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Crítica | Os 12 Macacos (1995)

por Luiz Santiago
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Spoilers!

Baseado no curta-metragem A Pista / La Jetée, de Chris Marker, Os 12 Macacos (1995) é possivelmente o filme mais “acessível” de Terry Gilliam, e mesmo assim, uma obra que afasta inúmeros espectadores desavisados, que talvez imaginem Bruce Willis, Madeleine Stowe e Brad Pitt em papeis convencionais de uma ficção científica. Mas nada é convencional em Os 12 Macacos.

O primeiro grande elemento do filme surge logo nos créditos de abertura, na forma da Suite Punta del Este, de Ástor Piazzolla. O público não imagina que a esta música (e outras faixas como What a Wonderful World, Blueberry Hill e Sleep Walk) formarão a carga emocional das diversas viagens ao longo do filme, tanto entre tempos diferentes, quanto entre espaços geográficos em um presente prestes a sofrer um fatídico ponto de ruptura.

Assim como no filme de 1962, Os 12 Macacos nos coloca a história de um prisioneiro residente no subterrâneo, que é escolhido para realizar viagens no tempo devido a sua boa memória. Entre os anos de 2035, 1996 e 1990, vemos o protagonista James Cole (bem interpretado por Bruce Willis) cumprir uma missão que lhe dá o perdão da pena e ao mesmo tempo o faz ficar preso em um momento de seu passado que, após o desfecho da obra, imaginamos se era por amor a Kathryn (Madeleine Stowe) ou uma espécie de ímã pessoal representado pela figura de si mesmo, quando criança, assistindo a cena de sua própria morte. Paradoxo, viagens no tempo e conceitos de predestinação e livre-arbítrio encaram situações complicadas e fazem o espectador debater-se um pouco para organizá-las e depois aceitá-las ou não, segundo seu julgamento moral.

O roteiro do filme, escrito por David Webb e Janet Peoples, consegue criar uma intrigante percepção dúbia no espectador, que em dado momento da obra questiona-se se o personagem estava alucinando ou se tudo aquilo realmente havia acontecido. Para quem conhece La Jetée, essa percepção talvez seja apenas uma sombra ou nem exista, mas fica claro identificar o jogo de realidades na tela, questionamentos e brincadeiras com a memória e até com a História que pode vir de forma literal (neste ponto, mais sutilmente) ou de forma estética (muito forte), com referências bastante especiais aos filmes Os Quatro Batutas (1931), Um Corpo Que Cai (1958), Um Estranho no Ninho (1975) e Fuga de Nova York (1981), pluralidade cinematográfica que mostra a predileção de Terry Gilliam por grandes excessos e também a sua capacidade em trabalhar organicamente com eles.

Mesmo que o início do filme tenha um ritmo mais lento do que deveria e a primeira viagem seja abrupta e pouco interessante, o público rapidamente se esquece dessas falhas e foca na jornada de Cole, que tenta cumprir uma missão complexa ao mesmo tempo que tem o “infortúnio” de se apaixonar por uma mulher de seu passado, o que ocasionará uma vigilância mais agressiva por parte dos cientistas que o enviaram e selará o seu destino no aeroporto. O espectador pode esquecer a tentativa do roteiro em apontar para uma fala do futuro além de 2035, este sim, posto como uma alucinação de Cole mas que, a exemplo de La Jetée, tenta mesclar unidades temporárias e problematizar ainda mais o roteiro, algo que infelizmente, em Os Doze Macacos, tem pouco impacto. Todavia, o longa consegue funcionar muitíssimo bem com dois espaços temporais básicos, o do futuro condenado (que por sua reconstrução com base em sucatas e restos do grande desastre me lembrou, guardadas as devidas proporções, Um Cântico Para Leibowitz) e o passado depressivo e decadente antes mesmo do vírus ser uma realidade.

A direção de Gilliam é realista, mesmo quando o desenho de produção alcança picos barrocos na mistura de tecnologias e invenções em todo o cenário de 2035, que guarda muitas semelhanças com o ambiente de Brazil — O Filme e O Teorema Zero, semelhanças que acabaram fazendo alguns cinéfilos considerar as obras parte de uma trilogia, embora isso não tenha sido afirmado ou pensado por Gilliam. O púbico é jogado em dois mundos que se julgam, de alguma forma, vitoriosos, mas são, cada um a seu modo, decadentes e compartilham dos mesmos desvios de comportamento, estruturas de manipulação mantidas pelos que detém qualquer tipo de poder (científico, bélico, financeiro, etc.) e luta de alguns indivíduos para se verem livres do julgo dessa manipulação e controle, chegando a nos reapresentar quase literalmente a luta dos personagens de Eles Vivem, de John Carpenter: compre, assista TV, obedeça.

Gilliam ainda consegue ótimas performances de seus atores, principalmente do trio Bruce Willis, Madeleine Stowe e Brad Pitt, que representam mundos psíquicos e comportamentais completamente diferentes mas que acabam encontrando-se por trilharem, sem saber, o mesmo caminho. Suas atuações carregam o máximo de emoções e engajamento possível em seus personagens, algo que torna a obra ainda mais crível, crítica e estranhamente familiar.

O olhar para o futuro e a problematização do presente são colocados em Os 12 Macacos a partir da memória de um indivíduo — que ganha narrativa a partir de seu ponto de vista mas isto não cansa o espectador graças ao trabalho de Mick Audsley na montagem –, da reconstrução ou da manipulação da História e da da destruição da humanidade em larga escala, um evento distópico mas que ganha ares de “banalidade do mal” se vermos que, querendo ou não, já fazemos isso em diversos núcleos de nossa sociedade e em inúmeras situações ao longo dos séculos.

Os 12 Macacos (Twelve Monkeys) — EUA, 1995
Direção: Terry Gilliam
Roteiro: David Webb Peoples, Janet Peoples (baseado no roteiro de A Pista / La Jetée, de Chris Marker).
Elenco: Joseph Melito, Bruce Willis, Madeleine Stowe, Brad Pitt, Jon Seda, Michael Chance, Vernon Campbell, H. Michael Walls, Bob Adrian, Simon Jones, Carol Florence
Duração: 129 min.

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