Home QuadrinhosArco Crítica | Sexteto Secreto (1968 – 1969)

Crítica | Sexteto Secreto (1968 – 1969)

por Luiz Santiago
240 views

estrelas 2

Entre maio de 1968 e maio de 1969, a DC Comics publicou pela primeira vez uma série de histórias escritas por E. Nelson Bridwell (co-criador da saga, na edição #1) e Joe Gill e ilustrada por Frank Springer (co-criador da saga, na edição #1) e Jack Sparling, e que davam conta das aventuras do Sexteto Secreto por diversos lugares do mundo, lutando contra mafiosos dentro e fora do governo e contra comunistas das mais diversas origens, tudo sob as ordens do misterioso e jamais revelado Bem-Te-Vi (Mockingbird). Nota: algumas traduções aqui no Brasil chamam esse personagem de Harpia.

Esta primeira encarnação do grupo teve apenas 7 edições publicadas. Abaixo, segue o time que compôs o Sexteto Secreto na Era de Prata dos quadrinhos, mais algumas de suas caraterísticas principais e por quê foram forçados a trabalhar para Bem-Te-Vi:

August Durant  Físico nuclear americano infectado por um vírus (obra dos comunistas). Salvo por uma droga oferecida por Bem-Te-Vi, ministrada periodicamente, fazendo com que Durant tivesse que servir às ordens recebidas, caso contrário, morreria. O personagem tem influência em diversas instituições americanas (CIA, NASA, Pentágono).

Lili de Neuve — Acusada injustamente de assassinato, a famosa atriz francesa seria condenada à morte caso Bem-Te-Vi não lhe conseguisse um álibi. Entrou para o Sexteto, abriu um SPA e tornou-se mestra da maquiagem e do disfarce. Ajudou Kit Dawn a tornar-se a modelo Crimson Dawn.

Da esq. para dir.: Rei Selvagem, August Durant, Crimson Dawn, Carlo di Rienzi, Lili de Neuve, Tigre.

Esq. — dir.: Rei Selvagem, August Durant, Crimson Dawn, Carlo di Rienzi, Lili de Neuve, Tigre.

Carlo di Rienzi — Um dos maiores ilusionistas e “mestres de fuga” do mundo, até que se recusou de pagar pela proteção da máfia napolitana. Teve sua esposa morta e o filho aleijado. O garoto voltou a andar com a ajuda de Bem-Te-Vi, que, em contrapartida, fez Rienzi entrar para a equipe.

Crimson Dawn (Kit Dawn ou Kim Dawn) — Era um rica herdeira até que um gigolô lhe deu o golpe e acabou com todo seu dinheiro. Bem-Te-Vi lhe ofereceu uma nova identidade. Auxiliada por Lili de Neuve, Kim transformou-se em Crimson Dawn. Além de ser boa de lábia, é uma habilidosa lutadora de artes marciais mistas.

Tigre (Mike Tempest) — Ex-boxeador. Após ignorar a ordem de Maxie Jones, que controlava a máfia do boxe, para perder no quinto assalto, e após entregar Jones à polícia, Tigre foi deixado à beira da marte pela máfia. Ele só sobreviveu com a ajuda de Bem-Te-Vi. Desde então, tornou-se Mike Tempest, e para não ser entregue aos seus antigos algozes, obedece às ordens do seu misterioso “benfeitor”.

Rei Selvagem (King Savage) — Piloto americano na guerra da Coréia. Foi abatido, interrogado e entregou tudo do governo americano para os coreanos. O que seria um desastre para seu país acabou tornando-o um herói quando Bem-Te-Vi o libertou e virou o jogo, enviando-o à ONU para entregar aos americanos os planos dos inimigos. Dessa forma, acabou entrando para o Sexteto e também se tornou um bem-sucedido dublê/ator de cinema.

Na primeira história do grupo, quando as apresentações são feitas de forma rápida e os vemos enfrentar Zoltan Lupus na Ilha Tártaro, temos a melhor das sensações de estar lendo uma mistura de Missão Impossível com 007 ambientados em cenários e com elementos textuais dignos do final dos anos 1960. O roteiro de E. Nelson Bridwell (que a partir da edição #2 escreveria em parceria com Joe Gill) não é didático e constrói um suspense que dá suporte à ação quase suicida dos personagens. O leitor entende de imediato que Bem-Te-Vi não é um vilão e que ele tem por objetivo prender ou exterminar grupos e pessoas que as “forças oficiais” não podem tocar [não é à toa que façamos ligação imediata entre o Sexteto Secreto e o Esquadrão Suicida, que aparecera pela primeira vez na The Brave and the Bold #25, em setembro de 1959].

sexteto secreto original

O ponto principal da série é essa jornada contra o tempo e contra criminosos que pretendem fazer do mundo um lugar pior. Utilizando-se das diferentes habilidades do sexteto, os autores tiveram a possibilidade de elencar ameaças e empecilhos onde cada integrante poderia mostrar uma carta na manga. Neste ponto, as histórias jamais perdem a graça, porque não escanteiam personagens em nenhum momento. Todavia, há três grandes problemas que atrapalham, e muito, a leitura da história após a revista de número um. Em primeiro lugar, incomoda a repetição quase patológica que os roteiros fazem da origem de cada personagem e isso acontece em todas as edições. Os autores até tentam fazer essa apresentação de maneira diferente, mas já na terceira revista isso se torna insuportável. Em segundo lugar, a falta de variação nos enredos, que parecem contar exatamente a mesma história só que em espaços geográficos diferentes e com diferentes vilões. E em terceiro lugar, o teor moral e eticamente questionável dos roteiros.

Sobre este último ponto, é necessário uma maior explicação. Todo bom leitor sabe que ao entrar em contato com uma obra é preciso que ele contextualize o que lê com o tempo em que a obra foi escrita e, se possível, tentar saber as motivações (pessoais, sociais) do autor para isso. No caso de Sexteto Secreto, falamos de quadrinhos de ação/suspense escritos no final dos anos 60, no final de uma era marcada por grupos de minorias sociais lutando em massa por direitos iguais (a febre hippie nos Estados Unidos foi um dos “sintomas” disso); de lutas políticas importantíssimas para este cenário da Guerra Fria (maio de 1968 na França) e no surgimento de uma pequena dissidência das tribos jovens que em pouco tempo abriria as portas para a cultura punk.

Ou seja, a despeito da ainda lembrada Crise dos Mísseis de Cuba (1962), da Guerra do Vietnã então em andamento e do recrudescimento da luta entre socialismo e capitalismo, o mundo tinha um outro discurso, e de bastante destaque, em andamento. Por isso é estranho vemos as formas… questionáveis dos autores em retratarem mulheres (em dado momento Crimson diz algo como ter “abandonado o corpo nojento de uma mulher gorda e se tornando uma respeitada modelo internacional” — vejam o naipe do discurso); e também socialistas e comunistas, que são os maiores inimigos que o Sexteto enfrentam. Analisando de forma ampla um outro cenário, é perfeitamente compreensível o tratamento dado por Hergé ao mesmo grupo político em Tintim no País dos Sovietes, por exemplo, mas aqui, em final dos anos 60, a estereotipagem, principalmente para um grupo tão diverso como os socialismos ao redor o mundo, é muito, muito estranho. O que me fez rir muito foi o fato de que além desse elemento presente no roteiro, a arte mostra os comunistas com caras suínas, balofas, sempre com expressões grotescas e ações de violência sem sentido como padrão básico para qualquer negócio. Nem os gângsters e mafiosos que o grupo encontra na “Europa democrática” ou nos Estados Unidos são mostrados assim. Há muito mais humanidade neles.

sexteto secreto

A cada nova aventura, percebemos que o texto destaca um dos membros do Sexteto em um tipo de “história de origem”. Isso é muito interessante e inteligente, porque separa por edição elementos do passado de cada um e levanta dúvidas sobre se o destaque da vez é o misterioso Bem-Te-Vi. Apesar da técnica de exposição funcionar, a repetição de frases e modelos de ação também contaminam o desenvolvimento e, mais uma vez, estamos lendo a mesma coisa… Ao chegarmos na sétima e última edição do volume, damos graças aos muitos panteões de deuses por isso. O que lamentamos é o fato de a revista ter sido cancelada sem a revelação da identidade do Bem-Te-Vi, embora, devo confessar, isso tem uma boa aura de mistério. Não sei ao certo se gostaria realmente de saber qual dos seis era o “contato”. Suspeito, porém, que a “ave escondida” era August Durant.

Produto de seu tempo, mas mostrando um lado ideológico bastante conservador da sociedade, o Sexteto Secreto foi o primeiro passo para uma nova geração de “mercenários de rabo preso” que embarcavam forçadamente em missões perigosas para fazer justiça onde a Justiça, o Exército, o Estado, a Polícia e os governos falharam. O conceito é muito bom e a primeira edição do volume também. Pena que o restante da saga não tenha seguido assim. Se há um consolo, é que as futuras formações do grupo reparariam o erro. Algumas delas, com muito louvor.

Sexteto Secreto Volume 1 – Completo (Secret Six Vol. 1) — EUA, maio de 1968 – maio de 1969
Editora: DC Comics
Roteiro: E. Nelson Bridwell, Joe Gill
Arte: Frank Springer, Jack Sparling
Capas: Frank Springer, Nick Cardy, Jack Sparling
24 páginas (cada edição)

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais