Home Espetáculos Crítica | Ennio Morricone em Paris (2014)

Crítica | Ennio Morricone em Paris (2014)

por Sidnei Cassal
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Não há cinéfilo no mundo que não conheça Ennio Morricone. O compositor italiano possui em seu currículo mais de 400 trilhas sonoras, muitos clássicos que as pessoas conhecem e cantarolam sem nem saber de quem é, qual filme, ou mesmo que foram compostas para algum filme. Há mais de 10 anos sem se apresentar em Paris, o novo concerto de Morricone era muito aguardado na capital francesa, onde praticamente lotou a Arena Bercy, também conhecida como Palais Omnisport, com capacidade para aproximadamente 17 mil pessoas, quando ocupada sua área central, que é utilizada como quadra para jogos. Não pude assistir o maestro quando ele se apresentou em São Paulo em 2008, então eu também aguardava muito ansioso esta oportunidade de vê-lo ao vivo.

Cheguei a perguntar a um dos funcionários da Arena, que aguardam o público em cada uma das entradas para auxiliá-los a encontrar seus lugares, se a acústica do lugar era boa. Acostumado a ver Morricone se apresentando em teatros, achei meio estranho a escolha do lugar, mais utilizado para jogos e shows de rock.  Obtive então a informação que o Omnisport tem uma das melhores acústicas em Paris, e que sua escolha levou em conta também a capacidade de público. Pesquisando sobre ele, descobri que sua arquitetura foi planejada para que não houvesse nenhuma coluna, viga ou coisa semelhante que impedisse a visão geral do espectador, independente de onde estivesse acomodado. Sim, o Arena Bercy estava aprovado para receber o grande maestro italiano e garantir um bom espetáculo.

Houve um pequeno atraso – coisa a que nós brasileiros estamos acostumados. Mas a razão principal, eu acho, foi a grande quantidade de espectadores que chegaram atrasados. É, os franceses não são tão pontuais assim. O concerto específico de 2014 que está correndo o mundo, e iniciou pela França – além de Paris, estavam agendados shows em mais 2 cidades francesas – tem o nome de Morricone – A Life in Movies. As luzes se apagaram, o público em silêncio absoluto, após a entrada do coro e orquestra, mas Morricone não vem. O que se segue é um pequeno documentário sobre o maestro projetado nos telões que ladeiam o palco – que, involuntariamente, seriam responsáveis por muitos risos na plateia, ao escrever errado os nomes dos títulos dos filmes em francês. De início interessante, o vídeo começa a cansar o público, que, afinal, pagou para ver Morricone ao vivo, e não um programa de TV sobre ele. Foram quase 20 minutos (!) de entrevistas, depoimentos e informações. Não vieram vaias, mas um bater de palmas contínuo que indicava que o tal documentário não estava mais agradando, e que o público queria que o show começasse logo.

Então il maestro sobe ao palco, e tudo é perdoado. Os telões anunciam “Páginas Dispersas”, e a primeira música executada é o tema de abertura de Os Intocáveis. O espetáculo segue o mesmo playlist do famoso concerto de Veneza, dividindo as músicas por assunto: depois das Páginas Dispersas – onde foram incluídos os temas de Era uma Vez na América – A Modernidade do Mito no Cinema de Sergio Leone, que inclui os grandes clássicos do faroeste espaguete. Na primeira execução, uma pequena surpresa. Houve-se a voz da soprano, mas onde ela está? Cheguei a pensar: Será que vão tocar um playback? Não, não é nada disso. Após o fim da música, o maestro desce do palco e volta acompanhado de Susanna Rigacci, famosa intérprete lírica que acompanha o maestro há alguns anos. Alguma explicação deve haver para este estranho acontecido, acredito na seguinte tese: Rigacci chegou atrasada ao espetáculo e às pressas lhe providenciaram um microfone, para ela cantar de onde estava, e só depois pôde subir ao palco. Mas isto é só uma suposição. O mistério vai ficar. Além de sua especial participação no The Ecstasy of Gold, a soprano ainda permanece no palco para contribuir nos temas seguintes: Três Homens em Conflito, Era uma Vez no Oeste e Quando Explode a Vingança. Os aplausos entusiasmados já esqueceram os 20 minutos perdidos de introdução. É a mágica Morricone.

No programa que segue, músicas que compõem o Cinema Social: A Batalha de Argel, Investigação sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita, Páginas da Revolução, A Classe Operária Vai ao Paraíso, Pecados de Guerra, e Queimada – cujo tema Abolição, pouco conhecido, é aplaudido de pé. Mas é no grupo Cinema Trágico e Lírico, que se encontram os temas mais populares de Morricone: O Deserto dos Tártaros (uma de minhas preferidas), A Missão (com seus temas Gabriel´s Oboe, Falls e On Earth as it is on Heaven), Cinema Paradiso e a escolha um pouco duvidosa de Ricardo III – os aplausos são tímidos. É nesta hora que dá uma vontade de ter algum tipo de contato com o próprio Morricone ou seus assessores e sugerir temas que ficaram inexplicavelmente esquecidos. Porque, de uma maneira geral, o programa em Bercy repete o de Veneza e Munique (que você encontra em DVD), onde igualmente muitos temas clássicos e espetaculares de Morricone ficaram de fora.

O espetáculo encerra, mas não para o público. Os aplausos perduram entusiasticamente por alguns minutos, e os pedidos de bis (“Encore !”, em francês). O maestro atende ao público. A música escolhida é Here´s to You, tema de Sacco & Vanzetti. Ele agradece e sai. Mas o público não sossegou ainda. Os aplausos não cessam, e o maestro volta, desta vez acompanhado por Susanna Rigacci. O público aplaude mesmo antes de saber o que os 2 vão executar. É o repeteco de The Ectasy of Gold, de Três Homens em Conflito. Os espectadores vão ao delírio. Il maestro agradece demoradamente e se despede. Você pensa que acabou ? Os franceses realmente amam Morricone – lá pelo meio do show, um entusiasmado “Ennio, ti amo !” ecoou  vindo da plateia. Dois encores não foram suficientes! E os dois repetem o tema principal de A Missão. Para garantir o descanso merecido deste gênio octagenário, desta vez um representante do Arena Bercy sobe ao palco para agradecer ao público junto com o maestro, e implicitamente dizer que agora acabou, mesmo!

No final, contabilizou-se mais de 30 temas executados, num total de 2h30 minutos de espetáculo. Admiradores incondicionais de Morricone como eu, saíram de alma lavada. Mas, na verdade, juro que eu ficaria um dia inteiro curtindo, sem cansar,  o Ennio executar suas maravilhosas composições.

Data do show: 04 de fevereiro de 2014
Duração: 2h30 min

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