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Crítica | Star Trek: Discovery – 1X01 e 1X02: The Vulcan Hello / Battle at the Binary Stars

por Guilherme Coral
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– Contém spoilers do episódio. Leiam nossas críticas dos filmes e séries de Star Trek, aqui.

Mesmo dentro da ficção científica, poucas são as obras tão à frente de seu tempo quanto Star Trek, ou Jornada nas Estrelas. A série original e suas sequências não só introduziram tecnologias que, com o passar dos anos, veríamos correspondentes similares (celulares, tablets, etc), como sempre trabalhou com um elenco diversificado, vide Uhura, Sulu ou até Chekov (cuja participação é surpreendente, considerando que eram tempos de Guerra Fria). De 2005 para cá, porém, os fãs da franquia ficaram órfãos de uma série passada nesse universo, buraco que, em partes, foi preenchido pelos filmes da linha do tempo Kelvin, iniciados pelo longa de 2009, dirigido por J.J. Abrams. Eis que Discovery, enfim, chega para nos levar de volta ao universo original da Enterprise.

Cronologicamente falando, o seriado se passa aproximadamente dez anos antes dos eventos da série original da década de 1960, ou seja, antes da bifurcação temporal causada pelos eventos que vemos no filme de 2009. Um breve prólogo nos mostra um klingon buscando unir as vinte e quatro casas de sua raça, revivendo seu império a fim de entrar em guerra contra a Federação. Do outro lado, vemos Michael Burnham (Sonequa Martin-Green) e a capitã Georgiou (Michelle Yeoh) em um planeta desértico, restaurando uma fonte de água potável para a população local, criando, logo de início, o evidente antagonismo entre as duas mulheres: enquanto uma se prepara para a guerra, a outra garante a sobrevivência de outra raça.

Após os créditos de abertura, nos vemos no interior da U.S.S. Shengzhou, que se encontra em uma missão para averiguar o que destruíra um dos satélites da Federação. Ao avistarem um objeto desconhecido, a primeira oficial, Michael, segue para investigar e lá descobre a presença de klingons nesse setor. Não demora muito para que a nave dessa raça guerreira se revele, indicando a iminência de uma guerra entre a Federação e o império.

The Vulcan Hello Battle at the Binary Stars funcionam claramente como um episódio duplo, um começando imediatamente de onde fomos deixados no outro. A função introdutória dos capítulos é evidente, com diálogos expositivos (alguns em excesso, especialmente no começo), que buscam introduzir as novas audiências a esse universo. Como se trata de uma grande preparação de terreno, não há muito tempo para se aprofundar na relação entre os personagens, muitos dos quais não sabemos se retornarão no terceiro, considerando os estragos da batalha na segunda parte dessa première. Desde já, porém, fica bem claro que tanto Yeoh, como a capitã, quanto Doug Jones, como Saru, encontram-se bem mais a vontade em seus papéis do que a atriz principal, Martin-Green.

Evidente que ela, também, encontra-se no papel mais difícil de se interpretar. Como uma humana criada em Vulcano, ela oscila entre seu lado emotivo e o racional, não podendo ser tão “travada” quanto seu mentor, Sarek (James Frain), também conhecido como o pai de Spock, ou descontraída e emotiva quanto sua capitã, Georgiou. De qualquer forma, esse processo de habituação da atriz com sua personagem é visível e pode incomodar em determinados trechos dos capítulos, ainda que ela vagarosamente encontre-se na personagem. Similarmente, a dicção mais travada de Chris Obi, como o klingon unificador, T’Kuvma, proporciona algumas rupturas no ritmo dos episódios alongando demasiadamente certas sequências, ainda que a utilização do idioma alienígena seja louvável. Aliás, para os trekkers de plantão, a Netflix disponibilizou legendas em klingon(!!!).

Esse ritmo inconstante mantém-se até os trechos finais de The Vulcan Hello, que, então, dá espaço para uma maior agitação com a iminência do conflito entre as duas facções, ponto que é utilizado para dividir a capitã e sua primeira oficial, abrindo a dúvida se as ações da protagonista foram ou não motivadas pelo seu passado, além de erguer uma grande barreira na carreira da personagem. Tudo se acelera e Discovery apresenta o seu melhor lado, lidando com a diplomacia desse universo em um cenário de alto risco, como já vimos tanto na série original e suas sequências. Vale ressaltar, também, que a quebra de protocolo não é exatamente novidade em Jornada nas Estrelas – o próprio Kirk já o fez inúmeras vezes.

Os estonteantes visuais permitem nossa total imersão, com efeitos especiais que não devem nada a filmes de alto orçamento por aí, além de um excelente trabalho de próteses e maquiagem, que jamais nos fazem duvidar dos alienígenas presentes tanto na nave da Federação quanto do império klingon. O único porém é o design das armaduras dessa raça guerreira, que aparentam ser “limpas” e rebuscadas demais para o que eles representam – faltou mais sujeira, cicatrizes de guerra, arranhões, que embruteceriam ainda mais esses vilões, algo que, curiosamente, pode ser observado em suas naves, que parecem muito mais “vividas” do que as da Federação – essas inspiradas nas artes conceituais de Ralph McQuarrie feitas para um filme que jamais saiu do papel no final da década de 1970 -, cujo foco é a exploração e diplomacia – isso sem falar nos tamanhos, é claro.

Embora grande parte das interfaces das tecnologias mostradas soem mais avançadas que aquelas vistas nas séries anteriores (que, em sua maioria, se passam depois desta), a direção de arte demonstrou um belo cuidado ao apresentar certos recursos menos rebuscados. Um bom exemplo disso é o teletransporte, que só pode ser utilizado enquanto se tem visual da pessoa ou tendo seus sinais vitais reconhecíveis pelos sensores da nave. O mesmo vale para as transmissões holográficas, que apresentam leves falhas e cortes, dando a entender que há espaço para crescimento tecnológico. A baixa iluminação da ponte de comando também pode ser enxergada como um estágio menos avançado do que veríamos posteriormente na série original, além de se encaixar com o tom mais sombrio da série, considerando que ela se situa em tempos de guerra.

Ademais, visualmente falando, o seriado claramente apoia-se nos designs utilizados nos filmes da linha do tempo Kelvin, ponto que pode ser notado facilmente na área de confinamento dentro da nave, muito similar àquela de Além da Escuridão: Star TrekA própria direção de David Semel e Adam Kane apoia-se no estilo desses filmes, com alguns lens flare, que não chegam a incomodar e a câmera inclinada, transmitindo a sensação de estarmos fora da superfície de um planeta. A decupagem da batalha espacial também é similar aos longas pós-reboot, fazendo tais conflitos mais parecerem uma batalha naval do que aérea, aspecto que nos ajuda a “sentir” o peso dessas naves.

Dessa forma, com alguns deslizes no meio do caminho, The Vulcan HelloBattle at the Binary Stars podem não ser a perfeita introdução de uma nova série de Star Trek, mas certamente fizeram valer a espera. Com uma trama mais simples, que nos joga de cabeça em um cenário de guerra passado dez anos antes das aventuras de Kirk e Spock na Enterprise, Discovery demonstra o quão promissora pode ser, deixando-nos já com um angustiante cliffhanger que nos faz querer avançar logo para o próximo dia de exibição.

Star Trek: Discovery – 1X01/02: The Vulcan Hello/ Battle at the Binary Stars — EUA, 24 de setembro de 2017
Showrunner:
 Gretchen J. Berg, Aaron Harberts
Direção: David Semel, Adam Kane
Roteiro: Bryan Fuller, Akiva Goldsman, Gretchen J. Berg, Aaron Harberts
Elenco: Sonequa Martin-Green, Doug Jones,  Shazad Latif, Michelle Yeoh, Shazad Latif,  Anthony Rapp, Mary Wiseman, Chris Obi, James Frain
Duração: aprox. 55 min cada episódio.

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