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Crítica | Além da Eternidade

por Luiz Santiago
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Em 1943, estreou nos Estados Unidos o filme Dois no Céu (A Guy Named Joe), filme de Victor Fleming que se passa na 2ª Guerra Mundial, onde o piloto Pete (Spencer Tracy) sobe ao “Paraíso dos Pilotos” e é nomeado como anjo da guarda de um grupo de pilotos de treinamento. Durante as filmagens de Tubarão (1975), o diretor Steven Spielberg e o ator Richard Dreyfuss começaram a conversar e a fazer citações e brincadeiras sobre este clássico de 1943, que ambos gostavam muito, especialmente Dreyfuss. A brincadeira até rendeu um easter-egg em Poltergeist: O Fenômeno (1982), filme que Spielberg co-escreveu e produziu. No final da década de 80, surgiu, enfim, a oportunidade para a realização de um projeto de refilmagem, e Spielberg e Dreyfuss se juntaram novamente, agora, para criarem algo sobre o qual falaram e brincaram por tantos anos.

Escrito por Jerry Belson (baseado no roteiro a oito mãos de 1943), Além da Eternidade mantém a questão mística/espirital em cena, mas não em um cenário de guerra. Aqui, Richard Dreyfuss dá vida ao piloto Pete, que trabalha no combate de incêndios florestais. Sua fama é de grande irresponsabilidade, bravura e loucura enquanto está com seu avião em missão, o que o colocou em diversas enrascadas ao longo da carreira, fazendo com que a namorada Dorinda (Holly Hunter) lhe desse um ultimato sentimental. Mas as cosias não saem como planejadas e Pete acaba indo para o céu, onde conhece Hap (Audrey Hepburn, em sua última e rápida performance no cinema), um anjo que lhe dá a missão de inspirar um novato na área. Começa então uma jornada de aprendizado para todos os personagens centrais da trama, abrindo as portas para um embolado dramático que mais atrapalha do que ajuda o filme.

No momento em que dirigiu Além da Eternidade, Spielberg já tinha experiência em trabalhar tanto com cenários grandiosos, especialmente envolvendo aviões (1941 – Uma Guerra Muito LoucaImpério do Sol), quanto em criações mais sentimentais, flertando com o melodrama, como visto em A Cor Púrpura. Essa experiência pregressa fez com o que o diretor colocasse na tela, de modo bastante natural e fluído, o romance relativamente incomum entre Pete e Dorinda — levando em consideração que são personagens difíceis e com um relacionamento que funciona dentro da dinâmica passivo-agressiva — ao mesmo tempo que apresenta os perigos da profissão de piloto. Não existem subterfúgios, muito embora essa visão só funcione mesmo nos minutos iniciais e finais da obra, porque todo o restante é focado em aspectos como o romance e suas dificuldades, situação que parece uma montanha-russa dramática, não dando espaço para o bloco de “treinamento de piloto novato” funcionar e atrapalhando ou interrompendo abruptamente a ação de Pete como “espírito inspirador”. A proposta simpática e até emotiva que o roteiro traz, permanece e é capaz de emocionar alguns espectadores, mas a quantidade de desvios que esse mesmo texto apresenta compromete a história.

No trajeto de aprendizado de todos, temos variações comportamentais que também não se adequam no montante da história. Reparem, por exemplo, no personagem de John Goodman e sua relação com Dorinda e depois com Ted (Brad Johnson). Nenhum desses estágios emocionais se fixa ou se desenvolve por completo, e isso piora porque o roteiro joga com algo que julga ser um “suspense adequado” e estende demais a dúvida sobre o destino deles ou os coloca em situações simplesmente impossíveis de digerir, como aquela que Dorinda assume no final da película. Desta parte, o único ingrediente realmente positivo é a ótima fotografia de Mikael Salomon (que no mesmo ano teria outra obra fotografada nos cinemas, o excelente O Segredo do Abismo). Nem a música de John Williams consegue o seu efeito de arrebatamento e tensão, voltando a ser notada de maneira infelizmente clichê no deslumbramento final, em uma cena que conclui a jornada anunciada desde o primeiro bloco, deixando-nos com uma promessa de felicidade, mas sem a força necessária para que a sessão termine em par com a promessa.

Existem bons momentos de diversão no filme, com Ted imitando duas cenas de John Wayne em O Homem que Matou o Facínora (1962), o uso da bela canção Smoke Gets In Your Eyes, do The Platters, e até uma excelente brincadeira com a saudação Vulcana com o personagem de Goodman na reta final, em uma sequência intercalada com o melhor momento da direção de Spielberg e montagem de Michael Kahn (de Indiana Jones e a Última Cruzada, que estreou no mesmo ano) em todo o filme. Boas referências e pontualidades técnicas, no entanto, não são o bastante para gerarem um grande filme. E assim ficamos com Além da Eternidade. Um filme menor, mas charmoso e emotivo, de Steven Spielberg.

Além da Eternidade (Always) — EUA, 1989
Direção: Steven Spielberg
Roteiro: Jerry Belson (baseado no roteiro de Frederick Hazlitt Brennan, Chandler Sprague, David Boehm e Dalton Trumbo)
Elenco: Richard Dreyfuss, Holly Hunter, Brad Johnson, John Goodman, Audrey Hepburn, Roberts Blossom, Keith David, Ed Van Nuys, Marg Helgenberger, Dale Dye, Brian Haley, James Lashly, Michael Steve Jones, Kim Robillard, Jim Sparkman
Duração: 122 min.

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