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Crítica | Blade Runner 2049 (Trilha Sonora Original)

por Guilherme Coral
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A tarefa de compor a trilha sonora de Blade Runner 2049 certamente é tão ingrata quanto a do próprio diretor Denis Villeneuve, que teve de realizar uma sequência, que ninguém pediu, de um dos maiores clássicos da ficção científica. A música de Vangelis para o Blade Runner original é um dos aspectos centrais da criação de atmosfera dessa obra – icônica, ela influenciou dezenas de outros músicos, sejam eles envolvidos com o cinema ou não. Sabendo disso, Villeneuve optou por distanciar Jóhann Jóhannsson, com quem já trabalhara em inúmeros de seus filmes, como A ChegadaSicario: Terra de Ninguém, a fim de contratar Benjamin Wallfisch e Han Zimmer, cuja missão era criar algo mais próximo das composições de Vangelis.

Mesmo com certo pesar, por ter visto o talentoso Jóhannsson distanciado do projeto, não há como negar a qualidade do resultado entregado por Wallfisch e Zimmer. O primeiro já havia nos surpreendido com a trilha de A Cura, de Gore Verbinski e demonstrou saber trabalhar bem ao lado de Zimmer, como visto na trilha de Dunkirk, que traz algumas notáveis similaridades com essa de 2049, embora, em geral, sejam essencialmente diferentes. O que escutamos aqui nesse álbum são melodias amplamente atmosféricas, ligadas intrinsecamente ao filme, de tal forma que não há como imaginá-las fora desse contexto – aspecto esse que, claro, praticamente impede que ela seja escutada sem o acompanhamento da imagem (a menos que o ouvinte esteja em um estado contemplativo).

Há um quê de meditação em grande parte desse álbum, aspecto, claro, que perfeitamente combina com o existencialismo do filme, algo muito bem percebido na faixa Mesa – antes dela enveredar por tons acelerados, que fazem uso de sons sintéticos e alguns efeitos sonoros, similarmente à trilha de Dunkirk. Para a obra de Christopher Nolan, Zimmer fez uso dos sons de motores de barcos e do avião Spitfire, já aqui ele utiliza o ronco de motos, que, por sua vez, encaixam-se com os ruídos emitidos pelos veículos do filme, com o som diegético e não-diegético se misturando constantemente, de tal maneira que um passa a complementar o outro.

Nota-se, também, o uso pontual do teclado (e piano ocasionalmente) nas melodias mais dramáticas, algumas vezes acompanhados pelas cordas e sutis vocais, esses, que, em determinadas faixas, assumem tons graves, criando desconforto no ouvinte. Não por acaso essas são ligadas à figura de Wallace, misterioso antagonista da obra. Dessa forma, Zimmer e Wallfisch nos levam em uma jornada que requer a entrega de quem escuta suas composições, com músicas que pedem não que as escutemos, mas que as sintamos, similarmente ao trabalho fotográfico de Roger Deakins.

O mais impressionante é como todo esse trabalho inevitavelmente nos remete às composições de Vangelis para o primeiro filme, mas sem soar como uma cópia e sim como uma verdadeira continuação. São trabalhos distintos, mas que dialogam entre si, cada um bem representando a atmosfera do filme de que faz parte. A própria presença de Tears in Rain, reorquestrada e nomeada de Tears in the Rain, mostra o respeito dos dois compositores pelo trabalho do músico grego, aspecto que, também, pode ser observado nos temas principais do álbum, que contam com trechos que parecem ter sido tirados da trilha de Blade Runner, porém, seguindo por um caminho diferente.

Minha única ressalva em relação ao álbum em si (e não como a trilha se encaixa no filme) é a presença de canções pré-existentes, como Can’t Help Falling in Love, de Elvis Presley, ou Summer Wind, de Frank Sinatra, pois elas representam fortes rupturas na atmosfera criada pelo álbum, tirando o ouvinte da imersão proporcionada pelas faixas originais. Uma alternativa seria jogar tais músicas para o fim do álbum, como um bônus, com o objetivo de não prejudicar a harmonia estabelecida pelas outras faixas.

Mesmo com tal deslize, pertinente à estrutura do álbum e não às composições em si, Hans Zimmer e Benjamin Wallfisch demonstram que souberam captar exatamente o que Denis Villeneuve queria para seu mais recente filme. A trilha de Blade Runner 2049 respeita o que veio antes dela e segue por novas direções, não tentando copiar Vangelis e sim tomando-o como inspiração. Trata-se de uma trilha atmosférica por excelência, que nos joga de cabeça nesse universo e que requer entrega do ouvinte, que deve escutá-la quase em estado de contemplação, já que distanciar essa obra do filme em si é o mesmo que recortar uma obra de arte única.

Blade Runner 2049 (Trilha Sonora Original)
Compositor: 
Hans Zimmer, Benjamin Wallfisch
País: 
Estados Unidos
Lançamento: 
5 de outubro de 2017
Gravadora:
Epic Records
Estilo: 
Trilha Sonora

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