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Crítica | As Tartarugas Ninja: Fora das Sombras

por Matheus Fragata
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estrelas 2

Provavelmente para o meu azar e definitivamente para a sorte de minha mãe, eu não entrei na febre consumista gerada pelo sucesso das Tartarugas Ninja. Mesmo tendo nascido em plenos anos 1990, o grupo de répteis ninjas nunca me despertou grande fascínio ou curiosidade. Estava ocupado demais cuidando de meus Pokémons e assistindo religiosamente aos episódios do infindável Dragon Ball Z. Hoje, por mais que eu fosse desinteressado pelas aventuras reptilianas na infância, não consigo negar a audácia e espírito empreendedor de Kevin Eastman e Peter Laird.

O primeiro longa concebido na produção de Michael Bay após a compra da Nickelodeon sobre os direitos autorais do grupo ninja se aproximava do tom mais sombrio idealizado por seus corajosos criadores. Mesmo apostando em um público diferente, o filme foi um sucesso de bilheteria. Agora, a sequência abandona esses ares mais densos e aposta na pegada mais leve oferecida pelo seriado animado de 1987.

Com a prisão de Destruidor, as tartarugas mutantes Raphael, Michelangelo, Leonardo e Donatello aproveitam a vida noturna de Manhattan – ainda que escondidos no anonimato. Porém, logo esse período de tranquilidade é suspenso. O invasor alienígena Krang libertou Destruidor de seu encarceramento para que ele auxilie na construção do portal para a Dimensão X a fim de transportam sua máquina de guerra suprema para dominar o mundo. Além disso, os brutamontes geneticamente modificados, Rocksteady e Bebop, tornarão tudo ainda mais complicado.

Appelbaum e Nemec retornam com um roteiro menos deplorável do que apresentaram anteriormente. Aliás já é ótimo deixar claro que Fora das Sombras é um avanço em relação ao As Tartarugas Ninja de 2014 – porém isso não salva o novo trabalho dos recorrentes erros da dupla atrapalhada. Agora visando um público mais infantil, os autores parecem não se preocupar em oferecer boas soluções para os inúmeros problemas que criam visando inserir reviravoltas para injetar vida ao filme. Para reparar na “qualidade” dessas resoluções segue um exemplo: Casey intima um bartender a fornecer um GPS para localizar Bebop e Rocksteady. Como ele não colabora com seu pedido, Casey passa a destruir o bar até que ele ceda o dispositivo. Inacreditavelmente, o plano do vigilante dá certo. Ao longo do filme, outras soluções mais absurdas, fáceis, de cunho deus ex machina estão presentes.

Essas escolhas são dúbias demais por três motivos: tudo é muito previsível, tudo é muito clichê e tudo é muito preguiçoso. Isso atinge diretamente o trabalho com os novos personagens – principalmente Casey Jones, já que Bebop e Rocksteady sempre foram personagens de alívio cômico com desenvolvimento pífio até mesmo no seriado animado. A dupla mutante de capangas cumpre bem o seu propósito ainda que os roteiristas recorram, ocasionalmente, a piadas sem graça, escatologia e pouca ou nenhuma variedade de linhas de diálogo para os criminosos.

Com Casey Jones, a dupla arrisca elementos novos na história do personagem agora representado nas telonas como um policial impaciente que sonha em se tornar detetive, mas que mantém uma segunda vida como vigilante mascarado. Muito do núcleo pede bastante da suspensão da descrença, porém rende ótimos momentos cômicos em seus encontros com as tartarugas. Passado isto, há um interesse romântico com April, mas nada consegue elevar o personagem. É o equivalente a Rocksteady e Bebop do lado dos heróis, só que desprovido de carisma e interesse. A atuação de Stephen Amell, um dos piores atores da safra, não colabora em nada, mas é risível vê-lo contracenar com Megan Fox, outra atriz tão “boa” quanto Amell.

Felizmente, as tartarugas possuem muito mais tempo em tela trazendo um ótimo conflito que move um drama interno no grupo, ainda que seja inteiramente copiado de Shrek 2. Trata-se do velho dilema do ser ou não ser monstro, já que a gosma que energiza o portal de Krang tem a capacidade de reverter a mutação das tartarugas – algo que não faz muito sentido se pensarmos melhor. Logo, esse conflito tem relevância por abordar situações – muitas vezes forçadas, que tangem o preconceito, a intolerância, a honestidade, honra, liderança e integridade do grupo o que afeta diretamente Leonardo que é a única tartaruga que recebe algum desenvolvimento adequado para a história. Claro, tudo muito superficialmente tratado, mas exposto satisfatoriamente, afinal, é complicado esperar algo surpreendente em Fora das Sombras. Infelizmente, o conflito inteiro é redundante, a jornada não se conclui apropriadamente.

Já Destruidor, Krang, April O’Neil, Vernon e Baxter Stockman são personagens de uma nota só. Não há nada que salve, incluindo a atuação bem medíocre do elenco “humano”. Só Tyler Perry salva com bons momentos de comédia e caricatura.

Na direção, para nossa sorte, sai Jonathan Liebesman, entra o desconhecido Dave Green. Assim como Liebesman, Green mimetiza os vícios de Michael Bay. A diferença mesmo se encontra no tom cômico, caricato e infantil que o longa assume. O diretor mexe bastante a câmera, optando por alguns planos sequência logo no primeiro ato – um desperdício aliás, já que a ação de combate só vem a partir da metade do filme. Algo que ele mantém e que continua bizarra é a movimentação das tartarugas que sempre se movimentam com acrobacias radicais. Aparentemente, é impossível para elas andarem no simples passo de tartaruga.

A ação, em grande parte, também é boa e diverte bastante. Mesmo que ele utilize muitos instrumentos bizarros ou que não casam com a continuidade da cena, consegue montar a sequência de modo que o espectador entenda perfeitamente o que se passa na tela. Todavia, todo o cuidado em organizar uma boa sequência some quando o clímax da obra chega. Investindo muito pesado no CGI e com vários elementos acontecendo entre as lutas corporais das tartarugas, é praticamente impossível compreender as coreografias.

O único elemento técnico artístico que pode comprometer é a trilha musical de Jablonsky, o compositor mais desonesto de Hollywood. Quando suas composições não copiam seus trabalhos anteriores de Transformers, plagia o trabalho de outros profissionais. Antes, seu alvo favorito era Hans Zimmer. Agora, é Junkie XL. Em algumas das cenas de ação, é impossível não notar que Jablonsky está copiando descaradamente os ritmos frenéticos da trilha de Mad Max. Com isso, não é só o roteiro que consegue ter seus momentos de vergonha alheia…

Não há muita coisa que sustente esse As Tartarugas Ninja: Fora das Sombras. É um filme bem banal, clichê, previsível e bastante irrelevante, mas que funciona bem como entretenimento fácil e divertido. A ação, em sua maioria, é boa e os efeitos visuais devem agradar. Os problemas, como de costume, se concentram mais no roteiro que burocratiza demais uma narrativa simples oferecendo soluções e desenlaces ainda mais frágeis. Certamente não é o filme que os fãs do quarteto mutante de tartarugas ninjas renascentistas tanto clamam, mas é uma obra que pode se revelar um prato cheio para uma nova geração de crianças.

As Tartarugas Ninja: Fora das Sombras (Teenage Mutant Ninja Turtles: Out of the Shadows, EUA, 2016)
Direção: Dave Green
Roteiro: Josh Appelbaum, André Nemec (baseado em criação de Peter Laird e Kevin Eastman)
Elenco: Megan Fox, Will Arnett, Laura Linney, Stephen Amell, Noel Fisher, Jeremy Howard, Pete Ploszek, Alan Ritchson, Tyler Perry, Brian Tee, Stephen Farrely, Gary Anthony Williams
Duração: 112 minutos.

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