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Crítica | Emboscada (1947)

por Luiz Santiago
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Emboscada (1947) é um convite de aparência noir feito por Douglas Sirk para olharmos através das primeiras impressões, para desvendarmos o mistério de uma série de assassinatos e para rirmos um pouco em meio à tragédia.

Após lançar O Que Matou Por Amor (1944), adaptação de uma obra de Tchekhov, Sirk continuou por algum tempo na seara dos filmes policiais e noir, trazendo à luz Vidocq, Um Escândalo em Paris (1946) e Flor do Mal, filme no qual ele esteve envolvido apenas brevemente, dirigindo algumas cenas iniciais*.

Assim, Emboscada não parece um elefante branco na filmografia do diretor, que, apesar de sua fama como o Mestre (ou “príncipe”, em algumas classificações) do Melodrama, teve basicamente quatro fases estruturais espalhadas por sua carreira: uma tragicômica, uma noir, uma de filmes de guerra e outra de melodramas.

Para um espectador que se ressente facilmente pelo fato de ter sido ‘enganado’ por trailers ou cartazes, Emboscada parece ser um filme destinado a seu desafeto. A maior parte da divulgação da obra destaca Lucille Ball e Boris Karloff como sendo protagonistas ou peças centrais da trama, mas não é exatamente isso que acontece. A dupla contracena uma única vez no filme e o personagem de Karloff, apesar de interessantíssimo – porque traz o ambiente macabro recorrente na filmografia do ator –, não acrescenta muito à trama, é apenas um chamariz de público sem o qual o filme passaria bem e talvez estivesse até melhor, porque seria mais curto.

Quem na verdade terá destaque na obra é George Sanders (primeiro ator-fetiche de Sirk, antes de Rock Hudson) e Charles Coburn, que rondarão a personagem de Lucille Ball com intenções diferentes, as quais o roteiro fará questão de problematizar. Como é bastante comum nas obras sirkianas, a personagem feminina recebe forte destaque e é tratada como heroína, sendo a única que, de forma inocente e um pouco irresponsável, aceita correr riscos para tentar encontrar o assassino.

Por se tratar de um ambiente quase noir (“quase”, porque nem todos os ingredientes do gênero se fazem ver aqui), o cenário dos assassinatos, os detalhes intricados como os poemas plagiando Baudelaire, os encontros em lugares escuros durante a noite e o diálogo entre o cenário detetivesco e uma espécie de submundo urbano ajudam a chamar a atenção do espectador pelo realismo e naturalismo, duas vertentes que se chocam na fotografia sombria e no tom misto de gêneros que pontuam o texto.

O ponto mais deslocado de todo o processo é a comédia, inserida aqui pela presença de Lucille Ball no elenco. A bela ruiva consegue uma interpretação aceitável na maior parte do tempo, mas não há dúvida que seu ponto fraco é o drama ao qual sua personagem foi submetida. Suas melhores cenas são ao lado de Boris Karloff e George Sanders, mas fica difícil para o público aprovar a postura insípida da atriz quando demonstra frustração ou tenta trazer à tona uma exibição dramática de sentimentos.

O que não se pode negar é que Lucille Ball tem os melhores figurinos do longa, um ótimo trabalho de Elois Jenssen, que se tornaria amiga da atriz e seria convidada por ela para cuidar do guarda-roupa de I Love Lucy (1951 – 1957), a icônica série da CBS capitaneada por Lucille Ball e seu esposo Desi Arnaz.

Douglas Sirk faz uma brincadeira de gato e rato em Emboscada e consegue um bom resultado final. É claro que desajustes no elenco e no roteiro (a já apontada estranheza da comédia) contribuíram para uma diminuição de sua qualidade, mas isso não significa que a obra seja dispensável. Aliás, o espectador tem aqui a oportunidade de ver um elenco improvável reunido e uma história que, pelo menos em alguns momentos, lhe fará roer as unhas por não suportar o suspense ou a atmosfera sufocante de que algo muito ruim está para acontecer.

* O restante de Flor do Mal foi dirigido pelo cineasta Edgar G. Ulmer.

Emboscada (Lured) – EUA, 1947
Direção: Douglas Sirk
Roteiro: Jacques Companéez, Simon Gantillon, Ernst Neubach, Leo Rosten
Elenco: George Sanders, Lucille Ball, Charles Coburn, Boris Karloff, Cedric Hardwicke, Joseph Calleia, Alan Mowbray, George Zucco, Robert Coote, Alan Napier, Tanis Chandler
Duração: 102 min.

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