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Crítica | O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel (versão de cinema e versão estendida)

por Ritter Fan
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estrelas 5

Quando se fala na trilogia de O Senhor dos Anéis dirigida por Peter Jackson, tudo o que se ouve é formado por alguma hipérbole. É “sensacional” para cá, “maravilhoso” para lá, “perfeito” acolá. Há até as hipérboles da hipérbole, com coisas do tipo “sensacionalmente maravilhoso” e “maravilhosamente perfeito”. São conceitos obviamente subjetivos e, como tais, qualquer crítico deveria fugir deles.

Mas só se forem críticos sem sentimentos ou aqueles tomados por sentimentos de superioridade tais, que inflam suas críticas de comedida erudição para não parecer pouco profissionais. Se a hipérbole é ruim, talvez o pedantismo seja pior ainda e, para deixar muito claramente estabelecido onde eu me encontro, vou logo dizendo: a trilogia O Senhor dos Anéis de Peter Jackson é a própria encarnação audiovisual da hipérbole e, portanto, os elogios todos do primeiro parágrafo aplicam-se sim a esse trabalho majestoso da New Line em parceria com um diretor em que a produtora tudo apostou para que a visão de J.R.R. Tolkien finalmente saísse do papel de forma respeitosa.

Afinal de contas, a trilogia de Tolkien era considerada como infilmável, impraticável. Seu universo grande demais e sua narrativa complicada demais para que um filme ou mesmo alguns filmes fossem capaz de fazer jus à obra que, diga-se de passagem, já contava com uma legião de fãs fervorosos. Mas Peter Jackson perseverou, mudou conceitos, aplicou seu orçamento como um maestro rege uma orquestra e o resultado excedeu o que todo mundo – talvez até ele – esperava.

Querem uma hipérbole que não poderia ser mais hiperbólica? O Senhor dos Anéis é, para os anos 2000, o que Star Wars significou para as décadas de 70 e 80: pioneirismo, ultrapassagem de barreiras e avanço técnico. Pronto, falei.

Mas o primeiro ponto que vem à cabeça depois de assistir A Sociedade do Anel, o primeiro e, para mim, o melhor da trilogia, é a frieza do diretor, Fran Walsh e Philippa Boyens em se despir do fanboyismo que normalmente mata projetos dessa natureza e escrever um roteiro que é bem sucedido em todos os pontos. O ponto principal, aqui, é entender que os livros de Tolkien, para usar palavra cunhada por espetacular político brasileiro, eram “imexíveis”. Qualquer supressão de passagem e alteração de capítulos seriam – e foram, na verdade, por aqueles que não sabem que livro é livro e filme é filme – vistos como sacrilégios. Mas eles não se fizeram de rogados e, dentro das limitações de orçamento (eram 300 milhões para os três filmes, valor extremamente baixo mesmo para a época) conseguiram captar a essência da obra de Tolkien e, mesmo sabendo que fariam uma trilogia, encapsularam cada um dos filmes de forma que eles tivessem começo, meio e fim.

Além disso, o lado técnico do trabalho foi absolutamente fascinante e mostrou o trabalho de amor que foi fazer essa obra. Estabelecendo a produção na Nova Zelândia, seu país natal e então desconhecido como polo audiovisual, Peter Jackson literalmente reconstruiu a Terra-Média usando um misto inteligente de efeitos visuais e práticos que, no final das contas, conseguiu, com enorme fidelidade, transpor para as telas a riqueza da obra máxima de Tolkien.

O trabalho da Weta Digital, em muitos aspectos, pode ser comparado ao da Industrial Light & Magic de George Lucas à época do primeiro Star Wars: era uma empresa pequena, incipiente mesmo e que teve que criar tecnologia para tornar possível a visão do criador. A Weta fez exatamente a mesma coisa e, hoje, é referência na área.

Os figurinistas, comandados pelas hábeis mãos de Ngila Dickson e Richard Taylor, além do designer de produção Grant Major e do supervisor de direção de arte, Dan Hennah, tiveram a hercúlea tarefa de literalmente trazer à vida cada detalhe do Condado e do enorme mundo de Tolkien de forma consistente com o material fonte, mas que também fosse prático e eficiente sob o ponto de vista de uma obra audiovisual.

Andrew Lesnine, encarregado da fotografia, consegue trabalhar filtros e lentes que dão a verdadeira dimensão da duríssima tarefa de Frodo e seus amigos em uma das maiores missões que a ficção já criara. O mesmo vale para a grandiosa montagem de John Gilbert, sempre consciente da necessidade de manter a história em movimento mesmo quando alguns longos diálogos expositivos são necessários.

Mas caiu mesmo nos ombros de Peter Jackson a tarefa de reunir toda essa tropa e comandá-los brilhantemente ao longo de três anos de trabalho ininterrupto em uma aposta da New Line que poderia tê-la facilmente levado à falência (leia mais sobre a produção, aqui). A reunião do elenco, formado literalmente por quase ilustres desconhecidos (com exceção de Ian Holm, Ian McKellen, Cate Blanchett e, claro, Christopher Lee), parece uma conjunção astral de tão perfeita e sincronizada. Certamente contribui para isso que muitos deles tiveram que literalmente se mudar para a Nova Zelândia por um longo período de tempo, mais do que o costumeiro em produções audiovisuais.

E, fechando com chave de ouro, há a trilha sonora de Howard Shore que, talvez em seu momento mais inspirado, conseguiu escrever o que ainda reputo como sendo seu melhor trabalho.

A história vocês devem estar se perguntado? Bom, para aqueles que viveram em uma caverna até hoje, vamos lá: trata-se da jornada de Frodo (Elijah Wood), pequeno hobbit com pés peludos que é tragado para uma aventura por Gandalf (Ian McKellen), com o objetivo de derreter um anel mágico na montanha onde ele foi criado, de forma a impedir que Sauron – a encarnação do mal – volte a dominar a Terra-Média. Para isso, a sociedade do título é formada, composta de seres de várias raças (hobbits, humanos, elfos, anões e magos) que tem como objetivo ajudar Frodo a carregar seu fardo.

Peter Jackson foi inteligente ao acabar o filme no final do arco que ele cria. Se a narrativa começa com Frodo sendo induzido a iniciar a jornada por Gandalf, com ela começando de verdade com a formação da Sociedade do Anel, o final lógico seria, justamente, quando do fim dessa sociedade e é justamente isso que o diretor faz. O movimento circular é crível e encerra um tema da trilogia, deixando, claro, as portas abertas para outros.

Não gostar de A Sociedade do Anel é aceitável, pois gosto é absolutamente subjetivo. Não apreciar o escopo da empreitada de Peter Jackson e não enxergar o que ele e sua equipe alcançaram com o filme é que é um problema sério. De resto, sobram as hipérboles, que nunca são demais.

Versão estendida:

estrelas 5

O gigantesco sucesso de toda a trilogia de O Senhor dos Anéis tornou essa propriedade extremamente valiosa e a New Line, em parceria com sua empresa matriz, a Warner, não economizaram esforços para tornar o filme ainda mais atraente para o maior número de pessoas. Como, em 2002, quando o filme foi lançado em DVD, uma das grandes modas era a criação do “corte do diretor” ou da “versão estendida”, esse foi o caminho seguido para agradar aos fãs que queriam mais da Terra-Média.

O resultado foi a versão estendida de A Sociedade do Anel. De já longos, mas necessários, 178 minutos, o filme pulou para 228 minutos, sendo que, desse tempo, 20 minutos são de créditos aos fãs. Assim, são, na prática, 208 minutos de projeção, ou seja, 30 minutos de material extra.

A diferença é que, fugindo do lugar-comum, Peter Jackson efetivamente trabalhou na inserção dessas cenas na versão que foi aos cinemas e o resultado é algo com significado, com relevância para aqueles que efetivamente adoraram seu trabalho (sim, pois ninguém que tenha desgostado dos 178 minutos será maluco o suficiente para assistir algo ainda maior). Novos efeitos especiais foram renderizados e um extenso trabalho de escolha do que entraria foi feito, de maneira que o resultado final, ainda que não necessariamente afete a história em si (nem deveria, não é mesmo?) arrancasse sorrisos dos rostos dos fãs.

A maioria dessas cenas é formada de pequenas inserções aqui e ali, de apenas alguns segundos. Algumas poucas cenas efetivamente inéditas – e muito queridas – são reinseridas na narrativa, com ao entrega dos presentes de Galadriel (Cate Blanchett) à Socidade do Anel. Mas o que interessa é que o resultado cumulativo dessas pequenas inserções aumenta em muito o fator “épico” da jornada dos heróis. Temos uma melhor sensação de passagem de tempo, de distância, de dificuldade. Além disso, aprendemos mais sobre Bilbo (Ian Holm) e sobre a relação dele como Frodo. Vemos mais Lothlorien, vemos mais humor, vemos mais da dúvida de Frodo ao partir de Valfenda (Argh, detesto esse nome! Rivendell é tão mais bonito!).

Por incrível que pareça, essa meia hora adiciona muita coisa em termos de experiência e imersão no universo de Tolkien. Deve ter sido difícil para Jackson filmar e, depois, decidir pela não inclusão dessas cenas no trabalho final de cinema. Mas esse é o trabalho do diretor.

Se fosse possível dar mais do que cinco estrelas para a versão estendida de A Sociedade do Anel, eu daria.

O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel (The Lord of the Rings: The Fellowship of the Ring, EUA/Nova Zelândia – 2001)
Direção: Peter Jackson
Roteiro: Peter Jackson, Fran Walsh, Philippa Boyens, J.R.R. Tolkien (romance)
Elenco: Elijah Wood, Sean Astin, Sean Bean, Cate Blanchett, Orlando Bloom, Billy Boyd, Ian Holm, Christopher Lee, Andy Serkis, Ian McKellen, Peter McKenzie, Dominic Monaghan, Viggo Mortensen, John Rhys-Davies, Harry Sinclair, Liv Tyler, Hugo Weaving
Duração: 178 min. (versão de cinema), 228 min. (versão estendida)

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