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Crítica | Terror na Ópera

por Luiz Santiago
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Luvinhas de couro, jovem frígida, freudismo, assassino sádico e banho de sangue: há ingredientes inconfundíveis nos filmes de Dario Argento que podemos apreciar sem moderação em Terror na Ópera (1987), uma espécie de rompimento do diretor com o seu próprio estilo e uma tentativa de renovo que não foi bem recebida nem pela crítica nem pelo público, o que mergulhou a obra de Argento em repetições de fórmulas antigas ad infinitum, em um contexto de orçamentos muito baixos.

É importante ressaltarmos que Terror na Ópera encarna um divisor de águas no modo como é dirigido, o que não significa que o filme não apresente toda uma enciclopédia do giallo e do terror que Dario Argento havia construído desde O Pássaro das Plumas de Cristal (1970). Todos os motivos, personagens, temas e virtuosismo do diretor estão nessa trama operística, mas recebem doses tão altas de vida, que o espectador tende a rejeitar tamanha avalanche de elementos.

Sabe-se que os filmes de Dario Argento situam-se no mundo do antinaturalismo e o diretor é mais capaz de filmar uma sequência para encantar o público e criar um conceito simbólico-artístico do que para servir de explicação lógica à história. Observamos que nesse filme ele comete abusos em demasia, a câmera virtuosa está em cena o tempo inteiro; cada plano é milimetricamente antinatural; a câmera se posiciona de uma maneira tão neurótica como observador, que ao final da película, aquela sensação de “cenas inesquecíveis de um filme do Argento” sequer existe. No conceito de produção, o filme é de uma beleza inegável, tudo é filmado de maneira a dar a entender alguma coisa oculta, mas nada disso é usado para contar bem a história, o que faz o roteiro ter inúmeros momentos patéticos e a má direção de atores sobressair-se com maior vigor.

O que impressiona muitíssimo no filme é como o conceito da observação foi trabalhado. Do olho do corvo na abertura até a fixação do assassino em prender agulhas no olho da protagonista a fim de obrigá-la a assistir aos assassinatos, vivenciamos uma torrente de invasões de lugares através da lente da câmera e do olho humano ou animal. É com esse conceito que o diretor explora ângulos e planos inquietantes, percorrendo o tempo inteiro o cenário do teatro de ópera, o apartamento, as ruas. De algum modo, trata-se de um filme claustrofóbico.

Franco Fraticelli assina a montagem do filme, um dos seus melhores trabalhos. Tento já editado outros filmes de Dario Argento como Prelúdio Para Matar, Suspiria e Phenomena, Fraticelli dominava o conceito de espaço cênico e intenções dramáticas do diretor, o que fez de Terror na Ópera um maravilhoso exercício de edição inovadora, contestando a ideia do corte súbito e deixando os planos se estenderem até mais que o normal, cortando para elementos “soltos” do cenário, experimentando emoções através do movimento de objetos eletrônicos, cênicos ou figurantes.

A trilha sonora é o grande motivo de aplauso do filme, pelo seu ecletismo e pelo rigor do uso. Divida entre o clássico e o metal, a música do filme se sobressai com facilidade na maioria das cenas, e reafirma a mistura de momentos anteriores e as novas tentativas do diretor. Árias de Macbeth, Madame Butterfly, La Traviata e Norma misturam-se ao metal da banda Steel Grave e outras composições de Brian e Roger Eno, Claudio Simonetti e Bill Wyman. Trata-se de uma das mais criativas e bem articuladas trilhas sonoras de um filme de terror.

Mesmo não sendo um dos meus preferidos, e trazendo aquela estupidez de ações das personagens que tanto me incomodam nos filmes de Dario Argento, Terror na Ópera ainda consegue encantar e merece ser visto principalmente por representar uma tentativa de mudança do diretor e, claro, porque o resultado disso pode não ser genial, mas o processo é absolutamente delicioso, sangrento e medonho.

Terror na Ópera (Opera, Itália, 1987)
Direção: Dario Argento
Roteiro: Dario Argento e Franco Ferrini
Elenco: Cristina Marsillach, Ian Charleson, Urbano Barberini, Daria Nicolodi, Coralina Cataldi-Tassoni, Antonella Vitale, William McNamara, Barbara Cupisti, Antonino Iuorio
Duração: 107min.

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