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Crítica | The Walking Dead – 7ª Temporada

por Gabriel Carvalho
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“Eu vou te matar. Não hoje, não amanhã, mas eu vou te matar.” – Mesmo atordoado com a morte de dois amigos, Rick jura vingança a Negan.

  • Observação: Há spoilers da temporada e da série. Leiam, aqui, as críticas de todas as demais temporadas, dos games e das HQs. E, aqui, da série spin-off, Fear the Walking Dead.

Com a promessa de alavancar uma guerra entre Rick e Negan, a sétima temporada estreou com bastante estardalhaço. The Day Will Come When You Won’t Be não é o tipo de episódio mais fácil de ser digerido. Como nunca antes o gore foi ressaltado, e enquanto para uns espectadores toda a construção atmosférica soou espetacular, para outros tudo pareceu sádico ao extremo, em uma tentativa fracassada de fazer-se o que Last Day on Earth deveria ter feito. Mesmo assim, independente da preferência pessoal, aquele episódio teve proporções midiáticas gigantescas, ocasionando um enorme hype para com os capítulos subsequentes. Glenn e Abraham estavam mortos, Rick tinha perdido totalmente sua sede de combate e Negan havia sido apresentado.

Arriscado, Scott M. Gimple deu margem para que os roteiristas fizessem episódios autorais, sem vínculo definitivo com os anteriores e posteriores. Tomando como base os incríveis Clear, What Happened and What’s Going On e Here’s Not Here, episódios com foco não apenas em um núcleo, mas também em um desenvolvimento bem específico, com início, meio e fim, tornaram-se constantes na primeira parte da temporada. Bem fechadinho, The Well, mesmo que em proporções mais abrangentes que os que viriam a seguir, abriu as portas para o Reino, no mesmo passo que abriu as portas para personagens como Ezekiel, Richard e Benjamin. A problematização começa aí, tomando nota que a trama desse lugar relaciona-se diretamente com a ambição de Richard em tomar partido contra o Salvadores e com a consolidação da dona de casa Carol, casulo no qual a já quase senhora, sente-se mais a vontade.

O interessantíssimo, porém pouco explorado, Ezekiel (e a boa performance quase shakespeariana de Khary Payton) dá margem para a aparição de uma das figuras mais icônicas da série: Shiva. Um tratamento em CGI é essencial para dar vida a um tigre, ainda mais em uma série de TV, onde os recursos são mais limitados que em produções cinematográficos. Sem convencer como o tigre de As Aventuras de Pi, Shiva ainda é aceitável, comparada com outros desastres computadorizados vistos durante toda a temporada. O que falar do cervo de Say Yes?

Assim como o Rei que aparece apenas uma vez durante toda a primeira parte da temporada, todo o núcleo do Reino aparenta estar bastante deslocado. Richard, interpretado por Karl Makinen, é o personagem mais coerente desse núcleo, com motivações e desenvolvimento bem lineados, embora esbarre sua resolução com a de Morgan. O ninja paz e amor havia sido abalado quando matou para salvar Carol no episódio da última temporada, no entanto, em Bury Me Here as coisas são elevadas a níveis estratosféricos. Aparecendo poucas vezes, em relances pontuais, Morgan – e especialmente sua relação com Benjamin – começou muito bem. The Well apresentou o personagem e deu um bom indício de uma passagem de bastão, do modo mais literal possível. Mais de cinco capítulos depois, nenhuma menção aos dois ocorrem.

O Reino deveria entrar na guerra, como ocorre no derradeiro final. Mas as coisas deveriam ter sido resolvidas dessa maneira, um tanto quanto artificial? Personagens deveriam ser inteiramente desconstruídos para dar margem a um simples fator narrativo? A química de Carol e Ezekiel funciona em The Well, mas não segura a barra suficientemente para fazer-nos acreditar que tal líder desenvolvera um afeto grande pela mulher. Estagnada, Carol ficou mais parada do que de costume e isso não é ruim. A personagem não deveria necessariamente ser relevante a todo momento e o showrunner inteligentemente esconde-a em uma pacata casa até que sua presença seja necessária.

O mesmo não pode se dizer de Morgan, que incessantemente atrapalha o andamento com um discurso que mesmo adequado ao personagem, não é bem utilizado pelos roteiristas, como fora na sexta temporada. Ao invés de trabalharam esse ponto, os roteiristas apenas desmonta-o completamente, indicando uma solução previsível e pouco condizente com a natureza já estabelecida do personagem. Como, indiretamente, previsto por Ritter Fan, na crítica do segundo episódio, Scott Gimple não consegue equilibrar as diferentes linhas narrativas com eficiência. A sensação de correria atrás do prejuízo é constante.

Isso nos leva então para The Cell, outro episódio cíclico, que retoma o fato de Daryl ter ocasionado, indiretamente, a morte do coreano Glenn. Nas mãos de Negan, Daryl é torturado constantemente, com o intuito de ser levado para o lado dos Salvadores. Apesar de desenvolver muito bem Dwight e sua conturbada relação com Sherry, este já é o primeiro passo torto da série. Mesmo que seja bem conduzido, estes 40 minutos tornam-se bastante redundantes, o que é de fato, um grande problema.

A dupla formada por Austin Amelio e Christine Evangelista ao menos garantem que tais sequências sejam mais instigantes, ao apresentarem em conjunto, uma amargura pesada. O fato de Dwight fazer o que faz para garantir a segurança de sua amada é totalmente plausível e condizente com o personagem apresentado lá atrás, em Always Accountable.  Sua mudança de time no último episódio, mesmo que esperada, retrata muito bem a perda de paciência de um dos súditos de Negan, cansado de ser explorado em troca de favores e justificativas previamente formuladas.

Por outro lado, Daryl mesmo dando indícios de uma bom desenvolvimento, apenas é um mais um soldado supliciado repetidamente por Negan. Sua oposição a Dwight é envolvente, mas muito pouco é explorado nesta temporada. Contudo, Norman Reedus produz algumas de suas melhores atuações em momentos pontuais, durante a morte de Glenn, durante sua consequente tortura e durante os diálogos com Maggie e Carol. Sim, Daryl acaba por fugir do Santuário em Hearts Still Beating, auxiliado por Sherry, e movimentando muito bem a trama. Na outra metade da temporada, no entanto, pouco do personagem é explorado além da sua responsabilidade por ter tornado Maggie viúva. O personagem felizmente dá margem, nesta segunda metade, a um emocionante desabafo de Carol, concordante com o psicológico abalado de sua velha amiga.

Levando a análise para Maggie, a personagem anda muito mais que Daryl. Demonstrando sua vontade de lutar já em The Day Will Come When You Won’t Be, a atriz só retorna em Go Getters, quinto episódio da temporada, no qual ela e Sasha estão residindo em Hilltop. Sabiamente, a filha de Hershel (saudades eternas) vai aos poucos tomando o lugar de Gregory como líder efetivo da comunidade. Jesus está lá também, e contribui para com essa construção, sendo um bom personagem de apoio. Em contrapartida, Sasha alimenta sua fúria na esperança de assassinar Negan. A personagem, uma das mais interessantes já abordadas, acaba por ter seu bonito e derradeiro fim no final da temporada, sacrificando-se em prol de Alexandria. Enquanto que na primeira metade da temporada, pouco de sua personalidade é analisado, quando ela começa a progredir, juntamente com Rosita, as coisas andam muito bem. Apesar disso, quem rouba as atenções mesmo a atenção em Hilltop é Xander Barkeley como Gregory, um talentoso ator em um papel divertidamente ordinário.

Quem junta-se à missão suicida de Sasha é Rosita, que após algumas temporadas, finalmente ganha alguma relevância com a morte de Abraham. Tendo ganho mais atenção dos roteiristas que Sasha, Rosita não morre no final. O sacrifício de Sasha em colocar-se no lugar da latina salva esta da morte. Em cena, Christian Serratos e Sonequa Martin-Green interagem muito bem, cada uma guardando em suas essência s mágoa uma da outra, até que finalmente deixam suas semelhanças serem exaltadas. Na primeira metade da temporada, Rosita também contribui fervorosamente, utilizando como suporte o Padre Gabriel e Spencer Monroe. Enquanto o primeiro é pontualmente referido como, hoje, um dos mais leais companheiros de Rick, o segundo mostra-se como um traidor, não isento de verdade em seu discurso, visto que a culpa de toda aquela situação é mesmo a de Rick. Tendo ideia de que os roteiristas não tem interesse algum em problematizar de fato a liderança de Grimes, Spencer morre em Hearts Still Beating, revelando as tripas que nunca antes demonstrou ter.

Falando em tripas, quem abraça totalmente a covardia é Eugene. Depois de ser humilhado por Rosita, e ter sua única bala produzida sendo desperdiçada pela garota na Lucille, em um momento de fúria, pós morte de Spencer, Eugene é levado pelos Salvadores. Mas, diferentemente de Daryl, Eugene é bem recepcionado em Hostiles and Calamities, ganhando o prestígio que nunca antes tivera. Auxiliando o grupo diversas vezes, em proporções pequenas, Eugene sempre fora relegado para de baixo dos ombros de Abraham, e lá residiu, seguro e bem acompanhado. Estudando seu próprio ser, lutou para tornar-se o que seu amigo era. Em Last Day on Earth, em seu ápice de coragem e bravura, o professor acabou sendo espancado e obrigado a ver seu parceiro de longa data sendo covardemente morto por um cara com bastão de beisebol. O pavor tomou conta de sua personalidade, e ao ver a segurança que tanto prezava do lado de Negan, abraçou-a. Mesmo provocando ira dos fãs mais assíduos da série, não pode-se negar que o desenvolvimento de Eugene é um dos mais bem trabalhados e remete a um dos temas mais importantes que o seriado já esmiuçou: sobrevivência a qualquer custo.

Interrompendo todos os eventos de maior relevância, que já estavam relativamente enfadonhos, tivemos a maior pérola que The Walking Dead já nos presenteou: Swear. Tara e Heath já haviam desaparecido desde Not Tomorrow Yet e aqui retornam para apresentarem uma comunidade nova: Oceanside. Heath vai então fazer 24: Legacy e Tara vai fazer graça. Estes são os primeiros passos para a orquestração da guerra. Mesmo sendo atacada por aquelas mulheres e quase assassinada, a personagem de Alanna Masterson é inacreditavelmente disposta a manter um segredo até o momento mais conveniente possível, quando Rick sai do seu modo cachorrinho de Negan  e decide se armar. Sério, a crise da personagem sobre manter a promessa ou não é desenvolvida enquanto ela está sozinha com Judith, em diálogos pavorosos. Esta foi definitivamente a temporada com as piores soluções narrativas da série.

Após ser destruído no primeiro episódio, demonstrado suas inseguranças no monótono Service e tentado manter os acordos com os Salvadores em missões ao lado de Aaron, Rick Grimes deveria retornar ao seu estado mais visceral. A dor enraizado pela perda de seu amigo Glenn, e a forte humilhação deveria dar brecha para a chegada da esperança. Michonne, mesmo estando em um relacionamento pouco acreditável com o pai de Carl, abre as portas para o ressurgimento do líder que aprendemos a amar. Com seu discurso vitorioso, os dois, juntos, têm em Say Yes o momento de maior intimidade do casal já mostrado para o público. A química de Andrew Lincoln e Danai Gurira torna-se mais evidente. Retoma-se uma questão já estabelecida para adicioná-la camadas e torná-la inteiramente verossímil.

Dito isto, a decisão de armamento de Rick é convenientemente interligada com o surgimento de um novo grupo, o do lixão, em Rock in the Road. Eu ainda não sei como chamá-los pois não há um nome específico. Eles são bizarros, bem bizarros. E não no sentido “Reino” de bizarrice. É algo anormal. O que falar de Jadis? Eu não sei, e New Best Friends consegue demonstrar isso muito bem. Acredito que a intenção de Gimple seja intencional, tendo em mente que até Negan acha-os demasiadamente diferentes, mas no mínimo, questiona-se a intenção do showrunner. O que eu sei é que eles traem o caubói e provam ser aliados de Negan. Inesperado, no mínimo.

Ademais, o encontro entre Alexandria e Oceanside provou ser exatamente o que Swear previa, uma decepção. Sem virilidade para criar um intenso confronto ideológico, The Walking Dead resume boa parte de seu desenrolar em conveniências e atalhos. A batalha final, que torna a guerra uma realidade, é entretenimento puro, pouco inteligente, mas ainda assim satisfatório.

A caricatura dessa temporada, permeada por reis, gente bizarra e tigres, pode ser definida no homem que provocou nossos maiores risos e lágrimas: Negan. Anunciado como a esperança para colocar The Walking Dead no mesmo nível que as maiores séries de drama da atualidade, Jeffrey Dean Morgan despontou magnificentemente em The Day Will Come When You Won’t Be. Em Sing Me a Song, o personagem já estava bem desgastado. A insistência em colocar Negan para falar frases de efeito, ainda que sejam as mais engraçadas possíveis, não funcionou. Talvez o personagem não se adeque a linguagem televisiva, como é nos quadrinhos, ou talvez seja apenas falta de cuidado de Gimple. Ainda assim, neste citado e em Hearts Still Beating, há um ponto notável que induz nós a acreditarmos em um possível frescor agridoce. A relação de Negan e Carl começa a ser trabalhada, só para que o primeiro siga seu próprio caminho e o segundo seja totalmente esquecido na segunda metade da temporada. Definitivamente a pior temporada de Carl.

“Nós somos aqueles que sobrevivem”Esperançosa, Michonne avalia o longo caminho que o grupo de Rick percorreu e fala sobre o futuro deles.

A sétima temporada de The Walking Dead é enfim uma redundância mal organizada. O problema não é o tom mais calmo no qual as coisas são desenvolvidas, ou então o enfoque episódico em um núcleo de cada vez. O problema é a pobreza que se conduz a narrativa da série. Sem uma estrutura bem definida, os episódios não se conectam entre si, com arcos sendo ora em ora esquecidos e retomados tardiamente. Diálogos fracos e convenções são constantes, e a repetição do vilão parece ter o desgastado muito cedo. Parece que não há organização e a parcela mais alta de culpa aparenta ser de Scott M. Gimple, que já fez anteriormente conduções de temporadas muito mais decentes. Mesmo os excelentes desenvolvimentos de personagem, algo que não existia antes da quarta temporada, as direções mais autorais e o ótimo elenco não conseguem salvar esta temporada de figurar junto com outras entre as piores da série.

The Walking Dead – 7ª Temporada — EUA, 2016/2017
Showrunner: 
Scott M. Gimple
Direção: Vários
Roteiro:
Vários 
Elenco: 
Andrew Lincoln, Norman Reedus, Lauren Cohan, Steven Yeun, Michael Cudlitz, Chandler Riggs, Danai Gurira, Melissa McBride, Lennie James, Sonequa Martin-Green, Josh McDermitt, Christian Serratos, Alanna Masterson, Austin Nichols, Seth Gilliam, Ross Marquand, Jordan Woods-Robinson, Katelyn Nacon, Corey Hawkins, Kenric Green, Jason Douglas, Tom Payne, Xander Berkeley, R. Keith Harris, Khary Payton, Karl Makinen, Logan Miller, Austin Amelio, Christine Evangelista, Steven Ogg, Debora May, Sydney Park, Mimi Kirkland, Briana Venskus, Nicole Barré, Pollyanna McIntosh, Jeffrey Dean Morgan
Duração: 
16 episódios de aproximadamente 44 minutos cada.

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