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Crítica | Batman: O Longo Dia das Bruxas

por Luiz Santiago
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Se formos levar em consideração um termo cronológico para as aventuras do Vigilante de Gotham, podemos encaixar O Longo Dia das Bruxas dois anos após Batman: Ano Um e já dentro dos eventos que fazem parte de Batman: Ano Três. A história aborda o período que vai de 31 de Outubro de um ano a outro, onde o Morcegão, ao lado do Comissário Gordon e do Promotor Harvey Dent investigam uma série de crimes executados com um mesmo modus operandi e sempre em uma importante data comemorativa: dia das bruxas, ação de graças, Natal, ano-novo, dia dos namorados, de São Patrício, da mentira, das mães, dos pais, da independência, do trabalho e de Colombo (o chamado “Feriado Romano”, que, na história, tem um duplo sentido).

A ideia original para essa saga veio de Archie Goodwin, que queria juntar novamente a dupla  Jeph Loeb e Tim Sale em uma história de peso para o Batman, uma trama que envolvesse a máfia citada em Ano Um e que ampliasse alguns pontos interessantes para o público. Num primeiro momento, o projeto seria realizado como um arco para a série Lendas do Cavaleiro das Trevas, todavia, ainda em fase de negociações e preparação para o enredo (que contou com conselhos de Mark Waid e a benção explícita de Frank Miller), Archie Goodwin sugeriu à dupla Loeb e Sale uma minissérie, e já então o chamativo título apareceu: O Longo Dia das Bruxas.

Batman e Mulher-Gato: uma relação bastante próxima que pulsa de sexualidade e ambiguidade em toda a minissérie.

Ao trazer à tona alguns elementos dessa nova fase do Morcego, um momento estabelecido após a Crise nas Infinitas Terras, Loeb e Sale arriscaram mexer em um vespeiro canônico de peso, algo que poderia acabar mal. No entanto, o cuidado com a construção do cenário em Gotham para a aparição e resolução do “caso Feriado” (esta última parte, a mais fraca da história), Loeb nos apresentou um sólido e maduro conto de investigação, algo bem adequado a esse momento da carreira do Morcego: o herói dava os seus primeiros passos como vigilante da cidade que resolveu “limpar” e estava muito mais sujeito a erros de julgamento, parcerias estranhas e comportamentos que não necessariamente seriam vistos nos anos futuros de sua vida.

Um outro fator que ajuda a dar contorno à história é a dupla linha de ação, uma narrativa corrente e outra em segredo. No caso da primeira, temos a máfia e os mocinhos num jogo de gato e rato para descobrir o grande mistério: quem é o vilão Feriado? Na outra, temos a construção econômica mas bem realizada de alguém que está pondo fim à vida de diversos membros da família “Romano” Falcone, um alguém cuja identidade irá mobilizar Coringa, Espantalho, Hera Venenosa, Chapeleiro Louco, Charada, além da aparição do Homem Calendário, Pinguim, Solomon Grundy, o surgimento do Duas-Caras (Harvey Dent) e a ajuda vital de Selina Kyle, a Mulher-Gato.

Parece que alguém está com ciúmes de não ter sido convidada para o jantar de Dia dos Namorados.

Vemos que existe um grande número de vilões em jogo e isso com certeza incomoda leitores mais exigentes, principalmente porque esse recurso do “desfile vilanesco” impede que o roteiro desenvolva como deveria os personagens principais, dando desencontrada atenção aos coadjuvantes. Mas não é isso que acontece em O Longo Dia das Bruxas. Os vilões são apenas catalizadores de momentos importantes da história, dando força ao assassinato que está para ocorrer em uma data comemorativa ou feriado específico. Loeb tornou cada participação orgânica e sem muita ambição, o que fez com que elas fossem realmente interessantes, especialmente as do Coringa, Hera Venenosa (desenhada de maneira maravilhosa por Tim Sale) e Espantalho.

A violência também é um ponto de destaque nas páginas da minissérie, não algo fora do normal, mas num patamar que deixe claro para o leitor que se trata de um enredo cujo núcleo são os filmes noir e a alma mafiosa que temos na relação dos Falcone com seus aliados vem diretamente de O Poderoso Chefão. Não é sem justificativa que Christopher Nolan escolheu parte desses eventos para a realização de seu excelente O Cavaleiro das Trevas (2008).

Excelente composição de Tim Sale para a cena do julgamento.

Com os desenhos de Tim Sale, O Longo Dia das Bruxas ganhou uma aparência austera e ameaçadora, afirmando de maneira correta aquilo que o econômico texto de Loeb nos passa. Há até espaço para ironias e brincadeiras estéticas como os traços diferentes do resto das edições e a saturação maior nas cores de Gregory Wright no feriado de Natal e Ano-Novo, quando temos o Coringa em cena; ou na escolha por deixar todos os assassinatos ocorrerem em páginas preto e branco, com um único detalhe colorido: o presente da comemoração deixado por Feriado na cena do crime. Os cenários de Tim Sale também são grandiosos e opressores, o que reafirma o caráter noir das entrelinhas, melhorado por quadros em sépia, difusos, cinza ou em outros filtros de cor; além de uma diagramação inteligente e prática, atendendo de forma criativa as exigências do texto.

Mesmo que o final de O Longo Dia das Bruxas não seja tão satisfatório quanto seu início e desenvolvimento — e aqui refiro-me à revelação e trabalho de encerramento com Alberto Falcone, o Feriado — o produto é instigante e divertido, além de trazer uma longa caçada de Batman, Gordon e Dent a um assassino perigoso. Questões morais como comemorar o assassinato de um bandido e seguir por um caminho politicamente incorreto para conseguir justiça social são abordados durante a história, além de trazer um pouquinho de ambiguidade e “um outro lado” para a origem de seu vilão. Até a brincadeira com Dostoiévski ao citar Crime e Castigo como títulos de abertura e finalização da minissérie tem o seu papel na construção de um panorama geral, algo que com certeza irá agradar a qualquer batmaníaco que goste de enredos bem orquestrados e caçadas macabras por sombras ameaçadoras.

Batman: O Longo Dia das Bruxas (Batman: The Long Halloween) – EUA, 1996 – 1997
Minissérie de 13 edições

Lançamento no Brasil: Editora Abril (1998 – 1999) e Panini (2008)
Roteiro: Jeph Loeb
Arte: Tim Sale
Cores: Gregory Wright
400 páginas

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