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Crítica | Perdidos no Espaço (1998)

por Ritter Fan
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Sempre há aqueles filmes que permanecem em nossa memória como excelentes e não há nada que aconteça que mude isso. E não falo aqui apenas daquelas obras assistidas com tenra idade que guardam aquele apelo nostálgico natural que muitas vezes até nos fazem hesitar em conferi-las quando adultos para evitar desapontamentos. A adaptação cinematográfica da clássica série sessentista Perdidos no Espaço é uma delas para este crítico. Desde a primeira vez que a assisti nos cinemas, já “burro velho”, conectei-me imediatamente com ela e, mesmo ao longo dos anos, em meu processo de transformação em “crítico chato”, cada vez que a revia, minha impressão inicial era mantida, desafiando explicações que consigo dar para outras obras tecnicamente não tão boas – ou ruins mesmo – que aprecio, como praticamente todos os filmes de brucutu dos anos 80. E, revendo mais uma vez o filme para a confecção da crítica, o mesmo fenômeno repetiu-se.

Mas um crítico que se preze minimamente não pode sucumbir apenas aos gostos pessoais e deixar de reconhecer, por mais doloroso que seja, os problemas nos filmes que gosta debaixo dos guarda-chuvas genéricos do “eu gostei” ou, pior ainda, do “é divertido, portanto é bom”. Afinal, ser divertido e ser bom não deveriam ser características mutuamente excludentes. Perdidos no Espaço, que conta com nomes como William Hurt, Mimi Rogers e Gary Oldman no elenco, é um filme fronteiriço nesse aspecto, apresentando um bom conceito, uma boa história, efeitos especiais de videogame ainda apreciáveis (com um gigantesca exceção que abordarei mais a frente), mas uma execução de conjunto que deixa muito a desejar.

E o maior culpado, aqui, talvez seja Akiva Goldsman. Para Uma Mente Brilhante que ele escreve, temos coisas pavorosas como Batman & Robin e O Código Da Vinci. Se Perdidos no Espaço não fica nem tanto ao mar, nem tanto à terra, isso se dá pelas simpáticas homenagens que ele faz à série original, fruto da mente efervescente de Irwin Allen. Usando uma história de origem praticamente reproduzida do episódio piloto e devidamente modernizada, frases clássicas e situações e personagens (e pontas de June Lockhart, Mark Goddard, Angela Cartwright e Marta Kristen, além da voz de Dick Tufeld de volta para o robô) que mantém o espírito dos originais em muitos aspectos, Goldsman consegue o mérito de, mesmo com uma pegada séria e não cômica como a que marcou a série a partir da 2ª temporada, criar algo que se comunica bem com o que veio antes. No entanto, ele peca demais na transformação de todos os personagens que não sejam o pai Professor John Robinson (Hurt), o filho geninho Will Robinson (Jack Jonhson e Jared Harris) e o maquiavélico Dr. Zachary Smith (Oldman) em recortes de cartolina que ou não tem desenvolvimento algum (como é o caso de Penny Robinson, vivida por Lacey Chabert) ou é a epítome da canastrice clichezenta, como é o Major Don West, vivido pelo terrível – absolutamente terrível – Matt LeBlanc, mais conhecido como o Joey, de Friends.

Como se isso não bastasse, Goldsman conseguiu transformar os diálogos do filme em um desfile de frases que, quando não são puramente constrangedoras, servem como textos explicativos daquilo que estamos muito obviamente assistindo, chamando o espectador de burro seguidas vezes. A tentativa de estabelecimento de uma relação amorosa entre Don e a Dra. Judy Robinson (Heather Graham, até se esforçando, mas não conseguindo ir além do básico), a filha mais velha da família é tão ruim, mas tão ruim, que acho uma perda de tempo sequer explicar a razão. Basta ver a interminável e insistente troca de farpas absolutamente sem jeito entre os dois para dar câimbras nos olhos de tanto revirá-los.

Se Hurt é Hurt e ele não faz feio mesmo não tendo material decente para trabalhar, Oldman é a pepita de ouro (que por pouco não parece pirita) da projeção, já que ele consegue reunir em medidas iguais vilania, egoísmo e covardia em uma mistura que consegue nos fazer lembrar de Jonathan Harris no papel original, mas sem imitá-lo. O Dr. Smith de Oldman é claramente de Oldman, mas é possível entrever o “fantasma” de Harris por trás como a clara fonte de inspiração, mesmo considerando a pegada mais séria e em tese pesada da narrativa.

Essa atmosfera sombria é, também, um diferencial aqui. O roteiro, em seu terço inicial, é eficiente ao pintar um quadro cataclísmico para a Terra no futuro, que obriga o investimento, por uma coalizão de países, na construção de um portal que permitirá a colonização de um planeta distante. No entanto, para que o motor de dobra funcione sem que as naves de evacuações se percam no espaço, é necessária a construção de um portal também na outra ponta e é isso que a missão de 10 anos da nave Júpiter 2, sob o comando de John Robinson, objetiva fazer. Mas um grupo terrorista, usando o Dr. Smith, sabota a nave, fazendo com que eles sejam catapultados, pelo uso emergencial e inevitável do motor de dobra sem o portal, para uma região desconhecida no espaço. É nesse aspecto que a história de Goldsman é vitoriosa, apesar da execução tenebrosa em termos de desenvolvimento de personagens e diálogos. E essa pegada continua quando fascinantes conceitos de viagem no tempo são inseridos na narrativa, carregando a curiosidade do espectador até os minutos finais. O design de produção demonstra esmero no desenvolvimento de naves e de trajes espaciais, chegando até mesmo a arriscar uma abordagem retrô para a superfície do planeta onde eles acabam caindo, fazendo-a parecer os cenários “de isopor” da série original. A fotografia de Peter Levy avança no lado mais sombrio e carrega nos tons de azul, mantendo uma impressão monocrômica asfixiante e urgente, que combina bem com o ambiente que é estabelecido desde o início.

O CGI, para uma obra noventista, é muito bom. Mesmo que o espectador atual vá torcer o nariz para alguns elementos aqui e ali, diria que o filme envelheceu bem nesse quesito, com as aranhas espaciais, os uniformes e a sequência inicial de batalha se segurando surpreendentemente bem se levarmos em consideração a tecnológica disponível à época. Mas há um grande e inescapável problema que já era enorme em 1998 e que, hoje, gera aquele movimento muscular involuntário de enfiar a cabeça debaixo das almofadas do sofá em vergonha alheia. Do que estou falando? Do horrível, tenebroso, medonho, patético, pavoroso, constrangedor e execrável CGI utilizado para dar vida a Blarp, criaturinha alienígena presente unicamente para ser outra referência ao macaquinho da série original. Falando em macaco, a única forma de propriamente classificar esse trabalho é afirmar que É como se o filho de 10 anos do programador responsável por esse “negócio” tivesse sido o responsável pelo bicho.

Perdidos no Espaço não é um filme completamente perdido, mas fica ali, perigosamente oscilando entre o passável e o ruim. É uma daquelas obras que o espectador consegue entrever algo com potencial, mas que nunca é atingido. Isso a não ser, claro, que você, como eu, goste demais do filme independente de qualquer outra consideração.

Perdidos no Espaço (Lost in Space, EUA – 1998)
Direção: Stephen Hopkins
Roteiro: Akiva Goldsman (baseado na série de TV de Irwin Allen)
Elenco: William Hurt, Mimi Rogers, Heather Graham, Lacey Chabert, Jack Johnson, Gary Oldman, Matt LeBlanc, Jared Harris, Mark Goddard, Lennie James, Marta Kristen, June Lockhart, Angela Cartwright, Dick Tufeld
Duração: 130 min.

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