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Crítica | Maze Runner: A Cura Mortal

por Gabriel Carvalho
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“Você não pode salvar todos, Thomas.

Eu posso tentar.”

Contém spoilers.

Maze Runner: A Cura Mortal é a conclusão bombástica da trilogia de filmes adaptados dos livros escritos por James Dashner. Como qualquer outra franquia adolescente, Maze Runner é, primeiramente, um produto para fã, algo que se estabelece tanto como algo positivo quanto como algo negativo. A questão positiva é que um livro pede muito mais de seu consumidor do que um filme. A leitura é algo que consome bastante tempo. Tanto é que, depois de um quantidade enorme de horas consumindo um produto, nossas percepções do que é bom e do que é ruim são devidamente alteradas, pela própria natureza da literatura. Os personagens, mesmo que não tenham passado por arco algum, o mínimo de desenvolvimento, tornam-se afeições nossas, porque por horas e horas estivemos ao lado deles. É difícil não nos importarmos por alguém que sempre esteve lá, fazia parte de nosso breve cotidiano. Não estou dizendo que Maze Runner necessariamente é assim, vazio, porque nem mesmo li os livros, algo que não é necessário para a avaliação de um filme. Mas por que essa questão pode ser tratada como “positiva”?

Porque, nessas adaptações de best-sellers, os leitores dos livros já observam as produções com cargas que não existiriam nos filmes por si só. Os fãs dos filmes não precisam de desenvolvimento ou situações que criem vínculo entre público e obra, porque eles já têm isso. O que eles precisam é daqueles momentos chaves que sempre sonharam ver em suas imaginações, algo que, por outro lado, é negativo. A não existência de algum ponto que os fãs entendiam como essencial acaba afetando o gosto dele pelos filmes. Eu, por exemplo, gostei menos de Harry Potter e o Enigma do Príncipe do que “deveria”, mesmo que o filme, como filme, seja um dos melhores da saga. Porém, assim como tem seu viés negativo, retomando uma ambiguidade de óticas, aquele acontecimento importante indevidamente cortado, e que fez os fãs espernearem por ter sido cortado, estava presente no material fonte, balanceando as coisas para os leitores do original, que, novamente, vêm com uma carga inexistente nas adaptações cinematográficas.

O ponto em que quero chegar torna válido, para uma crítica crua de um produto cinematográfico, a não aproximação com a fonte de todo o universo em pauta. Da mesma forma, também é válido que se existam críticas de profissionais da área que tenham afeição pelo produto, vide que pode ser de importância aos verdadeiros fãs dos livros, os quais, antes de tudo, eram leitores que acompanharam as desventuras de Thomas (Dylan O’Brien) e seus amigos por labirintos, desertos e cidades. O caso deste texto é o primeiro, o qual não saberá distinguir se as falhas vêm dos livros ou dos filmes em si, mas também não se aterá a adorar questões inexistentes no formato cinemático, sendo, provavelmente, mais “indelicado” com a obra do que muitos poderão olhá-la. Para iniciar toda a dissertação, vamos começar com os pensamentos iniciais tidos pela trilogia: Correr ou Morrer e Prova de Fogo são filmes, no ápice de qualidade que atingiram em algum momento, fracos e muitos deméritos de A Cura Mortal são consequências dos antecedentes da franquia, que não soube criar mistérios e responder perguntas com muita plausibilidade.

Thomas, a começar na grosseria, não é um personagem realmente interessante. Os clichês de filmes de ação são enfiados goela abaixo de um ator muito mais competente do que aquele pedido pelo seu papel. Um dos plot-twists de A Cura Mortal envolve a natureza deste personagem, uma natureza que não poderia ser mais coincidente, vide que a questão do “escolhido” – depois de ter sido subvertida pelo melhor Jogos Vorazes – entra em cena como uma solução apressada, mal-utilizada, dado o caráter geral de desfoque da obra. A própria narrativa de Maze Runner é muito problemática, não sabendo o discurso que quer fazer, a história que quer contar, não sabendo ser minimamente inteligente. As consequências estão extremamente distante das causas delas, sem amarração. A narrativa deste terceiro filme é um caos completo, o que até seria interessante se a pretensão de tudo fosse manejar a existência de um caos completo, trazendo uma resolução trágica, mas esperançosa. A dualidade da fatalidade e da esperança, contudo, não é explorada pelo enredo, que apenas a pincela no final de tudo, na derradeira cena.

Na maior parte do tempo, estamos concentrados na missão de resgate de Minho (Ki Hong Lee), sob domínio da organização CRUEL. Mais relevante para a mitologia de toda história os acontecimentos dentro da Última Cidade, porém, do que as intermináveis tentativas por parte de Ava Paige (Patricia Clarkson) de encontrar a cura mortal, título do longa-metragem. O roteirista – ou, então, o autor do livro -, parece ter inventado as primeiras abobrinhas que vieram na sua cabeça. As atitudes da organização são inconsistentes, sem tornar verídica uma busca pela cura. A questão do “escolhido” apenas abre espaço para que furos de roteiro surjam, além de que era muito improvável o “escolhido” ser o exato protagonista blasé de todas as aventuras que, antes, acompanhamos “empolgadíssimos”. Maze Runner é óbvio, mas, ao menos tempo, imprevisível – um imprevisível aleatório mesmo. Quando esperávamos que as respostas viessem, elas não vêm, com o todo parecendo uma bobagem mal planejada pelos escritores, permitindo Paige soar como Jigsaw, brincando com adolescentes dentro de um labirinto.

Enquanto Patricia Clarkson é completamente desperdiçada como vilã, em um roteiro que não se esforça em torná-la consideravelmente interessante, Janson (Aidan Gillen), porém, revela-se como uma figura mais ameaçadora para os nossos heróis, mesmo que as motivações para suas ações sejam insuficientes. O mundo está “acabando”, mas ninguém percebe que isso está acontecendo. Não sentimos peso nas atitudes dos personagens, as quais se opõem à última chance da vida voltar a ser como era. Dentre todos, Teresa (Kaya Scodelario) é a única figura minimamente “razoável” em suas atitudes. Por um lado, Teresa tem posições questionáveis, mas compreensíveis, ao mesmo tempo que é a única pessoa da história lidando com a moralidade de suas ações, tendo “crises existenciais”, por assim dizer. Quando chega a hora de alguma coisa substancial acontecer, Teresa, todavia, é desperdiçada, devido a um terceiro ato moldado pelas motivações porcas de Janson, o qual, apesar de ser interpretado por Gillen, que é, essencialmente, um bom vilão, atrapalha toda a conclusão do filme e um possível desenvolvimento, em cima da hora, de Ava Paige.

O único movimento das manivelas do filme reside na busca por Minho. O ideal é pensar que este background confuso, envolvendo Janson, não existe. Tudo que estamos presenciando, nessa hipótese deslumbrante, é um simples filme de assalto. A obra melhora. Mesmo deixando toda a perspectiva da organização de lado, Maze Runner, no entanto, também não aprofunda a sua criação de mundo, a qual, supostamente, começou no filme passado. Todos os grupos externos ao CRUEL são pessimamente representados, e a substância de revolução – uma alegoria da luta de classes, se tivesse sido explorada por mãos mais competentes -, é deixada de lado, dando espaço para o completo superficial. Jogos Vorazes já é uma lembrança antiga. A única coisa notável em Lawrence (Walton Goggins), personagem desse núcleo de infectados, é a sua maquiagem. Ademais, falando dos outros coadjuvantes deste longa-metragem, o ator Barry Pepper, interpretando Vince, aparenta ter sido contratado apenas para fazer discursos, imbuídos da exposição óbvia de um texto mequetrefe. A obra não melhora tanto.

Outrossim, a maior parte das figuras apresentadas no filme anterior, como Aris (Jacob Lofland) e Hariet (Nathalie Emmanuel), estão figurando em meio a outras, que ganham muito mais importância, apresentando-se, no caso, como meras participações especiais. Outras é exagero, ledo engano, porque apenas três personagens realmente ganham mais espaço no filme do que o costumeiro. Apesar disso, ainda é uma pena que Jorge (Giancarlo Esposito) e Brenda (Rosa Salazar), ambos muito fortes em suas caracterizações, não tenham recebido mais protagonismo do que essa suposta “atenção especial” comentada. Os dois são, no final das contas, mais duas cabeças a atuarem como salvações de última hora – artifício recorrente em A Cura Mortal. No meio de tudo que está de errado na fita, o grande ponto positivo do encerramento da trilogia é Newt (Thomas Brodie-Singer), que, graças as ótimas performances de Thomas Brodie e Dylan O’Brien, denota um verdadeiro vínculo afetivo com Thomas, mesmo que mais disso seja concentrado nas atuações do que no roteiro.

O roteiro, já que mencionei-o, é um fracasso parcialmente completo, destruindo uma considerável parte da sustentação do filme. A direção de Wes Ball, em contrapartida, mostra-se eficaz em não transformar a conclusão da história em um produto completamente abominável. Wes Ball sabe dirigir cenas frenéticas, abrindo o próprio filme com uma excelente sequência de perseguição, a qual também se alia a uma boa fotografia, que sabe, especialmente dentro de cenários internos, criar composições visuais interessantes. Em uma cena específica, Ball contribui com a atuação de Gillen, elaborando uma situação na qual o vilão entra em cena através da fumaça, criando um senso de maleficência. Temos uma inconsistência, porém, no tom que Ball dá a alguns segmentos particulares, mas importantíssimos. Enquanto o diretor sabe ser brega ao máximo em momentos dramáticos, puxando para o melodrama manipulativo, ele, em oposição, acerta em alguns planos que invocam o desespero dos personagens, como quando um corpo desmaiado é puxado exaustivamente pelo chão.

Em um pensamento que favoreça um pouquinho mais o andamento de um filme esticado desnecessariamente por mais de duas horas, o retorno de um personagem antigo é uma adição frutífera à química da equipe, que, senão é grandiosa, é ligeiramente um pouco distante de uma inocuidade. Enfim, Maze Runner: A Cura Mortal pode até trabalhar bem a temática pós-apocalíptica dentro da literatura, sendo que os fãs da trilogia literária provavelmente terão posicionamentos distintos se essa tiver sido uma adaptação fiel ou não, seguindo os anseios de uma juventude-infância interessada na retratação fotocopiada de uma experiência previamente vivida e que não pode ser igualada em uma outra mídia. Se seguiu lealmente à história original, a obra de James Dashner certamente transmite muitas coisas negativas para a sua adaptação cinematográfica. Se não seguiu, T. S. Nowlin conseguiu transformar tudo o que Dashner escreveu, possivelmente, até mesmo um comentário relevante sobre a sociedade em que vivemos, em um filme de ação com uma história distópica-adolescente dolorosamente genérica e mal resolvida.

Maze Runner: A Cura Mortal (Maze Runner: The Death Cure) – EUA, 2018
Direção: Wes Ball
Roteiro: T.S. Nowlin, baseado na obra de James Dashner
Elenco: Dylan O’Brien, Thomas Brodie-Sangster, Ki Hong Lee, Kaya Scodelario, Rosa Salazar, Giancarlo Esposito, Will Poulter, Jacob Lofland, Patricia Clarkson, Aidan Gillen, Walton Goggins, Dexter Darden, Katherine McNamara, Nathalie Emmanuel, Barry Pepper, Paul Lazenby, Kazi Maubert, Devin Koehler, Scot Cooper, Dylan Smith
Duração: 142 min.

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