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Crítica | O Labirinto de Kubrick (Quarto 237)

por Ritter Fan
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Obsessão.

Essa é a marca de Stanley Kubrick, um dos mais geniais diretores da Sétima Arte. E esse também é o objeto de estudo desse interessante documentário que lista e estuda uma série de teorias originadas a partir de O Iluminado, a incursão de Kubrick no gênero de horror.

Aquele que assistir o documentário pelas teorias em si, levando-as a sério como se seu diretor, Rodney Ascher, também as considerassem sérias, estarão lendo erroneamente o objetivo do cineasta. Também errarão se acharem que esse é um estudo sobre a obsessão de Kubrick. Não. O Labirinto de Kubrick trata da obsessão em geral, ilustrada especificamente por meio das mais bizarras – e algumas extremamente interessantes – teorias “de conspiração” que surgiram depois que diversas pessoas assistiram dezenas de vezes O Iluminado e o combinou com determinados aspectos históricos e políticos.

No entanto, Ascher não discrimina e tem para todo mundo em seu documentário, até mesmo para quem acredita piamente em todas as maluquices que ouvem por aí sobre qualquer coisa. Portanto, querendo um estudo psicológico ou uma mera análise da riqueza (presente ou não) desse filme de Kubrick ou até mesmo uma combinação dos dois, esse documentário é um achado, daqueles que no mínimo deixarão um sorriso no rosto de quem o assiste, ainda que haja risco dele exacerbar a obsessão naqueles que já têm tendência a isso.

Usando muitas imagens do filme, narração em off e entrevistas, o diretor nos conta – e nos traz as “provas” – de que Kubrick inseriu muito mais em sua obra do que uma “mera” narrativa de descida aos confins da loucura. Todos que conhecem o conjunto da obra desse genial diretor acostumaram-se e admiram sua atenção aos detalhes, às simetrias absolutas em cada plano e suas manias. Kubrick era conhecido por seu detalhismo obsessivo, como exigir uma mesa gigante de feltro verde em Dr. Fantástico apesar do filme ter sido filmado em preto-e-branco, quase fazer Malcolm McDowell ficar cego ao fazê-lo passar de verdade pela famosa cena com os olhos forçosamente abertos em Laranja Mecânica  e infernizar a vida de Shelley Duvall em O Iluminado para que ela ficasse realmente desesperada na sequência do taco de baseball. Tudo isso e muito mais é fato, mas O Labirinto de Kubrick é capaz de adicionar camadas e mais camadas nessa obsessão do diretor, camadas essas que muito provavelmente não estão lá, mas cujo estudo é fascinante da mesma forma, mostrando o quanto uma obra de arte pode gerar devoção, análise e criar também obsessão.

É nos levando por essas histórias fantásticas que Ascher nos faz mergulhar na mente de pessoas comuns que viram O Iluminado uma quantidade pouco saudável de vezes, ainda que o resultado – algumas teorias – realmente levantarão as sobrancelhas do mais cético. Abaixo, tratarei de algumas dessas teorias, mas como ver o documentário sem conhecê-las é uma experiência muito mais recompensadora, sugiro que leiam apenas após terem assistindo O Labirinto de Kubrick.

Apesar do documentário ser crivado de “pequenas teorias”, com a imagem de Kubrick que supostamente aparece nas nuvens na abertura do filme e o “desparecimento” de Dunga (um dos Sete Anões) da parede do quarto de Danny que significaria que ele agora não é mais “bobão” e sim “iluminado” (Dunga, em inglês, é Dopey, que significa, grosso modo, “tapado”), o importante mesmo são as grandes teorias, aquelas que demonstrariam um subtexto na obra de Kubrick que pouca gente conheceria. Verdadeiros “recados” que Kubrick teria deixado muito bem escondido em seu antepenúltimo filme.

A primeira delas traça paralelo entre o extermínio de nativos americanos e O Iluminado. Mostrando os quadros nas paredes do hotel e localizando o Hotel Overlook geograficamente, os conspiradores tentam demonstrar que o filme é Kubrick basicamente clamando por justiça pelo tenebroso passado de morte e destruição causado pelos americanos no povo que vivia no país.

A segunda grande teoria faz o mesmo, só que dessa vez com o Holocausto. Os conspiradores tentam demonstrar que Kubrick não se sentia preparado para lidar com o assunto diretamente e cravejou seu filme de referências ao massacre dos judeus na Segunda Guerra Mundial.

A terceira – e mais completa – teoria, tenta demonstrar, de uma vez por todas, que definitivamente foi Kubrick quem filmou em estúdio o Homem chegando à Lua em 1969. Usando elementos assombrosos do filme, os conspiradores conseguem muito eficientemente demonstrar que O Iluminado seria, todo ele, um pedido de desculpas de Kubrick ao mundo por ter feito parte da gigantesca farsa que teria sido a alunissagem. A teoria em si de que Kubrick seria o homem por trás da alegada farsa (sim, ainda tem gente que acredita que o pouso na Lua foi uma farsa…) é muito conhecida por aí, existindo até excelentes ilustrações de como isso teria acontecido. O grande diferencial de O Labirinto de Kubrick é mostrar que O Iluminado é quase como um ato de contrição, o máximo que Kubrick poderia fazer considerando que ele teria assinado contratos de confidencialidade e estaria sob “ameaça” do governo americano para jamais revelar o engodo.

O Labirinto de Kubrick é muito eficiente ao nunca julgar os conspiradores, tratando tudo de maneira equânime. Com isso, ele joga para o espectador a tarefa de navegar pelo que estamos vendo para tirarmos nossas próprias conclusões, ao mesmo tempo que, com isso, faz seus comentários, também sem julgamento, sobre a obsessão. Gostando ou não de Kubrick (tem alguém que não gosta?), esse documentário é uma diversão só, com seu próprio subtexto mais sério.

O Labirinto de Kubrick (Room 237, EUA – 2012)
Direção: Rodney Ascher
Roteiro: Rodney Ascher
Elenco: Bill Blakemore, Geoffrey Cocks, Juli Kearns, John Fell Ryan, Jay Weidner, Sam Walton, Buffy Visick, Buddy Black, Ash Brophy, Stephen Brophy

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