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Crítica | Homem-Aranha: De Volta ao Lar (Sem Spoilers)

por Giba Hoffmann
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Muita expectativa circundava o lançamento de Homem-Aranha: De Volta ao Lar. Até mesmo no título, com duplo sentido no original e de forma ainda mais direta em nossa versão, o filme já ostenta as promessas de uma grande chegada do Cabeça-de-Teia ao seu lugar de direito em meio ao UCM. Possuidor de um passado cinematográfico curiosamente já bastante carregado para quem estreou nas telonas tão recentemente quanto em 2002, o herói aracnídeo encontrava-se pela primeira vez totalmente aberto a todo tipo de inovação e releitura possíveis, em meio ao inevitável bafafá envolvendo os destinos da franquia, que iniciou com duas entradas brilhantes apenas para mergulhar num inferno astral que durou exatos dez anos (pois é, não subestime o mau olhado do Sr. Kevin Feige!).

Qualquer que fosse a rota adotada, o filme estaria fadado a ser alvo tanto de elogios esplendorosos quanto de críticas mortíferas. Imagino eu que até mesmo da mais rançosa indiferença, nascida dos corações ainda mais enrijecidos dos fãs que amargaram o percurso pelo qual o personagem vinha sendo levado – ao longo dos mesmos exatos 10 anos – pelos quadrinhos sempre polêmicos de Dan Slott (se ele veio de brinde na praga do UCM ou não, deixo para você responder por sua conta).

Conforme os trailers foram deixando claro, neste filme temos um Peter Parker (Tom Holland) tradicionalmente de volta ao colégio. A insistência em rejuvenescer o personagem e abordá-lo preferencialmente sempre de volta a este ponto em diversas das adaptações do conceito prova-se bastante razoável quando constatamos a riqueza de possibilidades que este cenário de high-school traz. Não se trata aqui nem do colégio surreal do Homem-Aranha de Sam Raimi, com aquela marmanjada fazendo cosplay de adolescentes em um setting um tanto atemporal, nem de… o que quer que tenha sido aquilo mostrado em O Espetacular Homem-Aranha!

Mesmo evocando um pouco dos inescapáveis arquétipos de personalidades da ambientação escolar, o filme consegue ter uma perspectiva renovadora sobre o conceito, enfocando o ambiente de maneira humorística que mescla um olhar jovem e otimista a um saudosismo pouco disfarçado. Prova disso é que, ao mesmo tempo em que a direção enraiza bem a narrativa na atualidade-futurista do UCM, ela o faz sob um enfoque escrachadamente oitentista. A musicalidade, alguns dos visuais e muito da direção e do clima emprestam muito dos transcendentais Curtindo a Vida Adoidado e O Clube dos Cinco, o que ajuda a dar uma personalidade própria a esta versão. Trata-se de um opção um tantinho inesperada e executada com bastante coesão: o encontro de épocas define bem a abordagem da produção, que traz o coração insubstituível de Lee & Ditko embalado por muito de Bendis & Bagley.

Parte do segredo de sucesso do personagem sendo o sempre genial elenco de personagens que povoa a atribulada vida fora das teias de Peter, era muito importante que sua rendição tivesse sucesso em convencer e cativar o espectador logo de cara, tarefa que felizmente é bem sucedida aqui. O grande destaque fica a cargo de Ganke Ned (Jacob Batalon), o carismático melhor amigo roubado do Miles Morales que complementa bem o personagem de Peter, oferecendo uma perspectiva próxima e ao mesmo tempo externa de suas aventuras incomuns. Batalon e Holland conseguem aproveitar bem alguns dos momentos mais divertidos do roteiro com uma ótima afinidade comédica em tela. Por sua vez, as versões de Flash Thompson (Tony Revolori) e Liz Allan (Laura Harrier) conseguem ao mesmo tempo trazer alguns dos melhores clichês de seus respectivos papéis de bully e interesse romântico, e quebrar ligeiramente as expectativas a respeito deles, mantendo-os bastante críveis e interessantes como personagens de apoio. E o que dizer de Michelle (Zendaya)? Um mistério embalado num enigma!

A rejuvenescida Tia May (Marisa Tomei) empresta bastante de sua versão Ultimate, menos vovó fragilizada e mais mãe adotiva sem muito jeito pra coisa, convencendo bem na dinâmica com Peter e marcando presença com facilidade, ao contrário da versão terrível que a importante personagem recebeu nos filmes de Marc Webb. Por fim, um membro do elenco de apoio que causou preocupação por conta de suas tendências de estrelato marca presença ao longo de todo o filme, porém por sorte sem roubar a cena do herói aracnídeo. Tony Stark (Robert Downey Jr.) é inserido na trama de forma orgânica, inserindo seu sempre interessante personagem no contexto desta versão iniciante do Homem-Aranha de forma crível e bastante empolgante.

O filme desenvolve-se trazendo as tradicionais (e nem um pouco desnecessárias) cenas de ação aracnídea. Notadamente evitando o conhecido cenário de Manhattan, também aqui o filme consegue um bom equilíbrio entre referenciar o passado e uma exploração criativa do personagem, que lança suas teias na maior parte do tempo pelos subúrbios e nos aglomerados urbanos do Queens, mas também viaja por cenários ainda inexplorados no cinema. Explorando tanto as tradicionais habilidades do herói quanto os interessantes gadgets providenciados por Stark, as cenas oferecem um novo twist ao repertório conhecido do personagem, dando novo fôlego e evitando o possível desgaste com sua a terceira encarnação em dez anos, e dão pistas interessantes do que esperar para o futuro dessa versão.

Em termos da trama central, embora as motivações de Peter de provar seu valor mediante Stark sejam bem trabalhadas e aproveitem muito bem a caracterização do herói veterano para nos apresentar o iniciante, ficamos com a impressão de que faltou um algo a mais, que por vezes chega a se agudizar em uma suspeita de descaracterização do personagem. É aqui que a decisão (plenamente compreensível) de se pular a história de origem e nos lançar direto em um Homem-Aranha já mais ou menos estabelecido – ainda que iniciante – acaba cobrando seu preço. Com o conto de origem mais marcante de todo o Universo Marvel sendo obrigado a ser deixado de lado aqui, a produção acaba apostando alto no subtexto e na familiaridade do público com o personagem para carregar a narrativa e garantir a compreensão de suas reais motivações e caráter – uma aposta um tanto arriscada.

Por sorte o filme conta com o melhor vilão cinematográfico do aracnídeo desde o genial Doutor Octopus de Homem-Aranha 2, o que sempre ajuda a emprestar energia para uma boa narrativa super-heróica. Conforme o próprio casting já nos dava pistas, a escalação de Michael Keaton como o Abutre prova-se uma escolha bastante acertada, realizando um Adrian Toomes cuja motivação é bastante interessante, reverbera aspectos do próprio Peter e, de quebra, do histórico do próprio vilão nos quadrinhos. Trilhando a fina linha entre o bufão e o sinistro, o vilão prova-se um ótimo oponente inicial para essa encarnação do herói, provando que nem só de Duendes vive um Aranha, em mais um ponto forte do filme.

Homem-Aranha: De Volta Ao Lar é uma síntese bem acertada entre o jogar seguro e a reimaginação. Combinando bem a referencialidade aos clássicos com uma narrativa energética e repleta de juventude, o filme abraça a abordagem do UCM sem perder sua identidade ou tornar-se derivativo, de forma tão confiante que logo faz esquecer que, até há pouco, precisava provar o valor de sua existência. Repleto de ação inspirada e comédia genuína, a aventura pode não ser necessariamente revolucionária e contar com falhas bastante óbvias, mas entrega com o personagem um filme com qualidade que não víamos desde a segunda entrada na trilogia de Raimi. Assim, prova-se um reboot nada redundante ao introduzir com sucesso o herói aracnídeo ao universo compartilhado do qual nunca deveria ter se afastado. E que fique por muito tempo!

Homem-Aranha: De Volta ao Lar (Spider-Man: Homecoming) — EUA, 2017
Direção:
 Jon Watts
Roteiro: Jonathan Goldstein, John Francis Daley, Jon Watts, Christopher Ford, Chris McKenna, Erik Sommers
Elenco: Tom Holland, Michael Keaton, Robert Downey Jr., Marisa Tomei, Jon Favreau, Gwyneth Paltrow, Zendaya, Donald Glover, Jacob Batalon, Laura Harrier, Tony Revolori,  Bokeem Woodbine, Michael Mando
Duração: 133 min.

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