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Crítica | T2 Trainspotting

por Guilherme Coral
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estrelas 4,5

Vivemos na era dos remakesreboots e continuações desnecessárias e a cada ano que passa recebemos mais uma produção cinematográfica que jamais esperaríamos ou nunca pedimos por, com até mesmo Blade Runner recebendo uma sequência que, felizmente, parece promissora em virtude de seu diretor, Denis Villeneuve. Quando Danny Boyle disse que estava trabalhando em uma continuação para o seu clássico moderno, Trainspotting, evidente que a notícia foi recebida com grande receio, afinal, a obra fora encerrada perfeitamente há mais de vinte anos, ela realmente precisava ser continuada? Mas não estamos falando de um diretor qualquer e sim do homem que nos trouxe Extermínio (apenas o primeiro), Sunshine – Alerta Solar127 HorasSteve Jobs, alguém que jamais trabalhara com uma sequência, ele, portanto, deveria ter uma ideia muito boa na cabeça. Felizmente, T2 Trainspotting não é a concretização de nossos temores e sim uma obra que sabe se diferenciar do original, nos trazendo um olhar tão real de nossa sociedade quanto fora o filme de 1996.

Depois de vinte anos fora, Mark Renton (Ewan McGregor) retorna para a sua cidade na Escócia. Lá ele encontra seus antigos amigos em situações não tão favoráveis e logo descobrimos que a vida de Renton não se tornara o sonho que ele esperava no final de Trainspotting. Mesmo com todas as libras que roubou de seus companheiros, ele agora está divorciado e sem qualquer perspectiva de emprego, visto que os anos que deveria ter estudado ele passara utilizando drogas. Nem todos, porém, estão tão contentes assim de ver Mark de volta, visto que alguns ainda guardam rancor do sujeito por esse os ter passado para trás anos antes.

Para os saudosistas que esperam ver algo parecido com o filme original, podem desistir, T2 Trainspotting é uma obra que muito se distancia, lidando com outras questões. Existem, é claro, as alusões ao consumo de drogas dos personagens há anos atrás, mas nada no estilo do clássico entrar na privada do antecessor. De fato, o longa até brinca com a questão do seu passado mais de uma vez, criando uma ótima metalinguagem ao dizer que os personagens vivem no passado e não sabem o que fazer com o presente.

Dito isso, a obra dialoga perfeitamente com o desfecho, até otimista, do original, atualizando-o para se encaixar com a realidade mais pessimista e desesperançosa dos jovens da atualidade. T2 é justamente sobre esses sonhos quebrados, a ausência de uma expectativa para o futuro e, é claro, o acerto de contas com o passado. O roteiro de John Hodge, também responsável pelo original, de maneira interessante, decide não focar exclusivamente em Renton, fazendo desta uma história sobre ele, Spud (Ewen Bremner), Simon (Jonny Lee Miller) e Begbie (Robert Carlyle) que aparecem em quase iguais proporções. Com isso em mente, fica fácil enxergar o porquê dessa ser uma obra que necessita termos assistido o anterior, visto que utiliza constantemente os eventos passados como base.

Apesar de não termos o uso constante de drogas como era em Trainspotting, o diretor, Danny Boyle, brinca com essa questão, utilizando uma iluminação que esbanja das cores verde, vermelho, azul e amarelo além, é claro, de filtros que tonalizam a imagem a fim de manter a juventude desses personagens sempre em mente. Dessa forma, em momento algum esquecemos o que os levou até ali e mais de uma vez Mark contempla como seria sua vida caso não tivesse se viciado em heroína – estamos falando de uma obra consideravelmente mais melancólica, ainda que o humor característico da original não tenha se perdido, se fazendo presente através de inusitadas situações e as reações de ira de determinados personagens. Boyle, por vezes exagera em alguns recursos, como os planos que se tornam estáticos em certos momentos, mas nada que estrague a experiência como um todo, apenas acaba irritando o espectador ora sim, ora não.

Claro que para toda essa construção seria necessário que os atores todos conseguissem retornar a seus papéis de 1996, claro que, com algumas diferenças em virtude da passagem de tempo. Chega a ser assustador enxergar no quarteto principal aqueles mesmos jovens de outrora – olhamos para Ewan McGregor e Jonny Lee Miller e vemos, respectivamente, Mark e Simon. Sentimos no olhar de cada um aquela velha amizade com um grande porém no meio dela, uma mágoa nunca resolvida e quando ambos simplesmente sentam no sofá para assistir televisão não há como não esboçar um sorriso. Apesar de tudo, o filme consegue carregar sua carga de otimismo, mesmo nas piores das situações, o que reflete perfeitamente a disposição dos jovens da atualidade, repletos de maravilhosas contradições.

Dito isso, T2 Trainspotting consegue a difícil tarefa de, ao mesmo tempo, se diferenciar do original e se demonstrar no mesmo patamar de qualidade. Estamos falando de uma continuação aparentemente desnecessária, mas que justifica sua necessidade através de si própria, nos trazendo um divertido e, ao mesmo tempo, melancólico retrato de nossa sociedade. Mark, Simon, Spud e Begbie estão de volta e é muio bom ver o qeu aconteceu com eles após todos esses anos. Danny Boyle realmente tinha uma ideia muito boa na cabeça.

T2 Trainspotting — Reino Unido, 2017
Direção:
 Danny Boyle
Roteiro: John Hodge (baseado nos livros de Irvine Welsh)
Elenco: Ewan McGregor, Ewen Bremner, Jonny Lee Miller, Robert Carlyle, Steven Robertson, Shirley Henderson, Gordon Kennedy, Anjela Nedyalkova, Simon Weir, James Cosmo, Scot Greenan, Kelly Macdonald
Duração: 117 min.

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