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Crítica | Escritores da Liberdade

por Fernando Campos
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Em determinado momento de Escritores da Liberdade, a professora Erin está conversando com a coordenadora do colégio que irá trabalhar e diz que se um advogado precisa defender um adolescente em um tribunal a batalha já está perdida, destacando “a guerra é travada na escola”. Seu pensamento pode parecer positivo demais à vista de alguns, contudo, a obra analisada abaixo é repleta de momentos que ressaltam como a educação pode ser transformada na vida de alguém, mesmo que a sociedade inteira diga o contrário.

O longa conta a história de uma jovem e idealista professora chega à uma escola de um bairro pobre, que está corrompida pela agressividade e violência. Para fazer com que seus alunos aprendam e também falem mais de suas complicadas vidas, a professora Gruwell (Hilary Swank) lança mão de métodos diferentes de ensino. Aos poucos, os alunos vão retomando a confiança em si mesmos, aceitando mais o conhecimento, e reconhecendo valores como a tolerância e o respeito ao próximo.

No primeiro ato, o filme estabelece com precisão a realidade da escola onde ocorrerá grande parte da história, através de uma edição dinâmica que traz diversas cenas que mostram os problemas do local, auxiliado por planos mais fechados com detalhes de alunos dormindo, conversando, passando papel e pintando as unhas na sala. Além disso, o roteiro, escrito por LaGravanese, destaca a rotina difícil daqueles jovens, inclusive trazendo narrações em off, ressaltando a constante presença da violência e criminalidade em torno deles. Todo esse trabalho de ambientação faz parte da estratégia do filme de salientar como o trabalho da professora Erin Gruwell será difícil e nisso a obra é muito eficiente. Aliás, a direção de Richard LaGravanese evidencia ainda mais a dificuldade que ela terá utilizando o figurino e direção de arte para criar contrastes, repare como em seu primeiro dia lecionando Erin utiliza um vestido vermelho vibrante enquanto os armários e quadro negro ao seu redor são azuis. 

Como já era esperado, o primeiro contato de Erin com a classe não é dos melhores, contudo, a inteligência do roteiro está em evitar a imagem estereotipada de adolescentes problemáticos, pelo contrário, o longa destaca o aborrecimento deles por causa da sua realidade difícil e pela forma como o restante do colégio os enxerga sempre como inferiores ou desqualificados, elevando a história do filme à um patamar mais social e dando peso significativo à história.

Seguindo essa linha, a obra destaca ainda as divisões raciais do colégio, mostrando que grupos de negros, asiáticos, brancos e latinos pouco interagem entre si, isso quando não estão brigando; ramificações que Erin percebe em aula e faz com que ela promova uma dinâmica chama “jogo da linha”, ensinando aos alunos que as semelhanças em suas vidas vão além das diferenças étnicas. Diante dessa cena, é curioso constatar com Escritores da Liberdade é uma obra surpreendentemente atual, uma vez que, torna-se impossível não estabelecer um paralelo com a realidade, onde há líderes tentando construir muros entre as pessoas e dividir cada vez mais o mundo, restando para a população a opressão em comum que todos sofrem. Aliás, o longa é repleto de momentos que evocam diversos problemas sociais.

No centro da história temos a professora Erin, interpretada com muita doçura por Hillary Swank, criando em torno da personagem uma aura de sabedoria, otimismo e caridade, tornando facílima a simpatia com a protagonista. Contudo, o elenco que interpreta seus alunos também merece destaque, destacando bem os traumas presentes dentro deles e construindo com eficiência a transformação que eles tem em sua postura.

Ademais, é no método de ensino da professora que o filme encontra sua graciosidade, utilizando, por exemplo, músicas de Tupac para ensinar poesia, mostrando como a educação pode ser prazerosa para as duas as partes. Além disso, não deixa de ser interessante ver a comparação que Erin estabelece entre os estudantes e prisioneiros do holocausto, ambos vítimas de um sistema que insiste em taxar as pessoas por sua etnia ou condição social. Por isso, o verdadeiro antagonista da história é o sistema, exemplificado pela imagem da coordenadora Margaret, interpretada brilhantemente por Imelda Staunton (especialista em fazer professoras insuportáveis), que tenta travar os métodos de Erin e propaga um ensino que atinja o maior número de jovens possível para prepará-los para o “futuro” (ou seria mercado de trabalho?), sem nenhuma preocupação com a qualidade do ensino, como incentivar o olhar crítico, por exemplo.

Obviamente, Escritores da Liberdade não é um filme isento de erros, a relação de Erin com o pai e o marido é mal desenvolvida, por exemplo. No entanto, poucos longas são tão inspiradores e motivantes quanto este, ligando uma espécie de alerta em nossa mente que diz “você pode ser tudo o que desejar” ou, parafraseando Logan, “não seja aquilo que te fizeram”. Podemos sempre ser melhores, mudar a realidade ao nosso redor, ninguém pode dizer onde cada um pode chegar. A mudança pode começar com a influência de alguém que admiramos, uma história de vida, um livro ou nesse caso com um filme.

Escritores da Liberdade (Freedom Writers) – EUA, 2007
Direção: Richard LaGravanese
Roteiro: Richard LaGravanese
Elenco: Hilary Swank, Imelda Staunton, Patrick Dempsey, Scott Glenn, April L. Hernandez, Jacklyn Ngan, Kristin Herrera, Mario Barrett, Sergio Montalvo, Jason Finn, Deance Wyatt, Vanetta Smith, Gabriel Chavarria, Hunter Parrish, Antonio García, Giovonnie Samuels, Pat Carrol
Duração: 122 min

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