quem possa julgar a reação e atitude do homem infantil ou forçada diante do luto, talvez como um modo de negá-lo ou superá-lo, mas falamos de um ser humano como personagem e comportamentos assim são bem mais frequentes do que se imagina. Seja como for, a premissa do ceticismo não é novidade no terror, mas a disposição do documentarista para encarar qualquer risco, expor-se voluntariamente ao maligno, juntamente com o tom realista que vende como narrativa fisga o expectador com facilidade no princípio da fita e faz com que de fato fiquemos tensos com uma possível ameaça, seja lá de onde venha ou como se manifeste.

Para variar, no entanto, quando a ameaça enfim surge a coisa descamba e a atmosfera de tensão construída até então perde quase toda a sua força.

A questão não é que o filme queira ou não nos fazer crer em Deus ou no diabo. Produções como Invocação do Mal fazem suas ameaças convincentes a nível psicológico com recursos sutis – uma respiração momentânea ou mesmo um bater de palmas é o bastante – sem pregar uma ideologia em nossa cara com exagero, mas aqui ela não tarda a se manifestar de modo explícito a todo momento, com gemidos de Smeagol e jogos sonoros contínuos que, a certo ponto, realmente nos deixam quase tão loucos quanto o protagonista, mas de tédio, de uma overdose de falta de diálogo com a realidade, o extremo oposto – perdão pela redundância – do que nos é vendido. O roteiro cai em uma limitação conveniente: repare que ao buscar por ajuda quando a coisa fica preta, King recorre exatamente às mesmas pessoas que o “auxiliaram” em seu objetivo inicial, simplesmente não procurando por mais ninguém na face da Terra para socorrê-lo daquela situação – ainda que a tentativa não funcionasse, é claro, seria mais um ponto de sustentação ao pretenso realismo do longa. Acontecimentos futuros também são antecipados com facilidade graças ao script previsível, que não deixa nem o bom e velho brinquedo infantil de lado – outro recurso simplesmente utilizado com mais frequência do que com eficiência.

Por sorte, Johnson cumpre bem seu papel e retrata a degradação de seu personagem, isso sim, com grande esmero. Ainda que com maior facilidade para se deixar levar por cenas menos sutis de loucura, seu trabalho é de longe o ponto mais alto do filme. A trilha sonora, muito discreta, também funciona, e o silêncio musical predomina, o que seria muito bom se não fossem os referidos gemidos e barulhos constantes – King já deixa mais do que claro o quanto eles são insuportáveis.

Com um final ao menos interessante, que usa um flashback como ferramenta de revelação – algo pouco visto em conclusões cinematográficas -, acaba que temos mais um filme de terror com mais do mesmo. Talvez pareça ainda pior, contudo, quando a produção finge o contrário, enganando seu público.

A Possessão do Mal (The possession of Michael King), EUA – 2014
Direção: David Jung
Roteiro: David Jung, Tedi Sarafian
Elenco: Shane Johnson, Ella Anderson, Cara Pifko, Krystal Alvarez, Tomas Arana, Luke Baines, Dale Dickey, Cullen Douglas, Michael Ray Escamilla, RJ Farrington
Duração: 83 min.

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