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Crítica | Star Wars: Episódio II – Ataque dos Clones

por Ritter Fan
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estrelas 1,5

Gostaria muito de poder começar a presente crítica afirmando categoricamente que, depois do tenebroso A Ameaça Fantasma, George Lucas aprendeu com seus erros e soube remediá-los no segundo filme da Trilogia Prelúdio. No entanto, se fizesse isso, estaria me enganando e enganando meus leitores. Ataque dos Clones consegue sim ser melhor que seu antecessor (o que não é mérito algum, aliás), mas repete diversos problemas e introduz outros, de maneira que o semblante de uma narrativa coesa e relevante cai por terra mais uma vez.

Dez anos se passaram desde os eventos de A Ameaça Fantasma. Obi-Wan Kenobi (Ewan McGregor), agora um experiente Mestre Jedi, tem como seu padawan (ou pupilo) o crescido Anakin Skywalker (agora Hayden Christensen), depois da promessa que foi obrigado a fazer a Qui-Gon Jinn (Liam Neeson) logo antes dele morrer. A relação entre os dois, apesar de mostrar laços de amizade, não é simples, pois a impetuosidade e arrogância de Anakin geram rusgas que nunca são bem resolvidas, contribuindo para o gradual afastamento dos dois. A República, por outro lado, vem sendo ameaçada por um movimento separatista comandado pelo ex-Mestre Jedi Conde Dooku (ou Dookan, no Brasil, já que Dooku geraria risinhos imbecis de adolescentes bobalhões), vivido pelo sempre sensacional e saudoso Christopher Lee e a agora senadora Padmé Amidala (Natalie Portman) sobrevive a uma tentativa de assassinato, sendo colocada sob a vigilância dos dois Jedi.

A trama vai muito além, com o jogo político do futuro Imperador Palpatine (Ian McDiarmid) ganhando em absurda complexidade, complexidade essa que envolve a criação de um exército de clones para ajudar os Jedi a conter os separatistas, caçadores de recompensa surgindo do nada, combates estilo “arena romana” em Geonosis, planeta-fábrica de armamentos e uma volta à Tatooine com direito ao efetivo começo do mergulho de Anakin para o Lado Negro da Força (e, não, eu não uso “Lado Sombrio”, pois se você vê em “Lado Negro” algo politicamente incorreto ou se isso ferir suas suscetibilidades, por favor vá se tratar). Em suma, é uma trama que, em sua superfície, se mostra mais interessante do que a do primeiro filme da Trilogia Prelúdio, mas cuja inabilidade de George Lucas na direção e no roteiro somadas às atuações que novamente deixam muito a desejar, resultam em uma fita desapontadora.

Se, como muitas vezes George Lucas afirmou, sua hexalogia é mesmo a história da ascensão, queda e redenção de Anakin Skywalker, então o criador desse engajante universo falha fragorosamente ao encapsular e focar o problema e o conflito que um dia levaria o personagem ao Lado Negro da Força. Para começar, o salto temporal de 10 anos é a primeira prova da irrelevância de A Ameaça Fantasma. Nada que acontece lá tem consequência aqui e o pouco de conexão que existe – Shmi Skywalker (Pernilla August), mãe de Anakin – é recontada, restabelecida e recriada (afinal, ela agora não é mais escrava, casou e foi sequestrada por Tusken Raiders) nesta segunda parte. Quando Anakin e Obi-Wan reentram no cenário, entendemos sua amizade ao mesmo tempo que percebemos o quão cheio de si Anakin se tornou, mas não sentimos de verdade isso acontecer. Apenas somos informados disso pelas atitudes infantiloides de um jovem que aparentemente não cresceu em nada desde que era Jake Lloyd. E George Lucas – dessa vez dividindo os créditos de roteiro com Jonathan Hale – cria situações para deixar isso claro não uma, duas ou três vezes, mas sim a cada 10 minutos de projeção em que somos obrigados a aturar Hayden Christensen tentando nos convencer que sabe o que é o conceito de “atuar”, em outra escalação absolutamente equivocada de elenco.

Mas essas relações de Anakin com Obi-Wan e também com Padmé perdem relevância diante da profusão de acontecimentos ao redor em uma desnecessariamente complicada trama que literalmente atira para todos os lados e que vive de oferecer aos fãs momentos cool que se esquecem completamente da lógica interna. Querem um exemplo? A luta entre o sapo saltitan.., digo, entre Yoda e o Conde Dooku (nada de risadinhas!). Ela existe apenas como fan service, para mostrar o quão Mestre é o Mestre Jedi. Mas, muito ao contrário, ela mostra que Yoda é bem menos do que imaginávamos que ele era, especialmente depois de ser convertido de uma magnífica marionete para um ser em CGI que não convence. Sua luta altamente coreografada com Dooku é anti-climática e ostensivamente inútil dentro da trama. Um desperdício de dois grandes personagens.

No entanto, se fosse só isso, Ataque dos Clones teria mais valor. Acontece que somos introduzidos à trama dos clones, que envolve uma viagem de Obi-Wan até o planeta Kamino, coberto de água, em que ele descobre, em um exemplo de como não se escrever um roteiro, que existe uma espécie de conspiração há anos para criar um exército clonado a partir do DNA de um aleatório Jango Fett (Temuera Morrison), o caçador de recompensas indiretamente responsável pelo segundo atentando à vida de Padmé (e por uma interminável sequência de pod race – ou algo semelhante – em Coruscant que só tem um fim em si mesmo e nada mais). As informações passadas são esparsas e não se encaixam com a história maior. Nas mãos de um bom roteirista, o mistério seria aos poucos desvelado na trama ou mesmo no filme posterior, mas todos sabemos que nada disso acontece e esse mistério permanece um mistério sem sentido e jogado na estrutura do filme que precisava justificar a existência das Guerras Clônicas, expressão usada por Obi-Wan mais velho (Alec Guinness) em Uma Nova Esperança, quando Lucas não tinha ideia do sucesso que tinha em mãos.

E com eu poderia deixar de comentar sobre o absolutamente insuportável romance entre Anakin e Padmé? Querem um exemplo típico de texto mal escrito e atuações abissais em uníssono? Então o namorico – e casamento! – dos dois em Naboo é o que de mais revoltante vocês encontrarão. Diálogos exclusivamente baseados em clichês, olhares lânguidos, momentos “engraçados” que geram vergonha alheia e, claro, uma dupla com nenhuma química, apesar dos esforços de Portman que simplesmente não são suficientes para dar peso e veracidade aos sentimentos de Padmé tamanha é a patacoada do roteiro. É como ver uma novela da Globo, mas daquelas especialmente mal feitas.

Há outros exemplos de sérios problemas no roteiro, como a sequência “Mario Bros.” na linha de montagem em Geonosis ou o pouco tempo empregado no importante massacre dos Tusken Raiders, que deveria servir como ponto de virada da trama, mas é mais fácil admitir logo de uma vez que Ataque dos Clones é, na verdade, um Ataque ao Roteiro e deixarmos por isso mesmo. Se existe um aspecto realmente bom – e que é o único em que vemos Lucas realmente ouvindo a reação das pessoas – é a supressão quase que integral do linguarudo anfíbio Jar Jar Binks…

A computação gráfica, tão onipresente quanto em A Ameaça Fantasma, é, mais uma vez, cartunesca. Toda aquela sensação tão sensacional de “universo vivido” que a Trilogia Original esmerou-se em passar ao espectador desaparece diante de um polimento extremo de tudo que é visto em cena, de cenários estáticos a personagens digitais. Mesmo a “sujeira” é visivelmente artificial, o que contribui para uma quebra negativa da quarta parede, tornando os espectadores auto-conscientes do que estão vendo, terminando por impedir uma verdadeira imersão cinematográfica. Em poucas palavras, os efeitos servem apenas ao espetáculo raso e não para efetivamente impulsionar a história.

Mas a direção de arte ganhou polimento, com um visual mais espetacular e coeso do que no primeiro episódio, graças ao trabalho de Peter Russell (também de A Ameaça Fantasma), que parece ter ganhado mais liberdade aqui. O mesmo vale dizer do design das criaturas e dos veículos utilizados na trama, que são extremamente variados e interessantes, apesar do CGI que muitas vezes revela sua verdadeira natureza.

E, salvando o dia, tem-se a trilha sonora de John Williams, um compositor e maestro incomum em sua genialidade que prova que mesmo um material fonte abaixo da média pode inspirar notas e acordes de tirar o fôlego. Mesmo sem a grandiosidade de uma peça icônica como Duel of the Fates, sem dúvida o ponto alto da trilha (e do filme) anterior, Williams sabe manipular o espectador trazendo cada vez mais os famosos leit motifs da Trilogia Original em versões modificadas, quase que “desconstruídas”, de maneira que realmente possamos acreditar na evolução dos personagens e da história apenas pela música. Só resta lamentar que as imagens que acompanham a trilha sejam tão pouco imaginativas.

Ataque dos Clones, mesmo com o desleixo narrativo de George Lucas, que parece jogar na tela tudo que lhe vem à cabeça sem se preocupar com foco narrativo, consegue ser minimamente superior ao episódio anterior, mas nada que nem de longe o torne um sucessor (ou seria antecessor?) digno da Trilogia Original. Uma pena.

Star Wars: Episódio II – Ataque dos Clones (Star Wars: Episode II – Atack of the Clones, EUA – 2002)
Direção: George Lucas
Roteiro: George Lucas, Jonathan Hales
Elenco: Ewan McGregor, Natalie Portman, Hayden Christensen, Christopher Lee, Samuel L. Jackson, Frank Oz, Ian McDiarmid, Pernilla August, Temuera Morrison, Jimmy Smits, Jack Thompson, Leeanna Walsman, Ahmed Best, Rose Byrne, Oliver Ford Davies, Ron Falk, Jay Laga’aia, Andy Secombe, Anthony Daniels, Silas Carson, Ayesha Dharker, Joel Edgerton, Daniel Logan, Bonnie Piesse, Kenny Baker
Duração: 142 min.

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