Home QuadrinhosMinissérie Crítica | Noé # 1: Por Causa da Maldade dos Homens

Crítica | Noé # 1: Por Causa da Maldade dos Homens

por Luiz Santiago
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E disse o Senhor: destruirei da face da terra o homem que criei, tanto o homem como o animal, os répteis e as aves do céu; porque me arrependo de os haver feito.

Gêneses 6:7

Darren Aronofsky (PiCisne Negro), cineasta novaiorquino com cinco longas no currículo, está filmando na Islândia a sua mais nova obra, um épico baseado na vida de Noé, a figura central do episódio bíblico do dilúvio. O filme está orçado em 130 milhões de dólares e trará o neozelandês Russel Crowe no papel principal, além de Emma Watson, Jennifer Connelly e Anthony Hopkins no elenco (leia a crítica do filme, aqui).

Como forma de promover o filme e apagar as dúvidas dos produtores da Paramount Pictures que estão por trás do projeto, o diretor resolveu lançar uma graphic novel que tem por objetivo ser uma espécie de guia geral do roteiro e storyboard do filme. Coescrevendo a história ao lado de Ari Handel e entregando a arte da HQ ao excelente Niko Henrichon, muito dificilmente alguma coisa sairia errada com essa iniciativa. Ainda vai demorar muito para sabermos se isso funcionou no filme, mas a primeira parte dessa tetralogia de Noé nas HQs é uma verdadeira maravilha.

A primeira coisa que nos causa impacto é a arte de Niko Henrichon, responsável pelos desenhos de outra maravilha de graphic novel chamada Os Leões de Bagdá (2006). A proposta do artista lembra muito um olhar de ficção científica, especialmente em sua versão do céu visto da Terra à época de Noé e sua civilização. O forte brilho do sol e a proximidade de outros corpos celestes extremamente luminosos além de outros planetas vistos a olho nu são destaques interessantes. Ao contrário do que possa parecer, não há artificialidade nisso, mas é preciso lembrar que se trata de um mundo criacionista, portanto, visões particulares a respeito da aparência do céu àquela época são muitíssimo bem aceitas.

Um outro fator que nos chama a atenção é algo que Henrichon já havia usado em Leões… e que agora o faz em outro tempo histórico: os meticulosos detalhes do cenário e sua caracterização quase viva, com alto poder de sugestão para construção dramática que o leitor faz da obra. O destaque aqui vai para a cidade de Babilônia e para toda a sequência a partir dos Anjos Caídos. O encontro com Matusalém (o homem mais longevo da Bíblia, que viveu 969 anos) e o milagre feito pela semente dada por Deus a Enoque, que a passou para Matusalém, que a passou para Noé é um momento realmente poderoso, com o surgimento dos simbólicos rios e da densa floresta que dava material para a construção da Arca. Cada detalhe, cor, traço e ângulo é bem colocado, o que nos faz aplaudir com gosto Niko Henrichon por mais um ótimo trabalho.

O roteiro de Darren Aronofsky e Ari Handel é objetivo e muito interessante de se ler. Como o cenário do dilúvio é algo bastante conhecido do grande público, a história tende a ter um alcance maior do que se fosse sobre um acontecimento bíblico praticamente desconhecido como o da jumenta falante de Balaão, por exemplo. O que também contribui para aproximar o leitor é o contexto social, bélico e ambiental em torno da humanidade nesse período. A forma de tratamento da natureza e as relações entre os homens são as mesmas que temos hoje (reflexo da atualidade na obra de quem escreve sobre o passado), o que aumenta ainda mais a carga emocional da história e opõe a família de Noé à corrupção, mortandade, desrespeito e ganância que os cercava.

A cadência dos acontecimentos, o ritmo e a aparição das visões do protagonista sobre o dilúvio são um golpe de mestre da narração. Os roteiristas conseguem contar uma história que se passa em um considerável período de tempo, dar nuances da psicologia das personagens principais, desenvolver histórias paralelas e estruturar elementos fortes e muito bem contados para a linha central de toda a história, que vai das primeiras visões de Noé até o momento em que ele e os Anjos Caídos ficam frente a frente ao “milagre do Criador”.

Tudo indica que a qualidade das outras três edições da graphic novel seja a mesma que a desta abertura, e se assim for, teremos uma visão muito peculiar e inesquecível desse evento curioso do livro dos Gêneses. De qualquer forma, ao menos essa primeira edição já entrou para a minha lista de favoritos.

Noé (Noah) – Estados Unidos, 2013
Roteiro: Darren Aronofsky, Ari Handel
Arte: Niko Henrichon
Editora: Image Comics (EUA)
144 páginas

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