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Crítica | Demolidor: Teia de Mentiras

por Luiz Santiago
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Se procurássemos uma única palavra para definir a vida do Demolidor e a sequência de coisas que acontecem a ele de volume para volume em suas revistas, essa palavra seria “tragédia”. A vida do herói é constantemente atormentada por eventos que o colocam em vários limites de precipício, todas com algum tipo de padrão recorrente a partir dos anos 1980, a saber, fortes dramas psicológicos, religiosos e, muitas vezes, a ocorrência de um trágico destino para as pessoas que estão à sua volta.

Quando começou a escrever para a Daredevil em Um Novo Começo (Volume 3 das aventuras do Demolidor), Mark Waid direcionou sua atenção para duas bases na vida do herói: a civil, atormentada por fantasmas do passado e sempre representando riscos em demasia para muita gente; e a heroica, bombardeada por vilões que resolvem enlouquecer o Demolidor através de intricados planos de vingança.

À medida que os capítulos da fase Mark Waid avançam, os eventos se tornam progressivamente sombrios e com uma linha narrativa que empurra Matt Murdock e o Demolidor para situações que nos lembram os eventos de A Queda e Diabo da Guarda, excluindo o fator religioso e contando apenas com o lado psíquico tendenciosamente frágil e paradoxalmente resistente do herói, um lado que já sofreu injúrias diversas e já foi fortemente abalado e atormentado outras vezes. Deixar o Demolidor louco, violento, neurótico, perdido ou confuso parece ter se tornado o passatempo favorito dos vilões de Nova York.

Coiote: aquele que fez o Demolidor perder a cabeça. Literalmente.

Seguindo a situação de desconfiança e separação entre Matt e Foggy vista em Medo e Delírio na Latvéria, Waid começa a desenvolver a explicação para os tormentos do Demolidor nesta saga. Ou pelo menos é o que achamos (e estranhamos) após a leitura das edições #19 a 21. O Coiote aparece e se revela uma carta manipulada para fazer o serviço sujo da vez, um esquema criminoso e parasita envolvendo o Mancha (que apareceu em DD #1) e pessoas usadas como escravas para os mais diversos fins.

A “primeira verdade” aparece, mas é apenas um detalhe sutil e nada revelador. Se por um lado, Waid nos tira o peso do desequilíbrio mental do herói, por outro, adiciona questões de ordem passional e moral que agem de forma bastante eficiente no público leitor, segurando-o e atraindo-o cada vez mais para a saga. Essa vitória, no entanto, tem um custo: as primeiras edições do arco parecem soltas e levemente insatisfatórias pelo seu teor particular, um sentimento mais ou menos parecido com o que tivemos quado da aparição do Toupeira e seus Toupeiroides em Os Amigões da Vizinhança. Não se trata de um momento ruim do encadernado e entendo que é uma ponte entre dois estágios da crise em andamento, mas seu tom e ritmo incomodam-nos consideravelmente.

A partir da edição #22 temos o retorno ao alto patamar estabelecido por Waid na trama psíquico-emotiva do Demolidor nesta era. O Homem-Aranha (versão Doutor Octopus) e uma outra carta manipulada, o Metaloide, aparecem em cena, assim como a interessante assistência do Homem-Formiga (versão Hank Pym) na identificação de elementos químicos e informações adicionais para o Demolidor agir. A separação entre Matt e Foggy chega ao fim e uma triste revelação (ou grave suspeita) se apresenta nos últimos quadros da edição. Segue-se uma intrigante e muitíssimo bem escrita jornada dupla na vida do Homem Sem Medo: de um lado, o suporte que ele dá ao melhor amigo e a tentativa de administrar as coisas com Kirsten McDuffie; de outro, o surgimento de mutantes criados especialmente para lutar contra o Demolidor, um experimento que irá culminar na aparição sublime de Ikari/Fúria nas últimas páginas do arco.

Mais um diabinho solto pelo mundo. Um inimigo à altura do Demolidor. E com um algo a mais.

Teia de Mentiras começa com uma transição de qualidade mediana mas rapidamente alça voo e consegue um ótimo resultado final. Se imaginávamos ter algum tipo de resposta para a ligação entre os vários pontos ativos, estávamos enganados. Mark Waid brinca com diversos tipos de verdade e ao mesmo tempo que torna a história mais sombria e perigosa para o Demolidor, não deixa de inserir momentos de humor nervoso ou quebras dramáticas bem vindas no decorrer das edições. A arte de Chris Samnee dá uma identidade mais suja aos ambientes, com seus traços predominantemente grossos e ressaltados pela bela finalização cartunesca de Tom Palmer. Mais um capítulo do azar cotidiano do Demolidor ganha corpo e não há nenhuma luz no fim do túnel.

Demolidor Vol. 3 – #19 a 25 (EUA, 2012)
No Brasil: Demolidor #4: Teia de Mentiras (2014)
Roteiro: Mark Waid
Arte: Chris Samnee
Arte-final: Tom Palmer
Cores: Javier Rodriguez
148 páginas

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