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Crítica | Excalibur: A Espada é Tirada

por Luiz Santiago
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Em abril 1988*, quando o grupo Excalibur foi criado por Chris Claremont e Alan Davis, havia um grande número de incertezas no ar sobre a real situação dos X-Men após a saga A Queda dos Mutantes. A morte de muitos membros do grupo deixaram cicatrizes profundas nos que permaneceram vivos. Os X-Men restantes já estavam há algum tempo liderados por Magneto — aparentemente regenerado e arrependido de suas atitudes passadas — e um grupo dissidente surgido depois da Saga da Fênix Negra, o X-Factor (criado por Bob Layton e Jackson Guice, em 1986) seguia com suas atividades que se assemelhavam muito ao “sonho de Xavier”.

Nessa sequência de sagas, mortes, ausências, aposentadoria precoce, culpa e fuga foi que apareceram os ingredientes necessários para o surgimento da série Excalibur. A origem da história do grupo é contada no Especial The Sword is Drawn (abril, 1988) que através de um roteiro no melhor estilo “labirinto de ideias”, escrito por Chris Claremont, junta Noturno, Lince Negra (Kitty Pryde), Fênix (futura Garota Marvel/Rachel Summers, filha de Scott e Jean Gray na dimensão de Dias de um Futuro Esquecido que veio para nosso universo impedir o assassinato de um senador, mas não conseguiu retornar), Meggan e Capitão Britânia a fim de, em uma outra frente de batalha, lutar para o salvamento de pessoas inocentes e, neste primeiro momento, deles mesmos.

Por se tratar de um grupo de heróis, é claro que o princípio de junção não poderia ser tão diferente daqueles que já conhecemos, mas o modo como a reunião é feita, a ação do grupo e os inimigos que enfrentam neste especial de abertura + primeiro arco vai na contramão das sagas a que estamos acostumados, a começar pelos caminhos que permitiram a reunião. Claremont deixa de lado a configuração de heróis sempre bonzinhos e de espírito moralmente blindado para colocar em cena mutantes, humanos e criaturas atormentados e com desejos e planos incomuns, quase como se quisessem fazer “só mais este serviço” para enfim encontrarem paz. A relutância e falta de sintonia do grupo logo depois de lutarem contra os Lobisomens Guerreiros de Mojo que queriam levar a Fênix de volta para o “mundo de atrações” é sentida pelo leitor com a maior sinceridade. Eles são heróis mas não se comportam como ou não se sentem heróis.

Sem meias palavras e com falhas e problemas recorrentes para pessoas comuns como alcoolismo, depressão, traição e dificuldades de relacionar-se surgem já no Especial que cria o grupo e se espalham organicamente pelas outras cinco edições da aventura principal, que não traz apenas um vilão, mas diferentes gangues e impasses, como os já citados Lobisomens Guerreiros a serviço de Mojo; ou Penettra e seu time a serviço de Opal Luna Saturnyne; ou a Gangue Maluca; ou Arcade, ou até mesmo os próprios heróis, com seus problemas pessoais, brigas sobre coisas sérias e rusgas na convivência diária. Entram aí também os pequenos mistérios que se somam de maneira cuidadosa à linha principal, como as estranhas “visões” de Noturno e Lince Negra no Farol, a Raposa e seu Exército, ou o então misterioso Widget.

Alguém disse "capa"? Desculpe, mas... "no cover for you"!

Alguém disse “capa”? Desculpe, mas… sem capa para você!

Alan Davis, acompanhado pela finalização de Mark Farmer na edição especial, mostra de forma criativa essa realidade do Excalibur, uma arte que fica ainda mais interessante — menos “suja” e, mesmo que diagramada de forma mais conservadora, mais eficiente — com a finalização de Paul Neary nas edições #1 a 5. As páginas inteiras destacam excelentes momentos de luta dos heróis e o grande momento dos artistas acontece no desfecho do arco, Que Entrem os Palhaços (#5), tanto pela representação louvável do parque de Arcade como pelo “passeio” por outros lugares. Este bloco culmina com um dos momentos mais bizarros que o leitor pode encontrar ao longo de suas leituras de HQs com toque surrealista: uma plateia inteira formada por tortas que desejam se atirar nos apresentadores que não lhes agradam. A coisa fica ainda mais… estranha quando acompanhamos, meio alucinados, a luta que acontece no meio dessa plateia no desfecho da edição. Um dos momentos mais insanos e divertidos do arco.

Surgido em momento de crise para cada um dos personagens e por uma sequência de tragédias e separações, Excalibur não é um grupo de heróis normais e tampouco é um grupo simples e com vilões simples. Ou com conflitos e temas transversais simples. Claremont e Davis fizeram aqui um conjunto de insanidades especialmente para mentes inquietas e meio malucas que riem e se encantam com histórias anárquicas e surreais. Não são revistas, portanto, para todo mundo. Mas quem gosta desse tipo de abordagem nos quadrinhos com certeza terá ouro puro em mãos.

* A data de capa desta edição especial é de 1987, mas ela foi realmente lançada em abril de 1988, como o próprio site da Marvel indica aqui.
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Excalibur #1 a 5 + Especial 1: A Espada é Tirada — Excalibur Vol.1 #1 – 5 / Excalibur Special Edition Vol 1 #1: The Sword is Drawn (EUA, 1988 – 1989)
No Brasil: Excalibur (Panini, 2015)
Roteiro: Chris Claremont
Arte: Alan Davis
Arte-final: Paul Neary / + Mark Farmer (apenas na edição especial)
Cores: Glynis Oliver
Letras: Tom Orzechowski / Lois Buhalis (apenas na edição #3)
Capas: Alan Davis, Paul Neary
180 páginas (encadernado)

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