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Crítica | O Massacre da Serra Elétrica (1974)

por Luiz Santiago
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Para um cinéfilo fã de filmes de terror é quase impossível não listar O Massacre da Serra Elétrica como um dos filmes mais impactantes do gênero. Realizado em 1974, por Tobe Hooper ainda em início de carreira (este foi, na verdade, o seu segundo longa), o filme não apenas marcou época como também serviu de ponto de partida para uma nova fase do horror no cinema, escalando níveis além daqueles transpostos por Alfred Hitchcock em Psicose e Os Pássaros, mais de uma década antes.

A história aqui é livremente baseada na vida de Ed Gein, o assassino cuja carnificina já havia ganhado as telas do cinema através do personagem de Norman Bates, e que voltaria em outras fases da vida (Psicose II, III e IV), além de inspirar, ao longo dos anos, assassinos fictícios como Buffalo Bill de O Silêncio dos Inocentes; Bloody Face, de American Horror Story – Asylum e, no presente caso, Leatherface, personagem cuja máscara é um dos muitos ícones de fantasias de Halloween e cosplays assustadores pelo mundo afora.

O que nos chama a atenção neste filme – e nos faz admirar a alta qualidade da obra, justamente pela dificuldade de produzi-la nessas condições – é que Hooper, além da pequena experiência em longas-metragens, tinha um magro orçamento para trabalhar e atores de pouca ou nenhuma experiência no elenco.

Foi preciso muita criatividade para dar vida ao excelente cenário macabro da casa do Leatherface e sua família, um local que nos mostra o horror de forma crua, gráfica e chocante, atiçando a mente de vários espectadores para as mais diversas reações e interpretações da obra. Há quem veja Leatherface e sua família como uma sátira ao governo dos Estados Unidos, o perigo mascarado fazendo coisas inimagináveis tanto abertamente quanto às escondidas (lembremos que a Guerra do Vietnã estava em seu penúltimo ano e o Caso Watergate permanecia na memória recente do país).

Em algumas entrevistas Tobe Hooper chegou a citar os casos e disse não ser absurda essa interpretação, mesmo que criticá-las abertamente fosse a última de suas intenções quando, ao lado de Kim Henkel, escrevera o roteiro do filme.

Mas à parte as várias formas de ver a fita ou ver no horror de ossos, sangue e bizarrice um reflexo barroco da sociedade americana, é fato que O Massacre da Serra Elétrica mostra um lado medonho – e infelizmente real em partes – da sociedade americana, a sua violência oculta e, especialmente nesse caso, o modo como a mulher se torna alvo favorito desse tipo de atitude.

O filme chegou a ser comparado a um exploitation, visto que a personagem de Marilyn Burns ganha um destaque aterrador na reta final da trama. Chegaram a fazer uma experiência de exibição para uma plateia selecionada e, ao final, perguntaram qual era a coisa mais assustadora do filme na opinião daqueles espectadores. Muitos responderam que tiveram mais “medo” de Marilyn Burns e sua via crucis de tortura, captura, fuga, gritos e olhos em primeiríssimo plano na tela do que de Leatherface e companhia. Curioso, não?

Outro ponto louvável do filme é o seu quase inexistente uso de trilha sonora. Tobe Hooper procurou alternar cenas de horror psicológico, gore e semelhantes criando um ambiente visual dinâmico (e inovador pelo modo como foi trabalhado) adicionando, como complemento, sons do ambiente. São poucos os momentos em que ouvimos a famosa ‘música chocante’ dos filmes de terror e, quando ela aparece, faz um serviço rápido de contexto macabro para então dar lugar ao som infernal da motosserra (não é uma serra elétrica, como diz o título brasileiro), os gritos lancinantes de Marilyn Burns, sons de animais, portas ou piso rangendo, etc. Trata-se de uma edição e mixagem de som em parte dialética e em parte não realista cujo produto final tem um enorme impacto sobre o público.

De filme independente de baixo orçamento e realizado por artistas fora do glamour hollywoodiano, O Massacre da Serra Elétrica passou a ser um marco do horror. O filme tem lá seus problemas de roteiro (nos diálogos iniciais e no desenvolvimento, exceto na reta final) e cambaleia na direção, mas é inquestionavelmente um marco cinematográfico. Ali estavam lançadas as sementes de um tipo mais cru para o terror, um formato que em maior ou menor intensidade já era visto nos filmes B e em obras que optavam por um outro tipo de medo como em O Bebê de Rosemary (1968), mas que a partir de seu enorme sucesso passou a flertar com os grandes estúdios e se tornar um modelo de susto pré-definido.

Em 1982, o próprio Tobe Hooper revisou o padrão com Poltergeist – O Fenômeno, e remodelações diversas foram feitas a partir de então. Um novo tipo de medo ganhava a praça, o medo que investia na degradação do corpo, da mente e da alma. A fuga, embora fosse uma opção, não era a melhor coisa a se fazer. A morte horrenda foi estabelecida como aceitação moral para o gênero. O resultado disso a longo prazo todos nós já sabemos.

O Massacre da Serra Elétrica (The Texas Chain Saw Massacre) – EUA, 1974
Direção:
Tobe Hooper
Roteiro: Kim Henkel, Tobe Hooper
Elenco: Marilyn Burns, Allen Danziger, Paul A. Partain, William Vail, Teri McMinn, Edwin Neal, Jim Siedow, Gunnar Hansen, John Dugan, Robert Courtin
Duração: 83 min.

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