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Crítica | Blackfish – Fúria Animal

por Leonardo Campos
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Blackfish – Fúria Animal é um documentário instigante. Professores geralmente enxergam didatismo e aprendizado e tudo, mas falando do ponto de vista de um pai, irmão, padrinho, avô ou até mesmo cidadão, questiono: qual a lição que aprendemos ao visitar e levar um filho, irmão, afilhado, neto ou qualquer outra pessoa para contemplar espetáculos com animais marinhos em parques aquáticos? Sabemos que a vida nos oceanos é de gigantesca beleza, curiosidade e fascínio, mas não estaríamos causando um dano social? Ao colocarmos um animal na ciranda do nosso entretenimento, reforçamos a teoria da dominação, com o uso do forte pelo mais fraco, concorda?

É por essa via que os 83 minutos do documentário em questão trafega, sem derrapar ou deslizar, com discurso muito coeso. O ponto de partida é a morte da treinadora Dawn Brancheau, profissional que durante um “espetáculo” no Sea World, em 2010, teve o braço abocanhado por uma orca macho. Durante o ataque a profissional foi sacudida constantemente e ficou embaixo da água por tempo suficiente para a sua morte por afogamento. O acontecimento suscitou algumas reflexões sobre as práticas humanas diante do mundo animal, ações geralmente predatórias e cruéis. Nos parques elas se apresentam em sincronia perfeita com as músicas. Algumas são “cavalgadas” por treinadores malabaristas. Bonitinho ou ordinário? Eis a questão.

Diante da situação exposta, o documentário apresenta a sua tese que versa sobre o caso: por se manter em condições inadequadas em cativeiro, as orcas tornam-se animais agressivos. Brancheau tinha 40 anos de idade quando a sua morte foi alardeada pela mídia. Com bastante experiência, a profissional tinha “tato” com os animais do parque, o que levanta ainda mais as suspeitas de maus tratos e incorreções na dinâmica administrativa do local. O caso, emblemático, no entanto, não foi o primeiro. Talvez tenha sido a “gota d’agua”.

A produção conta com antigos funcionários e alguns especialistas para traçar a trajetória crítica de Tilikum, orca macho foco do documentário, um dos tantos animais marinhos que vivem em tanques considerados pequenos demais para os seus respectivos tamanhos, alimentação restrita para deixa-los mais ativos no parque e diminuição da expectativa de vida por conta da situação estressante, pois quando esses animais são retirados de seu habitat natural, passam por longos treinamentos, além de não migrarem ou escolherem territórios, tendo que ficar sempre limitados ao ambiente antinatural. Como proposta de intervenção, o que temos é a criação de parques mais regularizados pela lei e transformados em santuários, alocados em ambientes naturais. Não são todos que concordam com as críticas do documentário. Para Jim Atchinson, CEO do Sea Wolrd, a publicidade negativa oriunda com o filme de Cowperthwaite não impactou na continuidade do funcionamento do parque, profissional que tem opiniões que coadunam com as afirmações de Mark Simmons, antigo treinador do local que alegou ser a produção uma “cruzada sensacionalista contra o parque, oriunda de antigos funcionários insatisfeitos”. As opiniões abrem precedentes para debates eufóricos, mas o impacto do documentário foi grande a ponto do roteiro de Procurando Dory ter sido modificado para se adequar as discussões éticas geradas com o tema.

Blackfish – Fúria Animal foi dirigido por Gabriela Cowperthwaite e escrito em parceria com Eli B. Despres e Tim Zinnmermann, realizadores que também assinaram a montagem, equipe que conta com os interessantes gráficos de Syd Garon e a correta direção de fotografia da dupla formada por Jonathan Ingalls e Chris Towey.  A baleia que serve como ponto de partida para toda a discussão, infelizmente, morreu de problemas pulmonares, após uma infecção bacteriana que ceifou a vida de um animal que tinha em média 36 anos quando capturado nas águas da Islândia, em 1992. Levada para um parque aquático no Canadá, em 1999, a orca foi depois vendida para o Sea World, sua “casa” até a data da morte.

Lançado em 2013, Blackfish – Fúria Animal é um documentário sobre questões éticas ligadas ao meio ambiente que desdobram bastante atuais. Em 2016, a administração do parque aquático revelou para a mídia que não vai mais gerar orcas em cativeiro. Basta saber se estão blefando ou sintonizados com o discurso ambientalista politicamente correto. As discussões sobre Direito Ambiental estão bem aquecidas nos últimos anos e alguns documentários tem sido favoráveis para germinar tais debates. No Brasil, por exemplo, a constituição diz que devemos proteger a fauna e a flora e evitar práticas que coloquem em risco as suas respectivas funções ecológicas, provoquem a extinção de espécies ou submetam animais a crueldade. Sabemos como a relação com a lei é um problema não apenas no Brasil, mas no mundo todo, no entanto, só em já termos a possibilidade de discutir o tema dentro de um campo juramentado, a sensação de avanço ganha mais um passo diante das milhas que precisamos percorrer. Na contemporaneidade, o “direito animal” promove reflexões sobre tirarmos os animais da condição de coisa, bens semoventes que servem apenas como meros objetos ou mercadorias de consumo. Ainda há muito a se discutir e esperamos documentários responsáveis como Blackfish – Fúria Animal, produção que levanta questões importantes sem abrir mão da qualidade narrativa.

Blackfish – Fúria Animal — (Blackfish) Estados Unidos, 2013.
Direção: Gabriela Cowperthwaite
Roteiro:  Eli B. Despres, Gabriela Cowperthwaite, Tim Zimmermann
Elenco:  Carol Ray, Dawn Brancheau, Dean Gomersall, James Earl Jones, Jeffrey Ventre, John Hargrove, John Jett, Samantha Berg, Shamu, Thomas Tobin, Tilikum
Duração: 83 min.

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