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Crítica | Deadpool

por Rafael W. Oliveira
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É de se notar a recepção acalorada que o público deu para Deadpool quando este personagem, desconhecido do grande público em linhas gerais, embarcou pela primeira vez em um projeto solo. Após uma primeira incursão apagadíssima e inexpressiva no infame X-Men Origens: Wolverine, foram anos de desenvolvimento (cerca de 10) e uma grande repaginação da péssima imagem que sua primeira encarnação nos cinemas havia deixado para que seu intérprete, Ryan Reynolds (ator de altos e baixos como a refilmagem de Horror em Amityville e o surpreendente Enterrado Vivo), conseguisse levar à cabo a ideia de levar Deadpool com fidelidade à sua principal característica dos quadrinhos: a absoluta irreverência.

Claro que, na onda dos inúmeros filmes de heróis lançados anualmente, e que são formulados para jamais serem proibidos a uma faixa etária menor do que 12 anos, investir nas ideias e conceitos que marcam o personagem em suas histórias de origem, como a violência desmedida e o humor politicamente incorreto, significaria nadar contra a maré de tal forma a colocar em risco todo um planejamento de uma década. Mas Reynolds foi em frente e, com um orçamento de “meros” 58 milhões, um investimento diminuto se considerarmos o tanto que se gasta em produções desta linha atualmente, deu vida ao filme do mercenário tagarela com todos os palavreados que tinha direito.

A chave para Deadpool, é claro, está em estender a irreverência para além do personagem, carregando o deboche para a própria produção, o histórico dos filmes de super-heróis, ou até mesmo para seu intérprete, que em meio aos bem-vindos toques de ironia dos roteiristas Rhet Reese e Paul Wernick, também não escapa de toda a zoação que comanda o espírito de Deadpool. Pode parecer fácil carregar tudo em cima do humor, uma vez que a própria Marvel Studios estabeleceu a fórmula de seus filmes em cima de uma comicidade que hoje lhes é indispensável, mas o diferencial de Deadpool está na pontualidade com que as tiradas são inseridas e pipocam da boca dos personagens, além dos (perdoem meu francês) colhões em investir pesado numa violência gráfica pouco usual para o gênero de heróis.

Apresentado como “mais um filme de super-herói” com “uma garota gostosa”, “um personagem de CGI” e “um vilão britânico”, Deadpool parte do princípio mais chulo possível quando resolve transformar Wade Wilson (Reynolds), um ex-oficial das Forças Especiais, numa espécie de herói às avessas (ou anti-herói, como preferir) que resolve ir atrás dos responsáveis por suas deformações na pele após Wade ter aceitado participar de experimentos devido ao surgimento de um câncer terminal. Reynolds, os roteiristas e o diretor novato Tim Miller (ou “um diretor qualquer muito bem pago”, como afirmam os créditos iniciais) sabem que não há nada de novo para ser extraído daí, e se jogam de cabeça no que o personagem criado por Rob Liefeld realmente têm a oferecer: um espírito ácido, humor afiado e sem muitas papas na língua, e uma imperdoável tiração de sarro que não deixa de fora nem mesmo Hugh Jackman, Lanterna Verde ou Um Lugar Chamado Notting Hill.

Claro que, como qualquer produção que precise desse cinismo todo para sobreviver e aposte nisso ininterruptamente, nem tudo o que sai da boca de Deadpool funciona, por mais que haja extrema boa vontade para levar o público a rir enquanto corpos vão sendo dilacerados numa perseguição de carros, e o que leva o protagonista a empacar em certos momentos é essa vontade extrema de querer ser cômico o tempo todo. Também não há como disfarçar a estrutura básica que há por debaixo de toda a comicidade corajosa, e o clímax se leva a sério demais quando se limita ao confronto básico cheio de barulhos e explosões entre nosso anti-herói e o vilão. Miller e Reynolds suprem esses deslizes quando o primeiro elabora uma narrativa dinâmica e não-linear pautada por sequências de ação bem construídas (e que usam com inventividade o tão banalizado slow motion), enquanto o segundo aposta todo o seu carisma na construção da figura de Deadpool e, sabendo do quanto está à vontade no papel, deita e rola no que há de mais imprudente em relação ao personagem. Só é uma pena que, diante do frescor e vitalidade do mercenário, o restante dos personagens seja apagado, estereotipado e até desperdiçado quando o roteiro sub-aproveita suas habilidades, em especial a fantástica Gina Carano, ex-lutadora de MMA.

Mas Deadpool se faz satisfatório quando balanceia quase que perfeitamente a violência desmedida com o humor inconsequente e nos apresenta com eficácia um personagem antes desconhecido entre os maiores nomes do cinema de heróis atual. É carismático, é irreverente, é tagarela, é cínico e é deveras divertido. Isso é Deadpool.

Deadpool (Idem, EUA – 2016)
Direção: Tim Miller
Roteiro: Rhett Reese, Paul Wernick (baseado no personagem criado por Rob Liefeld e Fabian Nicieza)
Elenco: Ryan Reynolds, Morena Baccarin, Karan Soni, Ed Skrein, Michael Benyaer, Stefan Kapicic, Brianna Hildebrand, Style Dayne, Kyle Cassie, Taylor Hickson, Ayzee, Naika Toussaint, Randal Reeder, T.J. Miller, Isaac C. Singleton Jr., Gina Carano
Duração: 108 min.

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