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Crítica | Quod Erat Demonstrandum

por Guilherme Coral
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estrelas 4

Muito se fala sobre as ditaduras militares que assolaram o mundo no século XX. De Mussolini a Pinochet temos amplas possibilidades de abordagem, trazendo retratações das lutas contra tais governos ou das opressões sofridas por eles. Em Quod Erat Demonstrandum nosso olhar se volta para a Romênia de Ceausescu, um regime comunista autoritário em plena Guerra Fria. A obra, contudo, se destaca por trazer o comum, uma visão sobre a vida de determinados indivíduos que sofrem com a passiva e constante pressão do Estado.

A trama é simples. Um gênio, professor de matemática, está frustrado com os constantes vetos, por parte do governo, em ter suas teses publicadas. Já nos meados de seus trinta anos, Sorin Parvu (Sorin Leoveanu), ainda não conseguiu seu doutorado e teme ter sua carreira para sempre estagnada. Burlando as amarras do sistema ele acaba publicando, nos EUA, através de um amigo, uma de suas teses. Tal fato, contudo, não passa despercebido pelas autoridades que passam a vigiar o professor esperando para um próximo deslize dele. Para isso utilizam as pessoas mais próximas à sua volta, inclusive Elena Buciuman, por quem é apaixonado. Elena, por sua vez, deseja se mudar para a França e reencontrar com seu marido.

O que mais nos chama a atenção no longa-metragem é a sua evidente monotonia. Definitivamente não é um filme fácil de ser assistido, mas essa característica conta com um forte valor narrativo. Assistimos a vida pacata de um grupo de pessoas, indivíduos que simplesmente sobrevivem dia após dia com pouca comida, diversão e até mesmo motivações. É um sistema lento e mesmo a mais simples das requisições pode demorar anos nas mãos burocratas do governo. Quod Erat Demonstrandum utiliza uma linguagem realista aos nos oferecer essa visão e, com atores ainda amadores, consegue nos passar uma distinta sensação de não estarmos vendo personagens e sim pessoas que, de fato, passam por aqueles problemas de seu dia-a-dia.

Chega a ser tragicamente cômico que um professor de matemática simplesmente passe a ser perseguido porque publicou um paper no exterior, algo completamente inofensivo, mas que ganha proporções bíblicas somente por estarmos na Guerra Fria. É como uma constante desconfiança que perpassa todo um país e isso, claramente, se reflete na própria disposição das pessoas – praticamente apagadas, como parte do cenário que as envolve.

É na estonteante fotografia de Vivi Dragan Vasile que esse elemento ganha uma notável força. Composta unicamente de tons de preto e branco, não temos como deixar de sentir a falta de vida naquele local. Aliado aos poucos movimentos de câmera, com planos longos que, na maioria dos casos, dispensa os planos e contra-planos, temos uma ação praticamente sonífera que é imediatamente refletida na disposição dos personagens e mesmo no espectador. Trata-se de um constante desconforto ao estarmos diante da falta de movimento daquelas engrenagens, tanto por parte dos indivíduos, quanto pelo governo, que praticamente emite sua aura afetando a todos os cidadãos.

Essa desconfortável imersão, contudo, sofre alguns abalos principalmente no trecho inicial da obra, que aparenta não conseguir encontrar o caminho por qual deseja trilhar. Vemos uma constante mudança de foco narrativo que chega a confundir o espectador e que custa um longo período de tempo para colocar todas as peças no tabuleiro. Novamente vemos a intenção clara do diretor e roteirista Andrei Gruzsniczki em transmitir a monotonia daquela sociedade, mas, nesse caso, ele falha por não conseguir nos engajar, de imediato, à projeção.

Tal deslize, porém, não nos distancia da qualidade da obra, que, embora difícil de ser assistida, consegue nos causar um evidente impacto. É uma notável retratação do autoritarismo sob um olhar pouco utilizado, que não aposta na revolta e sim na completa passividade. Definitivamente não é um filme para todos e requer uma grande dedicação, mas que vale a experiência.

Quod Erat Demonstrandum (idem – Romênia, 2013)
Direção: 
Andrei Gruzsniczki
Roteiro: Andrei Gruzsniczki
Elenco: Sorin Leoveanu, Ofelia Popii, Florin Piersic Jr., Virgil Ogasanu, Tora Vasilescu, Marc Titieni, Dorian Boguta
Duração: 107 min

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