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Crítica | Lucifer – 1X09: A Priest Walks into a Bar

por Ritter Fan
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estrelas 4,5

Obs: Há potenciais spoilers. Leiam as críticas dos demais episódios, aqui.

Ao piano:

(1) Padre Frank Lawrence (Colman Domingo) fazendo um solo hesitante de Knockin’ of Heaven’s Door de Bob Dylan;

(2) Padre Frank e Lúcifer fazendo um dueto enérgico de Mess Around de Ray Charles;

(3) Lúcifer fazendo um solo melancólico de Knockin’ of Heaven’s Door de Bob Dylan;

(4) Chloe e Lúcifer fazendo um dueto alegre e revelador de Heart and Soul de Hoagy Carmichael e Frank Loesser.

Com isso, A Priest Walks into a Bar torna-se um daqueles episódios de série que o espectador simplesmente não quer que acabe e, quando ele inevitavelmente acaba, recomeçar e assistir tudo de novo é um prazer absoluto. E isso sem nem levar em consideração roteiro ou atuação. A elegância dessa série e a inserção diegética de canções merece aplausos e distancia o trabalho do showrunner Joe Henderson de qualquer outra série de TV aberta baseada em quadrinhos  que exista por aí. Um diabo que encontra catarse e lida com alegria e tristeza ao piano de calda de sua boate no topo de um prédio em Los Angeles é muito mais do que podemos esperar do  sub-gênero e, com isso, posso afirmar com certeza que desde logo Lucifer ganha um local especial na série que já assisti, mesmo que nem mesmo uma temporada tenha sido encerrada.

E não, de forma alguma estou concluindo que a série é sem defeitos. Ela os tem, e muitos, mas o charme de Tom Ellis como o anjo caído, a crescente qualidade da atuação de Lauren German como a policial Chloe Decker e o trabalho inteligente nos roteiros realmente afastam a série do lugar-comum e a transformam em entretenimento de primeira.

O exemplo clássico disso é o episódio sob análise. Era óbvio que alguma hora Lúcifer teria que lidar com um padre, não? Qualquer showrunner de meia-tigela imaginaria algo assim quase que imediatamente ao conceber uma série protagonizada pelo próprio diabo. Então, A Priest Walks into a Bar era pule de dez. Mas um showrunner pouco preoucupado com o desenvolvimento de personagens – o que parece ser um padrão em séries de TV aberta – faria isso de maneira burocrática, simplista, boba mesmo. Não é o que acontece aqui, pois o roteiro de Chris Rafferty aproveita a liberdade maior que a Fox parece ter dado a Joe Henderson no leme da série e encaixa diálogos ferinos atrás de diálogos ferinos, primeiro condenando a Igreja e padres em geral – essa é, logicamente, a primeira reação de Lúcifer quando o padre procura sua ajuda para lidar com sua suspeita de tráfico de drogas em um centro de reabilitação de jovens, tentando proteger Connor, por quem ele nutre especial conexão -, e, depois, relativizando tudo, deixando o equilíbrio aparecer de forma a formar um belo laço de amizade entre dois lados completamente opostos de uma mesma moeda. São pouco mais de 40 minutos em que somos convencidos que o diabo pode sim ter como amigo um padre dedicado à fé em Deus, seu próprio pai e inimigo mortal.

Sim, o roteiro recorre a uma certa quantidade de clichês ao santificar o passado sombrio do padre, mas os exageros cometidos de forma alguma atrapalham a verosimilhança da conexão estabelecida, graças, claro, a Ellis, mas, aqui, especialmente a Colman Domingo (o misterioso Victor Strand de Fear the Walking Dead), que cria um personagem tomado de uma luz impressionante que convence com suas expressões faciais que ele tem realmente uma pesada bagagem vinda do passado e que encontrou em Deus seu caminho. Primeiro o fantástico dueto dos dois tocando Mess Around e, depois, o diálogo final entre Frank e Lúcifer, que parece revelar que o padre sabia quem o dono de boate realmente é, é tocante e fecha com chave de ouro a participação desse inesquecível personagem.

É importante também entender que o roteiro sabe aproveitar Chloe Decker como mais do que uma mera parceira de Lúcifer. A relação entre os dois – o dueto Heart and Soul! – ganha outra roupagem, aqui, estabelecendo-se além do mero interesse pessoal (no caso de Chloe) ou sexual (no caso de Lúcifer) e também abrindo novos horizontes.

E, no meio disso tudo, há, ainda, a capacidade de Joe Henderson de fazer convergir as duas narrativas macro – o caso Palmetto e a missão de Amenadiel -, trabalhando uma sub-trama não intrusiva que revela que o emissário de Deus é arquiteto de estratagema sinistro e master of puppets do recém-ressuscitado Malcolm (cujo trabalho do ator Kevin Rankin, confesso, me incomoda pela quantidade de clichês que ele acumula). Além disso, aprendemos que a participação de Dan na “morte” de Malcolm teve motivos ulteriores altruístas, o que o absolve um pouco e o transforma em vítima mais do que em vilão (espero que não exagerem no tom aqui).

Em poucas palavras, ou melhor, canções ao piano, A Priest Walks into a Bar é, sem sombra de dúvidas, um grande exemplo do que uma série de TV baseada em quadrinhos pode ser. Sei que também não me canso de dizer, mas creio estarmos testemunhando o nascimento de uma grande série de TV aberta, independente do gênero.

Lucifer – 1×09: A Priest Walks into a Bar (Idem, EUA – 21 de março de 2016)
Desenvolvimento: Tom Kapinos (baseado em personagem criado por Neil Gaiman, Sam Keith e Mike Dringenberg)
Showrunner:  Joe Henderson
Direção: David Frazee
Roteiro: Chris Rafferty
Elenco principal: Tom Ellis, Lauren German, Kevin Alejandro, D.B. Woodside, Lesley-Ann Brandt, Scarlett Estevez, Rachael Harris, AnnaLynne McCord, Kevin Rankin
Duração: 43 min.

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