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Crítica | Androides Sonham com Ovelhas Elétricas? (BOOM! Studios)

por Guilherme Coral
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Por mais que sejam compostos de texto impresso e imagens, os quadrinhos trazem muito mais similaridades narrativas com o cinema do que a literatura em si, embora essas duas não deixem de dialogar entre si. Especialmente nos exemplares mais modernos da nona arte, observa-se a preocupação em criar histórias cinematográficas, tendo em mente, claro, possíveis adaptações para as telonas. Isso, porém, é fruto da forma como captamos tais histórias, permitindo que nossos cérebros garantam movimentos àquelas imagens estáticas, que devem funcionar em sintonia com o texto escrito a fim de nos proporcionar uma leitura fluida, dinâmica.

Adaptar, portanto, um livro para os quadrinhos não é exatamente uma tarefa fácil, visto que estamos falando de ritmos de leitura bastante diferentes entre si. A versão do livro Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?, de Philip K. Dick, criada pela editora Boom! Studios é, pois, uma proposta extremamente corajosa, já que adapta, letra por letra, o texto original do livro que inspirou Blade Runner. Essa coragem, contudo, não salva essa história em quadrinhos de ser algo extremamente maçante e trágico em um nível que chega a ser até cômico. Dito isso, como não há diferenças entre a história desse volume para o romance original, não entrarei em detalhes sobre o texto em si, seus simbolismos e questões filosóficas – para isso, vocês podem ler a crítica escrita pelo nosso editor Ritter Fan, bem aqui.

Ao descobrir sobre essa obra, imaginei, de imediato, que a ideia seria manter a história, com todos os diálogos, na íntegra, transformando as narrações de ação em imagens, como qualquer adaptação visual. A realidade, porém, não é bem essa. Embora estejam presentes na imagem, as ações dos personagens também aparecem como texto impresso – algumas vezes esse recurso acrescenta informações adicionais ao leitor, continuando a ação mostrada em cada quadro, mas, na maior parte das vezes, ela apenas reitera o que já estamos vendo nas ilustrações de Tony Parker, funcionando como mera constatação do óbvio, ponto que consideravelmente prejudica o ritmo da leitura, além de trazer algumas risadas involuntárias pela extrema redundância apresentada por tais quadrinhos.

Para piorar, quase todos os diálogos contam com trechos de narração do autor, indicando quem falou o quê, por mais que os balões apontem para a boca dos personagens. Tal recurso demonstra um preciosismo extremo por parte da editora, que muito bem poderia ter cortado tais trechos, visto que, também, podem ser categorizados como pura repetição. Essas características funcionam apenas para desvalorizar a arte de Tony Parker, que se torna inteiramente dispensável, como um livro ilustrado e nada mais – não existem informações adicionais nos painéis, apenas a interpretação do artista sobre esse mundo criado por K. Dick.

Não que a arte de Parker seja algo que mereça muita atenção. Ela é pasteurizada, ilustrada e colorida, por Blond, digitalmente, aspecto que não dialoga nada bem com o ar noir presente na obra original. A caracterização dos cenários claramente é inspirada no filme de Ridley Scott, mas há uma notável ausência de cores e contraste entre essas e a forte presença do preto de maneira que realmente capte a nossa atenção. Salvo pelas excelentes e criativas capas, essas sim bem encaixadas com o tom da narrativa, toda a arte não surte efeito algum no leitor, corroborando o que já foi dito sobre ela ser dispensável.

Dito isso, sequer podemos encarar essa adaptação de Androides Sonham com Ovelhas Elétricas? como possível alternativa para a leitura do livro original, visto que sua narrativa é extremamente travada por redundâncias que tornam toda a arte um mero detalhe perdido em um excesso de palavras, muitas das quais poderiam ser cortadas a fim de permitir que o texto impresso e as imagens melhor dialogassem entre si. Trata-se de uma experiência extremamente enfadonha e visualmente repetitiva, que mais nos afastam do excelente romance de Philip K. Dick do que efetivamente nos mergulha em sua história.

Androides Sonham com Ovelhas Elétricas? (Do Androids Dream of Electric Sheep?) — EUA, 2009/11
Roteiro:
Philip K. Dick
Arte: Tony Parker
Cores: Blond
Letras: Richard Starkings
Editora original: Boom! Studios
Data de lançamento original: 2009 a 2011
Editora no Brasil: não publicado até a data de publicação da crítica
Páginas: 635

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