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Crítica | Bananas

por Luiz Santiago
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Bananas (1971), é o segundo filme dirigido por Woody Allen e o início da delineação de sua persona cinematográfica, que estaria pronta seis anos depois, em sua revolução estética e formal como cineasta (Annie Hall, 1977), e que permearia toda a sua filmografia dali para frente.

Neste segundo filme, Woody Allen conserva em cada sequência a individualidade do humor, com situações totalmente distintas para cada espaço cênico, seguindo a linha do que se convencionou chamar de “estilo piada-piada-piada”, que é, na verdade, reflexo de seus tempos de comediante stand-up.

Bananas é um daqueles filmes que não dão pausa para o espectador, executando o riso do primeiro ao último minuto. Mas apesar do toque predominante do riso na obra, Allen traz à tona uma série de eventos políticos e mudanças sociais ocorridas em toda a América Latina, iniciadas a partir das independências do século XIX e que ganharam novos patamares no século XX. Com base nesse ponto histórico, o diretor realizou uma sátira inteligente mesclando culturas, preconceitos e concepções pessoais sobre os temas escolhidos.

O longa teve locações em Porto Rico e nos Estados Unidos, e conta a história de Fielding Mellish (Woody Allen), um descontente testador de produtos de uma grande empresa que tem sua vida mudada por uma ativista política que bate em sua porta apresentando-lhe um abaixo-assinado. Essa garota de nome Nancy (Louise Lasser), torna-se namorada de Mellish, mas o abandona, dizendo que lhe falta “algo”. Triste e sozinho, Mellish sai do emprego e vai passar férias na República de San Marcos. Sem saber, torna-se alvo de uma conspiração do governo para culpar os comunistas de assassinar um cidadão americano, mas consegue fugir, sendo em seguida atacado pelas costas. Ao acordar, percebe que foi sequestrado pelos rebeldes e fica com eles até o fim da Revolução, quando tomam o poder. Esposito, o líder dos revolucionários, acaba enlouquecendo (promulgando leis do tipo: “todo o cidadão de San Marcos menor de 16 anos, a partir de hoje, terá 16 anos“), e a contra-revolução é articulada com Mellish, como líder. Por “motivos diplomáticos”, ele viaja para os Estados Unidos, mas é descoberto pelo FBI, sendo levado a julgamento, onde faz a sua própria defesa. O final é surpreendente.

A personagem principal de Bananas passa por uma enorme “educação” política, indo do cético e apolítico que abandonou o curso de Estudos Afros na Universidade a líder revolucionário de uma República latino-americana. Não é preciso dizer que toda essa tomada de consciência e preparação para a guerrilha é extremamente hilária. Ainda poderíamos citar a sequência de sua autodefesa no tribunal, certamente uma das melhores sequências cômicas em tribunais, do cinema (nivela-se às excelentes cenas de julgamento no clássico A Costela de Adão, de 1949). Além disso, tudo se torna ainda mais cômico, porque a personagem revolucionária de Mellish é uma sátira de Fidel Castro.

Além de tomar a América Latina como palco de seu humor irreverente, Allen critica a indústria televisiva americana, especialmente os noticiários. Na abertura de Bananas, temos uma transmissão ao vivo feita por um programa de esportes. Observe como é construída essa dualidade satírica: política latina e crítica à TV. A cena descrita abaixo é a abertura do filme:

__ Boa tarde. “Mundo dos Esportes” está na pequena República de San Marcos. Mostraremos ao vivo a vocês um assassinato sumário. O presidente deste adorável país da América Latina será morto, e substituído por uma ditadura militar. Todos estão tremendamente eufóricos. O clima nessa tarde de domingo está perfeito. Vimos uma série de tumultos coloridos, que começou com o tradicional bombardeio à Embaixada americana, um ritual tão velho quanto a cidade. […]

E a abertura se segue até o assassinato do presidente, como previsto. Toda a sequência desse assassinato é esteticamente televisiva, com planos de detalhe na mão do assassino, no revólver, no presidente caindo nas escadarias do Palácio do Governo, etc.. Então aparecem os créditos iniciais, embalados pela canção “Quiero La Noche” , composta por Marvin Hamlish, que assina a trilha sonora do filme.

Woody Allen traz à tona uma realidade social de sua época. Embebidas em humor, vemos as lutas populares, as ditaduras, o sistema jurídico e os relacionamentos trilharem os mais diversos caminhos. Bananas é o início da afirmação de Allen como diretor de cinema. Mesmo sendo um filme quase unicamente composto por quadros de ação cheios de gags, a forma como o cineasta conseguiu enlaçar toda a história faz desta obra uma incrível sátira política e um excelente exemplar de início de carreira.

Bananas (EUA, 1970)
Direção: Woody Allen
Roteiro: Woody Allen, Mickey Rose
Elenco: Woody Allen, Louise Lasser, Carlos Montalbán, Jacobo Morales, Miguel Ángel Suárez, David Ortiz, René Enríquez, Jack Axelrod, Howard Cosell, Roger Grimsby, Don Dunphy, Charlotte Rae, Stanley Ackerman, Dan Frazer
Duração: 82 min.

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