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Crítica | Fargo – 3X03: The Law of Non-Contradiction

por Guilherme Coral
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estrelas 5,0

  • Contém spoilers. Leiam, aqui, a crítica do filme original e, aqui, as críticas das temporadas anteriores.

Já foi dito, aqui no site, antes pelo nosso editor Ritter Fan, eu já repeti e não canso de dizer outra vez: séries como Mad Men, Better Call SaulFargo, não importam somente as histórias que elas buscam contar e sim a maneira como o fazem. Matthew Weiner, Vince Gilligan e Noah Hawley são verdadeiros artesãos, mas, ouso dizer, que dos três, Hawley é o que mais ousa pelas vias do experimentalismo, construindo narrativas que nos prendem através de suas peculiaridades, os elementos estranhos, quebras de expectativas não no roteiro e sim na forma como o texto é transposto às telas. The Law of Non-Contradiction é um perfeito exemplo disso, ao passo que nos entrega algo que jamais esperaríamos ver em Fargo.

Ao invés de focar nos irmãos Stussi e em Gloria, esse terceiro episódio da terceira temporada do seriado mantém sua exclusiva atenção na policial, que viaja para Los Angeles a fim de investigar mais sobre a morte de seu padrasto, que, recentemente, descobrira ter mudado de nome em algum ponto de sua vida. O roteiro de Matt Wolpert e Ben Nedivi, contudo, brinca com a ausência dos Stussi, inserindo mais dois focos que dividem a narrativa. Um deles nos traz o passado de Ennis, quando ainda era chamado de Thaddeus Mobley (Thomas Mann) e o outro, o elemento inesperado que citamos antes, nos entrega um curta de animação, dividido em partes, sobre um robô que percorre milhares de anos tentando ajudar os outros, um dos contos escritos por Mobley, que é narrado por Gloria, em off.

Um olhar superficial diria que The Law of Non-Contradiction é apenas um filler, que não acrescenta muito à trama geral da temporada e, ao menos por enquanto, isso não deixa de ser verdade. Mas estamos falando de uma série de Noah Hawley, o importante não é entender e sim mergulhar em sua narrativa, tentando fisgar as metáforas e simbolismos presentes em cada capítulo. O pequeno robô do livro, por exemplo, pode muito bem espelhar a própria policial, que busca por algo sem ter um destino aparente. Ela está tão perdida quanto o ser mecânico, vagando pelas ruas de Los Angeles sem saber, ao certo, o que fazer a seguir.

Se extrapolarmos, podemos traçar paralelos desse curta de animação com a subtrama dos irmãos Stussi, ambos sendo controlados por elementos externos, seja seus parceiros ou mafiosos que tomaram conta de seus negócios. Podemos, também, descartar essas confabulações e somente aproveitar, nos entregar à ironia do episódio, construída através da narrativa e não unicamente pelo texto. Afinal, a arte não sempre requer entendimento, acima de tudo, ela pede que seu receptor se entregue, se deixe levar pela imagem ou texto. Ela não é um fim, é o meio, seu objetivo há de ser dito por aquele que a interpreta, trazendo diferentes sensações dependendo daquele que a experimenta.

Toda essa construção, porém, não seria possível sem o excelente trabalho de montagem de Andrew Seklir, que já trabalhara em Battlestar Galactica (2004) Westworld. Seklir intercala esses três distintos focos de forma que cada um deles parece dar continuidade ao outro, por mais que pulemos do live-action para a animação. Naturalmente que as três histórias dialogam entre si, nos oferecendo detalhes sobre o passado de Ennis, mas o mais bonito de se enxergar é como a transição ocorre da forma mais natural possível, utilizando o som ou a própria imagem a fim de criar essa coesão entre os diferentes trechos da narrativa. É importante ressaltar, também, que a transição de focos funciona como elipses, a fim de manter a fluidez da história de Gloria, que continua como uma das mais fascinantes personagens da temporada.

Evidente que a fotografia de Dana Gonzales permite que não fiquemos perdidos com essas mudanças de passado, presente e ficção dentro da ficção. Ao retratar o passado de Ennis a imagem ganha tons amarelados, sépia, nos jogando de volta nos anos de forma mais marcante que o próprio figurino dos personagens. Sem precisar de um texto nos dizendo em que ano estamos, sabemos exatamente qual época o capítulo está retratando no momento e, curiosamente, a utilização de cores mais quentes para retratar o passado traz um ar de saudosismo, um teor romântico que dialoga com a inocência de Thaddeus, tornando ainda mais chocante a revelação da verdade por trás de seu, aparente, golpe de sorte.

The Law of Non-Contradiction é mais do que apenas um excelente capítulo de Fargo, é a prova de como a televisão pode nos trazer obras de arte que rivalizam com aquelas do cinema ou de qualquer outra manifestação artística. É preciso, porém, se deixar absorver, enxergando o meio como algo tão importante quanto o fim. Noah Hawley é um verdadeiro artista e sua obra, como toda arte, não requer entendimento pelo e sim entrega daquele disposto a enxergá-la de verdade.

Fargo – 3X03: The Law of Non-Contradiction — EUA, 03 de maio de 2017
Showrunner:
Noah Hawley
Direção: John Cameron
Roteiro: Matt Wolpert, Ben Nedivi
Elenco: Carrie Coon, Thomas Mann, Fred Melamed, Rob McElhenney, Ray Wise, Scott Hylands, Mark Forward, Roger V. Burton, Francesca Eastwood, Frances Fisher
Duração: 51 min.

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