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Crítica | Nascido Para Matar

por Rafael W. Oliveira
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Em sua relativamente curta, porém ambiciosa filmografia, Kubrick passeou por diversos gêneros e estilos, buscando trazer para cada um destes seu toque pessoal, e por não dizer isso, visionário. Lolita trouxe uma abordagem refrescante e ousada sobre o thriller erótico, Dr. Fantástico ultrapassou limites (no bom sentido) no uso daquilo que conhecemos como humor negro, 2001: Uma Odisseia no Espaço é tido até hoje como referência no que se refere às ficções cientificas, e O Iluminado foi uma aula de como criar um filme de terror através de ambientes claustrofóbicos e sufocantes.

Nascido Para Matar, apesar de não ser o primeiro filme sobre a guerra feito por Kubrick (antes disto tivemos o maravilhoso Glória Feita de Sangue), nos traz novamente aquela abordagem ácida, crítica, dura e desoladora que apenas um cineasta como Kubrick era capaz de construir. Antes de tudo, o diretor jamais foca no ato da guerra em si, mas no horror da mesma e os efeitos devastadores que esta causa ao ser humano. Muitos acusavam Kubrick de ser um cineasta frio e desumano, mas seus filmes, em contraponto a estas afirmações, eram carregados de um sentimento de humanidade poucas vezes experimentadas no cinema.

Ambientado durante a Guerra do Vietnã (um assunto ainda difícil para os americanos), Nascido Para Matar é divido em duas partes distintas, onde acompanhamos um grupo de jovens em treino para a guerra, onde diversas reações e situações desesperadoras irão surgir em meio a humilhações constantes sobre os recrutas.

– Qual a sua altura, soldado?

– 1.75m, senhor!

– Não sabia que empilhavam merda tão alto.

A visão de Kubrick é mais sobre a desumanização do homem diante do horror e da estupidez da guerra. O diretor é pessimista, mas também realista, o que na época gerou diversas críticas e ataques ao cineasta, uma vez que o ser humano sempre evitou encarar o seu próprio eu. Dependendo da situação, podemos ser altruístas ou egoístas. Kubrick decide ir pela segunda opção e disseca o que há de pior no ser humano. Nascido Para Matar se torna, inevitavelmente, uma experiência desconfortável e psicologicamente impactante.

Como o excelente criador de imagens que era, Kubrick nos traz mais alguns dos momentos mais antológicos de sua carreira. Mais especificamente, todo a primeira metade envolvendo o treinamento dos soldados está entre um dos pontos altos da carreira do diretor, onde podemos sentir o cansaço, a humilhação e o desgaste da situação. Diante de nossos olhos, vemos homens se tornarem animais, verdadeiras máquinas de matar, culminando no trágico ato do soldado Pyle, interpretado de maneira assustadora por Vincent D’Onofrio.

É fato que Nascido Para Matar sofre uma considerável queda de ritmo e interesse em sua segunda metade, mas em nenhum momento isto diminui o feito de Kubrick em retratar os horrores da guerra de maneira tão impactante. Curiosamente (e injustamente), o filme é considerado por muitos como uma das obras menores de Kubrick, mas venhamos e convenhamos: quando se trata de Stanley Kubrick, nada acaba sendo pequeno. Nascido Para Matar é uma como uma bomba prestes a explodir em nossos olhos, tamanha a carga dramática desenvolvida por Kubrick. Desta forma, o filme é tanto uma das grandes obras do diretor, como também uma das grandes realizações sobre a degradação da guerra no ser humano.

Nascido Para Matar (Full Metal Jacket, EUA, 1987)
Roteiro: Stanley Kubrick, e Michael Herr, baseado em romance de Gustav Hasford
Direção: Stanley Kubrick
Elenco: R. Lee Ermey, Matthew Modine, Adam Baldwin, Vincent D’Onofrio.
Duração: 116 min.

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