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Crítica | Robin Hood (1973)

por Gabriel Carvalho
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“Você sabe, existiu um monte de lendas e mentiras sobre Robin Hood. Todas muito diferentes. Nós do reino animal temos nossa própria versão. É a história do que realmente aconteceu na floresta de Sherwood.”

A antropomorfização de animais é uma das mais célebres características recorrentes na filmografia da Disney. Ao encontrar no folclore inglês o mítico Robin Hood e as peripécias que aprontara na floresta de Sherwood, o estúdio de animação decidiu por transformar os personagens lendários da mitologia do Príncipe dos Ladrões em animais – um mero ajuste estético para torná-los mais reconhecíveis. Sendo assim, o protagonista se torna uma raposa, seu melhor amigo apresenta-se como um urso e o vilão toma a forma de um leão franzino. As associações com as figuras das estórias são inúmeras e o primeiro grande acerto do filme é conseguir nos fazer assimilar, para além da própria narrativa, os animais com os seus respectivos representantes. A mais clara destas relações entre homem e natureza é a de Ricardo Coração de Leão (Peter Ustinov) – rei da Inglaterra na época em que, supostamente, Robin Hood também viveu. Indo adiante, a aparição do rei serve como uma exaltação do contraste de sua aparência com a de seu irmão, o Príncipe John, sendo notável o fato do antagonista da obra, também um leão, receber o mesmo intérprete que Ricardo. Além da apresentação física, Peter Ustinov trabalha a voz de um modo diferente da anterior ao incorporar a real realeza no final da animação, dando adeus àquela mais fina. Ao se tornar o verdadeiro rei da Inglaterra, distante de seu povo até então, Ustinov exala a imponência, o respeito e a bondade existentes no peito de um líder que o povo precisa. Ao passo que ele se encontra longe, porém, cabe a Robin Hood roubar dos ricos para dar aos pobres, impedindo a falência dos moradores de Nottingham, esgotados devido os impostos excessivos cobrados por John, o rei temporário.

A trama prossegue sem grandes surpresas, mantendo-se em uma linha leve, mas extremamente aventureira; uma mistura encabeçada pelo charmoso Robin Hood, na voz de Brian Bedford, ator que emprega uma elegância não-refinada ao protagonista. Ao seu lado, João Pequeno é uma reimaginação do carismático Balu, de Mogli: O Menino Lobo. Ambos os personagens são trabalhados por Phil Harris – o que, apesar de tornar João Pequeno igualmente simpático em relação a Balu, enfraquece as tomadas de decisão feitas em Robin Hood por si só. Dessa maneira, o aspecto redundante torna-se um demérito ao passo que o melhor amigo do herói é uma reciclagem comportamental do melhor amigo de Mogli, mas sem o mesmo foco na amizade. Com o intuito de injetar uma outra peça no tabuleiro dessas terras britânicas, além do embate de Hood contra injustiças cometidas pela nobreza, os roteiristas não demoram para encaixar o interesse amoroso do protagonista, Maid Marian (Monica Evans), em cena. Infelizmente, a química entre os dois é fabricada de uma maneira pouco convincente, adicionando-se camadas de background ao relacionamento à base de exposição preguiçosa. Enquanto Robin Hood continua sendo um bom herói da história, certamente galanteador, Maid Marian torna-se uma coadjuvante sem graça, com pouco a fazer senão dar abertura a introdução da incrível Lady Kluck (Carolle Shelley), certamente destoante em personalidade quando comparada ao interesse amoroso de Hood – uma personagem que só pode ser categorizada deste modo, como o interesse amoroso de Hood, o que é uma pena, visto que a animação se atrela a estes clichês sem qualquer encorpamento. O herói enfrenta o mal e conquista a garota.

Também não há muita inventividade na hora de se produzir a animação pela animação. O primeiro encontro dos dois amantes é sucedido por um número dançante feito à base de cópia e cola. Intensificando o processo de não-originalidade, muitas sequências animadas de Robin Hood são repetições das feitas em outros filmes da Disney, como o já citado Menino Lobo e até o primeiríssimo longa-animado do estúdio, Branca de Neve e os Sete Anões. A semelhança física de Balu com João Pequeno dá margem para que cenas inteiras sejam repetidas na estrutura, algo que barateou os custos de produção, mas também deu sinais de desgaste à empresa. A sequência de dança, portanto, é desnecessária. Já a animação apresenta traços bastante simples, mas é papel das cores fazê-la chamar atenção, dando bastante vida aos personagens e garantindo um sentimentos estético rústico, mapeando o ambiente e imergindo o espectador nele. O verde, aliás, é uma força neste cenário da Idade Média. Ademais, as aparências dos coadjuvantes devem ser notadas, como a do Frei Tuck (Andy Devine) e a de Alan-a-Dale (Roger Miller). Os animadores transformam um simples texugo em uma amigável figura do clero, que, assim como Robin Hood, trabalha em favor dos pobres. A sua importância na narrativa casa com a sua proposta em cena. Ao acabar sendo preso, o filme soa realmente dramático, sendo este o ápice do distúrbio retratado neste reflexo social, no qual os pobres vão parar atrás das grades justamente por serem pobres. Por outro lado, o teor sentimental de sua presença, assim como a do protagonista, não é perfeito, beirando algumas vezes à pieguice, enquanto, em outras, encontra o ar do triunfalismo heroico que revigora qualquer alma.

Já em relação ao galo Alan-a-Dale, Robin Hood acerta ao torna-lo tanto narrador quanto personagem da história, o que garante, presumidamente, a veracidade do que se é narrado, mesmo que a narrativa seja protagonizada por arquétipos de heróis, vilões e coadjuvantes indefesos. Eis a história do que realmente aconteceu na floresta de Sherwood. Em um outro plano, embora contenha várias dessas padronizações de personagens, Robin Hood, ao tratar dos seus antagonistas, aborda caricaturas que acabam por atender requisitos mais lúdicos. O “grande” Príncipe John é um leão ganancioso, mas, acima de tudo, covarde, bastante dependente de uma estima que não existe dentro do seu peito. The Phony King of England, cantada por Phil Harris, destroça qualquer intenção da obra em fazer John um vilão realmente ameaçador. Sua parceria com o traiçoeiro Hiss (Terry-Thomas) simplesmente não existe, algo que abre possibilidades extremamente cômicas; uma piada pronta. É o Xerife de Nottingham (Pat Buttram) que dá mais raiva ao espectador, cobrando impostos dos habitantes de uma maneira completamente indiscriminada. A contraposição de heróis com os vilões, porém, exalta-se na inventiva ação da obra, que tem, excluindo-se a última, um viés particularmente galhofa. O cantarolar do galo também promove uma pegada musical própria – Oo-De-Lally exemplifica essa ótica, combinando narração com canção. Em termos musicais, Robin Hood é singular, afeiçoando-nos tanto por Whistle-Stop, uma espécie de tema do filme, quanto por Love, indicada ao Oscar. Com uma espirituosidade substituindo uma qualidade mais formal, o cinema de Robin Hood é aventura infantil, despretensiosa, mas também energética.

Robin Hood – EUA, 1973
Direção: Wolfgang Reitherman
Roteiro: Larry Clemmons, Ken Anderson, Vance Gerry, Frank Thomas, Eric Cleworth, Julius Svendsen, David Michener
Elenco: Brian Bedford, Monica Evans, Phil Harris, Andy Devine, Roger Miller, Carolle Shelley, Peter Ustinov, Terry-Thomas, Pat Buttram, George Lindsey, Ken Curtis, John Fiedler, Barbara Luddy, Billy Whitaker, Dana Laurita, Dori Whitaker, Richie Sanders, Barbara Luddy, J. Pat O’Malley, Candy Candido
Duração: 83 min.

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