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Crítica | Maré Vermelha

por Fernando Campos
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Durante toda sua carreira como diretor, Denzel Washington foi o ator mais escalado por Tony Scott em seus filmes. Juntos, eles produziram obras que agradaram tanto o público quanto a crítica, como, por exemplo, Chamas da Vingança e Déjà Vu. Mas a parceria deles inicou em 1995, no longa analisado a seguir, Maré Vermelha. A obra serve não apenas como ponto de partida da união entre os dois profissionais, como também destaca-se por ser um dos melhores trabalhos da carreira de Scott.

O filme mostra o relacionamento entre o primeiro oficial Ron Hunter (Denzel Washington) e Frank Ramsey (Gene Hackman), o capitão, até que paira a dúvida se devem ou não bombardear russos rebeldes, que se apoderaram de um míssil nuclear que pode ser usado contra os Estados Unidos. A tensão aumenta quando a ordem de disparo contra os rebeldes é seguida de uma mensagem incompreensível, que poderia ser um cancelamento da ordem anterior. Enquanto um deseja disparar, o outro acha prudente esperar a confirmação e um conflito interno se estabelece pelo controle do submarino.

O longa parte de uma premissa interessante, quais seriam os riscos se uma pessoa com idéias duvidosas tivesse o poder de lançar uma bomba atômica? Em determinado momento, por exemplo, os próprios tripulantes fazem justamente esse questionamento, perguntando “o que aconteceria se Hitler tivesse uma ogiva nuclear?”, ótimo recurso do roteiro para antecipar os problemas que ocorreriam na missão. Portanto, o longa apresenta-nos a Frank Ramsey, o conservador capitão do USS Alabama, que funciona como um motor para a história através de suas atitudes radicais. Aliás, repare como a obra sutilmente compara Ramsey com o führer na cena em que a tripulação prepara-se para ingressar no submarino e o comandante faz um discurso em cima de um palanque que lembra muito o ditador alemão, sendo centralizado na composição com seus soldados enfileirados logo abaixo, lembrando muito os filmes de propaganda nazista.

Já o oficial Ron Hunter está no filme justamente para contrapor e a obra ressalta com precisão suas diferenças comportamentais, mostrando Hunter sempre aberto ao diálogo enquanto Ramsey é mais instintivo, repare como ele sempre coça a cabeça quando precisa tomar uma atitude cerebral, demonstrando incômodo com a situação. Além disso, o roteiro, escrito por Michael Schiffer, Richard P. Henrick e Quentin Tarantino, é hábil também em diferenciá-los ideologicamente, isso pode ser visto na ótima cena onde eles debatem sobre o ataque a Hiroshima e, enquanto o primeiro oficial diz ser contra o ataque, o capitão mostra-se a favor, ou seja, enquanto um é anti-guerra o outro tem o espírito combativo.

As nuances entre eles são ressaltadas ainda mais pela direção de Tony Scott. A paleta usa um inteligente esquema de cores para diferenciar cada setor do submarino, portanto, a área de rádio e comunicação é azul (cor pacífica), a região de sonares é verde e o local de lançamento de mísseis é tomado pelo vermelho (cor que indica perigo, violência). Baseado nisso, repare como as cores também são utilizadas em outros elementos técnicos do longa, por exemplo, o boné que está sempre na cabeça de Ramsey é vermelho, representando seu posicionamento ofensivo, e quando Hunter decide colocar um chapéu a cor que ele escolhe é o azul, mostrando como prioriza a comunicação.

A fotografia prioriza ainda planos mais fechados, como close-ups médios e planos médios, dando a sensação de confinamento e claustrofobia. Além disso, Scott insere alguns planos de canto (também conhecido como ângulo holandês) nas cenas mais tensas, ressaltando o desconforto e desequilíbrio emocional da tripulação naquela situação. Por fim, a edição intercala as ações pelos diversos setores do submarino, o que torna o longa dinâmico, e a trilha sonora, composta por Hans Zimmer, insere um constante clima de urgência e perigo na obra.

Não apenas a direção e roteiro contribuem para tornar o embate entre Ramsey e Hunter interessante, como também o trabalho de Gene Hackman e Denzel Washington é fundamental para isso. Hackman transmite com perfeição toda a arrogância, conservadorismo e teimosia do capitão, através de uma composição cheia de tiques, como suas coçadas na cabeça, mas que aqui não soam exageradas. Já Washington tem um trabalho mais contido, focado em mostrar a serenidade do oficial e sua preferência pela comunicação, sendo também eficiente em destacar como o personagem é firme em suas convicções.

Mas o longa não destaca-se apenas pelo embate entre os dois protagonistas, pelo contrário, a trama é bem construída, utiliza bem a dualidade de alguns membros de tripulação para criar a sensação de dúvida no público e insere um constante senso de urgência na história, como se algo de errado pudesse acontecer ali a qualquer momento. O único pecado do filme é ter ignorado o desenvolvimento inicial de Hunter, onde sua família ganha destaque para depois ser esquecida dentro da história, algo que não interfere em nada no resultado final, mas acaba sendo uma ponta solta.

Maré Vermelha não apenas inicia muitíssimo bem a parceria entre Tony Scott e Denzel Washington, como também é um dos melhores filmes da carreira do diretor. Além de possuir uma trama dinâmica, o longa apresenta a discussão entre duas ideologias opostas, ressaltando como pode ser perigoso para a humanidade caso uma pessoa desequilibrada tenha em mãos armas nucleares.

Maré Vermelha (Crimson Tide) – EUA, 1995
Direção: Tony Scott
Roteiro: Michael Schiffer, Richard P. Henrick, Quentin Tarantino
Elenco: Denzel Washington, Gene Hackman, Viggo Mortensen, James Gandolfini, Matt Craven, George Dzundza, Rocky Carol, Steve Zahn, Danny Nucci, Ricky Schroder
Duração: 116 min

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