Home QuadrinhosArco Crítica | Detective Comics #33 a 40: Primeira Aparição de Robin, Hugo Strange e Cara-de-Barro

Crítica | Detective Comics #33 a 40: Primeira Aparição de Robin, Hugo Strange e Cara-de-Barro

por Luiz Santiago
588 views

As duas primeiras páginas da Detective Comics #33 (The Batman Wars Against the Dirigible of Doom) contam a origem do Homem Morcego, com o assassinato de Thomas e Martha Wayne, a promessa de vingança feita pelo jovem Bruce e sua formação e preparo físico, tornando-se um “brilhante cientista e um exímio atleta“, para usar as palavras da própria revista. O roteiro, escrito pelo ausente Bill Finger, em parceria com Gardner Fox, é um dos mais fracos dessa temporada. Os acontecimentos chamam a atenção do leitor pela arte e não pela história, que deixa de lado a atmosfera um pouco mais sombria e ameaçadora dos contos anteriores e aposta em uma aventura de guerra, claramente influenciada pelas batalhas aéreas que então ocorriam na Europa, fustigada pelos primeiros meses da ofensiva nazista.

A história tem sua abertura em Manhattan, quando o dirigível da Hora Escarlate do professor Carl Kruger, que sofre de “Complexo de Napoleão”, aterroriza a cidade com seus raios vermelhos compostos de gás ozônio e raios gama. Basicamente temos a corrida do Batman para impedir que a arma voadora de Kruger mate pessoas inocentes e domine o mundo — uma forte referência ao embate entre Eixo e Aliados.

Algo muito interessante acontece na edição seguinte, Peril in Paris. Dois meses depois da história no estilo Drácula que Batman viveu na Hungria (Detective Comics #31 e 32), voltamos no tempo e partimos do ponto em que Bruce Wayne põe sua noive Julie em um navio de volta para a América e vive uma perigosa aventura em Paris. Trata-se, na verdade, de outra história fraca de Gardner Fox, com apenas a arte de Bob Kane e Sheldon Moldoff (que agora também co-assina a arte-final) sobressaindo-se com folga. Na trama, Batman conhece os irmãos Charles Maire (o Homem sem Rosto) e Kael Maire, ameaçados pelo demoníaco duque de Orterre, que apagou todos os traços do rosto de Charles — isso mesmo, você leu direito! — e pretende desposar a bela Kael. Toda a reta final dessa história mais a sua conclusão são bastante ruins, incorrendo em erros constrangedores de verossimilhança dentro do próprio universo do herói. Definitivamente, considero essa uma das piores histórias da primeira fase do Batman.

batman plano critico detective comics 33 a 40

A primeira coisa que podemos dizer sobre a edição #35, The Case of the Ruby Idol, é que a capa é completamente falsa. Quando a vi pela primeira vez, achei que se tratava de alguma coisa sobre o Dr. Morte ou mesmo algum parente distante do Duque Orterre. Mas não há nessa aventura nenhuma situação sequer parecida com a representada na capa, algo que podemos chamar de “mais uma descarada propaganda enganosa, apenas para vender a revista!”. O caso aqui é simples, e marca a volta de Bill Finger, sozinho, aos roteiros da Detective Comics: um certo Sheldon Lenox tem posse de uma estátua grande de rubi, uma representação de Kali, a deusa hindu da morte e da sexualidade (mas a aventura não explora o lado sexual da deusa).

Esse Sheldon Lenox vende a raríssima estátua para um colecionador, que passa a receber cartas ameaçadoras. Lá para o final da história aparece um chinês chamado Sin Fang, receptador de coisas roubadas em Chinatown, palco principal da trama. No final das contas, o verdadeiro criminoso é Lenox, que forja sua morte e se disfarça de chinês, contrata mercenários hindus e lutadores mongóis (veja só que samba étnico!) e acaba tendo de lidar com o Batman, no final. Não é o melhor conto de Bill Finger, mas não é um conto ruim, principalmente pela quantidade de ação e das armadilhas que o Batman encontra pelo caminho, na tentativa de capturar a mortífera deusa Kali.

Bill Finger nos apresenta na revista #36, Professor Hugo Strange, uma pérola de sua safra. A primeira aparição desse personagem nas histórias do Batman vem em um roteiro perfeito, com uma linha de ação cadenciada, sem efeitos escabrosos, bat-aviões, pilotos automáticos ou coisas do tipo. A história é acompanhada por uma arte nova, assinada por Bob Kane e seu novo parceiro, Jerry Robinson, que trabalhou muitíssimo bem as fronteiras dos quadros da história e apostou bastante nos primeiros planos nos rostos dos personagens e no maior número de pessoas por quadro. Ver o Batman enfrentando todos aqueles bandidos ao mesmo tempo em uma perspectiva mais próxima que nas edições anteriores é um grande presente para o leitor e fã do herói.

E a aventura é tão maluca quanto o próprio professor Strange: ele sequestra um engenheiro e o força a construir uma máquina. Com o aparato, submete a cidade a uma espessa neblina, que dificulta e muito a ação da polícia, ou seja, um cenário perfeito para se cometer roubos e fugir com o mínimo de risco de ser pego. O caminho realizado pelo roteirista e pelos artistas é de uma legítima e interessante história policial, algo a ser aplaudido efusivamente. Não preciso nem dizer que essa é uma das minhas histórias preferidas da primeira fase do Batman na Detective Comics.

plano critio orterra detective comics

Até que demorou bastante para aparecer alguma história do Batman enfrentando sabotadores e maquinações internacionais com o objetivo de jogar os Estados Unidos contra algum país. Mas essa edição #37, The Screaming House, está recheada de ações ligadas ao tipo de história denominada como “intrigas internacionais”. Arte aqui é menos inspirada do que na edição anterior. O roteiro de Bill Finger começa fraco — desde quando o Batman resolve pedir informações para moradores de uma casa no meio do nada? Dá vontade de rir, só de pensar nisso — e termina muito bem, com um toque interessante de nacionalismo, mas não daqueles doentios, neuróticos ou fascistas. Vale também dizer que o Batman sofre bastante nessa história, sendo encurralado e passando por maus bocados, saindo um pouco daquela imagem de “intocável” que tinha no início das suas aventuras. E a violência também continua, com mais uma morte tenebrosa… The Screaming House é um conto interessante de Bill Finger e também mais um link dos quadrinhos com casos políticos da época.

E vejam só quem aparece pela primeira vez na Detective Comics #38: Robin the Boy Wonder! A criação de Robin (Dick Grayson) foi uma jogada da editora para aplacar os ânimos dos que acusavam a Detective Comics de ser muito violenta, e que o Batman estava “passando dos limites” na luta contra o crime. A chegada de um garoto e parceiro do Morcego, ao menos em tese, deveria diminuir a violência e, por tabela, trazer novos leitores. A violência, é claro, não diminuiu, mas realmente apareceram novos leitores e o personagem foi um tremendo sucesso, contribuindo até para que outros grandes heróis da editora passassem a ter seus pupilos no combate às forças do mal contra as quais lutavam.

A revista também marca uma mudança editoral, com a saída de Vincent Sullivan do cargo de Editor-Executivo e a entrada de Whitney Ellsworth. Também temos Jerry Robinson como arte-finalista, deixando Bob Kane sozinho novamente nos desenhos, o que não foi uma grande ideia, diga-se de passagem. O roteiro de Bill Finger nos apresenta uma boa história detetivesca, desde a origem do Robin, com o assassinato de seus pais, no circo, e o início de seu treinamento e parceria com Batman. O primeiro inimigo que enfrentam junto é o chefe Zucco, mafioso que comanda Gotham e cobra tarifas de todos os trabalhadores da cidade, além de ser o dono de todos os pontos de jogos de azar.

O ritmo de Finger é impressionante. Temos a ótima sensação de uma cadência adequada da narrativa, com a passagem exata do tempo por cada fase da trama, desde a apresentação fatídica até a luta final, no topo do Edifício Canin. E nessa luta temos o prodigioso Robin dando um tremendo chute em um bandido, que acaba caindo do alto do prédio… Quem imaginou que a violência diminuiria com a chegada de Robin à revista não estava completamente certo.

plano critoco detective comics primeira fase surgimento do robin

Infelizmente, a Detective Comics, e mesmo a revista Batman, lançada no primeiro semestre de 1940, deixaria essa violência de lado e passaria por algumas fases infantiloides. A primeira delas nos anos 1950, com a perseguição do Comics Code e a publicação do maior lixo editorial dito acadêmico já lançado contra os quadrinhos, o livro Sedução dos Inocentes (Seduction of the Innocent), do estapafúrdio Frederic Wertham. De toda forma, o surgimento de Robin, na DC #38, marcaria uma nova fase na cronologia dos quadrinhos do Homem Morcego.

Na Edição #39, The Horde of the Green Dragon, publicada em maio de 1940, a dupla dinâmica enfrentaria outro caso detetivesco, mas dessa vez, nada parecido com a máfia italiana. O caso é sobre o Dragão Verde, uma gangue chinesa de venda de ópio que matava violentamente (com machadinhas na cabeça!) os que se punham em seu caminho. Batman & Robin são ajudados pelo prefeito Wong, de Chinatown, o mesmo prefeito que havia contribuído no caso do Ídolo de Rubi…

Já a Detective Comics #40, The Murders of Clayface, trouxe um novo vilão para o Homem Morcego e o Menino Prodígio: o Cara-de-Barro (Basil Karlo), personagem de poucos atrativos, apenas um gângster que foi um ator de filmes B de terror e que agora estava dominado pela personagem que interpretara anos atrás. Tampouco a arte da revista é boa. A ausência de cores e boa parte dos quadros e a péssima finalização de Jerry Robinson só tendem a repelir o leitor. Como cinéfilo, gostei bastante do conceito de Bill Finger para o roteiro, de fazer o cenário da história nas filmagens de um remake de  terror (O Castelo Pavoroso), uma história tipicamente à margem, mas essa, infelizmente, sem o seu famoso brilho de bom escritor.

Detective Comics Vol.1 #33 a 40 (EUA, 1939 – 1940)
Roteiro: Bill Finger, Gardner Fox
Arte: Bob Kane, Sheldon Moldoff, Jerry Robinson
Arte-final: Bob Kane
Letras: Sheldon Moldoff
Capas: Bob Kane, Creig Flessel
Editoria: Vincent Sullivan, Whitney Ellsworth
55 páginas

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais