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Crítica | Asterix Gladiador

por Ritter Fan
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Esses romanos são realmente loucos!

Afinal de contas, em Asterix Gladiador, eles resolvem sequestrar logo Chatotorix, o insuportável bardo da aldeia gaulesa de Asterix para presentear César com um dos famosos “irredutíveis gauleses”. Primeiro, a notícia do sumiço do bardo é recebido com alívio, mas, depois, com indignação. Ora, Chatotorix pode ser insuportável, mas ele ainda é um gaulês, por Tutatis!

Com base nessa engraçada premissa, René Goscinny manda Asterix e Obelix, pela primeira vez, para Roma. Lá, eles se envolvem com o lanista Caius Obtusus (não sabe o que é lanista? Então deem um pulo na lista de “personagens” logo abaixo) e se alistam para se tornarem gladiadores no Circo Máximo, para uma das mais hilárias aventuras do baixinho bigodudo e de seu amigo gordão.

Como todos os caminhos levam à Roma, Asterix e Obelix pegam carona no navio do mercador fenício Epidemicus, que não tem escravos, mas sim “sócios” que remam a galera para ele, em uma sensacional demonstração do sistema capitalista funcionando a todo vapor. E, chegando na capital do Império Romano (na verdade, mais precisamente ainda a República Romana), a dupla causa o caos nas Termas, com Obelix sendo obrigado a tomar banho e querendo abrir as janelas das saunas e quebrando absolutamente todas as portas que encontram pela frente, inclusive as das jaulas do Circo Máximo, somente para, depois, completamente avoados, resolverem tentar a sorte como gladiadores para socorrer Chatotorix, que será jogado aos leões.

Tudo é uma excelente desculpa para o brilhante roteirista nos fazer passear por Roma e para nos passar uma sensacional lição de latim (vide abaixo!), além de definitivamente mostrar o quão nociva é a música de Chatotorix. O subtexto das grandes cidades e seus problemas volta novamente, como aconteceu em A Foice de Ouro, dessa vez abordando a impessoalidade das relações e a dificuldade da vida em locais onde as pessoas vivem muito perto umas das outras. O maior exemplo disso é quando Asterix e Obelix vão visitar Docontrix, um gaulês que se dispõe a ajudá-los, em seu apartamento no terceiro andar de um prédio, algo que a dupla nunca havia visto. Em poucos quadros, Goscinny cria a perfeita “confusão de condomínio” como provavelmente todos nós já vivemos em algum momento da vida. É o perfeito exemplo de um texto inteligente, historicamente correto e que nos provoca.

Mas o divertimento começa de verdade quando os gauleses finalmente vão para o Circo Máximo e Asterix passa a ensinar jogos de salão para os demais gladiadores, que, para absoluta estupefação de Caius Obtusus e do próprio Júlio César, passam a repeti-los em plena arena mortal. E Uderzo nos desenhos, inspiradíssimo, não só cria gladiadores com personalidade e acurácia histórica, como desenha César e Brutus de maneira sensacional, o primeiro irritado com tudo, fumegando pelas ventas e o segundo alheio a tudo, bobalhão. São quadros para se apreciar com um enorme sorriso no rosto e várias gargalhadas saudáveis.

Asterix Gladiador é puro divertimento, outro tiro na mosca da dupla Goscinny-Uderzo.

Curiosidades: 

– Aprendemos muito latim como apoditerium (vestiário), sudatorium (sauna seca), caldarium (sauna a vapor), frigidarium (piscina de água fria), além de ínsula (prédio), cubiculum (quarto), triclinium (sala de jantar) e, finalmente, os vigiles (policiais).

– A Comissão Internacional dos Helvéticos é mencionada, como uma referência à neutralidade da suíça para tomar decisões de conflitos entre interesses de países. Helvécia é até hoje o nome original da Suíça (Confederação Helvética).

– O diálogo entre César e Brutus faz clara referência ao famoso “Et tu Brute” da peça histórica de Shakespeare que, de tão famosa, quase se tornou fato histórico.

Ave, Caesar, morituri te salutant: Mais latim. Essa é a frase que os gladiadores romanos diziam antes de iniciarem as lutas, que eram até a morte. A frase pode ser traduzida como “Ave, César, aqueles que estão para morrer o saúdam.”

– “Todos os caminhos levam à roma”: frase citada mais de uma vez por Asterix.

– Temos a primeira aparição dos coitados dos piratas, que sempre têm seu navio naufragado por Asterix e Obelix. O pirata principal, de cabelo e barba vermelhos, foi criado como uma paródia de Barbe-Rouge (Barba Vermelha), também publicada na revista Pilote.

– A famosa competição de coleta de capacetes romanos de Obelix também acontece pela primeira vez nesse volume.

– O banquete que tradicionalmente encerra os volumes acontece de dia, algo raro na série.

Locais: Aldeia de Asterix, acampamento fortificado romano de Petibonum e Roma, onde vemos as principais atrações turísticas de hoje em dia (e que, conforme os autores, eram também naquela época), como o Fórum Romano, o Circo Máximo, a Via Appia e as Termas. Além disso, os seguinte locais são apenas mencionados: (1) Fenícia, país que existia onde, hoje, são as regiões litorâneas do Líbano, Síria e norte de Israel, conhecido pelo comércio e sua frota de navios; e (2) Tiro, principal cidade mercantil da Fenícia, localizada hoje na costa mediterrânea do Líbano.

Personagens principais (além de Asterix e Obelix): Panoramix (druida gaulês), Chatotorix (bardo gaulês), Calígula Stafermos (prefeito das Gálias), Gracchus Strupicius (centurião do acampamento de Petibonum), Divertix (menino gaulês que vê o sequestro de Chatotorix), Abracurcix (chefe da aldeia gaulesa), os Piratas (primeira aparição em Asterix), Júlio César (general e ditador romano), Brutus (Marco Júnio Brutus, líder político romano normalmente confundido como filho adotivo de César – foi um dos assassinos de César), Caius Obtusus (lanista romano – recrutador de gladiadores), Docontrix (gaulês dono de restaurante gaulês em Roma que deseja abrir um restaurante romano na Lutécia – Paris), Quebraossus (treinador de gladiadores), Epidemicus (mercador fenício).

  • Crítica originalmente publicada em 19 de novembro de 2014. Revisada e atualizada para republicação hoje, 15/04/2020, como parte da versão definitiva do Especial Asterix do Plano Crítico.

Asterix Gladiador (Astérix Gladiateur, França/Bélgica – 1964)
Roteiro: René Goscinny
Arte: Albert Uderzo
Editora original: Pilote (serializada em 1962 e lançada em formato encadernado em 1964)
Editoras no Brasil: Record (em formato encadernado)
Páginas: 50

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