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Crítica | Deadpool #1 a 5: Ei, é o Deadpool! (1997)

por Giba Hoffmann
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O ano é 1997. Em meio à ressaca do surto coletivo dos roteiristas da Casa das Ideias que recebeu a alcunha de Massacre Marvel é que, após estrelar duas minisséries com relativo sucesso, o ainda neófito Deadpool estrelaria sua primeira revista mensal. Com Joe Kelly a cargo dos roteiros e Ed McGuinness cuidando da arte, a revista traria importantes contribuições na construção do personagem e de seu modo de funcionar em aventuras solo, cuja influência pode ser percebida até os dias de hoje.

Após uma edição de estreia mais-ou-menos autocontida que funciona como espécie de piloto para a série, vemos os eventos ali retratados se desdobrarem em um arco ao longo das próximas edições. O enredo deste arco inaugural se apoia de maneira geral sobre as interessantes pontas soltas deixadas astutamente por Mark Waid em Pecados do Passado. Temos aqui o retorno do Doutor Killebrew, da subtrama envolvendo a falha no fator de cura de Wade, bem como menções a Black Tom Cassidy e a presença de sua sobrinha Theresa – a Siryn da X-Force – por quem o mercenário agora nutre um amor platônico.

Desenvolvendo de forma satisfatória essas subtramas, na verdade o foco de Kelly aqui parece ser o de se utilizar desse panorama para articular aventuras episódicas do personagem que giram em torno de seu encontro com algumas figuronas do Universo Marvel, ao mesmo tempo em que desenvolve-se um novo elenco de apoio exclusivo para o personagem. Já na edição inaugural temos a primeira aparição de Patch, C.F., T-Ray e outros frequentadores da Hellhouse, casa de mercenários onde Deadpool tenta tirar o seu. Já no ramo da vida pessoal temos o retorno do grande amigo Fuinha a a primeira aparição da Al Cega, que chega marcando presença assim sem muita explicação mesmo.

É notável o quanto a série traz consigo a marca da época em que foi produzida, em especial no que tange às batidas de comédia. O estilo do humor presente neste arco é muito mais noventista do que o apresentado nas duas minisséries inaugurais. Temos a já tradicional avalanche de referências à cultura pop, mas que aqui são justapostas em trocas rápidas de diálogo ao melhor estilo de Os Simpsons ou do Gênio de Aladdin. O tom da auto-sátira espirituosa lembra um pouco o tom irreverente de animações como Tiny Toons e Darkwing Duck, o que é acompanhado graficamente por um estilo cartunesco e humor pastelão que se encontrava em voga com os sucessos de O Máskara e da obra-prima atemporal Space Jam.

Se descrevendo assim podemos ter a impressão de que a produção se afasta do tipo de comédia que caracteriza o personagem, por sorte Joe Kelly demonstra uma grande habilidade na escrita dos diálogos, que em nenhum momento poderiam soar menos “deadpoolescos”. Toda a range da conturbada psique de Wade Wilson dá as caras ao longo deste arco inaugural, e é notável o quanto o autor não se usa de muletas narrativas em excesso para chegar neste bom resultado. Em geral, no entanto, a pegada que predomina é a de um Deadpool mais frágil, inocente e menos sacana, o que faz sentido no contexto da história em questão.

Trata-se de uma abordagem diametralmente oposta à que temos na fase de Daniel Way, por exemplo, onde o personagem é retratado com diálogos mais ao estilo curto e grosso” e com momentos de caracterização mais pontuais. Aqui, a voz de Wade fica bastante alinhada com a que temos com Scott Lobdell, o que na minha opinião sinaliza um acerto. Ao longo dos encontros com Sasquatch, Treinador e até mesmo com o Hulk, sem deixar de fora o bizarro romance com Siryn, temos a sensação de acompanhar uma versão relativamente humanizada do personagem, o que sempre é bom para construir a tensão e a entrega humorística dos momentos mais caóticos. A relação com Theresa e com Al Cega nos mostra uma faceta divertida do personagem, na situação rara em que contracena com pessoas com paciência o suficiente para aguentar suas palhaçadas numa boa.

Em termos de enredo, não temos nada de muito inovador. Talvez a grande novidade, no contexto da época, tenha sido justamente fugir das narrativas escalafobéticas das grandes sagas e contar histórias pequenas e despretensiosas. Como seria a visita do Deadpool à escola do Treinador? E uma luta com o Sasquatch? O reencontro com Killebrew? E se a única forma de se manter vivo fosse arrancar sangue do incrível Hulk? Premissas simples que são exploradas no modelo “curto e grosso” que fazem com que a leitura voe sem estagnar nos vórtices de auto-referência e hipérbole que costumam povoar os quadrinhos da época. As soluções tendem a ser ingeniosas e trazer uma boa dose de humor, o que funciona para nos fazer simpatizar cada vez mais com o protagonista, o que é sempre bem-vindo.

Essa abordagem episódica e a construção do divertido elenco de apoio renderia ótimos frutos mais à frente, onde a série traria algumas das melhores histórias já produzidas com o personagem (Com grandes poderes, vêm grandes coincidências, estou olhando pra você!). Neste arco inicial, o que temos é uma leitura bastante leve e descompromissada que traz um Deadpool bem caracterizado, porém carecendo de uma arte que sustente o tom energético e as cenas de ação da forma que o roteiro pediria. Embora o traço cartunesco do estreante McGuinness caia como uma luva para a tonalidade visada por Kelly, o traço simplista e sem muitos detalhes sobreposto à arte-finalização do início da era de produção digital traz um visual inconstante que, por vezes, acaba parecendo plástico demais e caracendo de dinâmica para a narrativa. Ao menos alguns layouts de página quebram um pouco a monotonia, e é inegável que as cores vibrantes e as inspirações no estilo popularizado à época derivado do mangá têm sua parcela de charme.

O arco de estreia de Deadpool em sua revista mensal vem sem muitas surpresas, mas cumpre bem a missão de adaptar o personagem para o formato, ao mesmo tempo em que não perde tempo em evocar pontos interessantes da continuidade do personagem e combiná-los com encontros bastante divertidos com outras figuras do Universo Marvel. Forte nos diálogos e derrapando um tiquinho no campo da arte, trata-se de uma leitura que vale a pena ser conferida pelos entusiastas do Piscina Morta.

Deadpool v1 #1 a 5 (EUA, Janeiro de 1997  Maio de 1997)
Publicação no Brasil: Marvel 99 #1 a 5 (Ed. Abril, Janeiro a Maio de 1999); Deadpool Clássico #2 (Ed. Panini, Junho de 2016)
Roteiro: Joe Kelly
Arte: Ed McGuinness, Nathan Massengill
Capa: Ed McGuinness
Editora: Marvel Comics
Editoria: Bob Harras
Páginas: 125

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