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Crítica | Topázio

por Ritter Fan
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Antepenúltimo filme da fantástica carreira cinematográfica de Alfred Hitchcock, Topázio é, provavelmente, um dos menos conhecidos. Isso desconsiderando, claro, algumas de suas primeiras obras, ainda na fase britânica. No entanto, Topázio é, exatamente como a pedra, uma preciosidade esquecida do Mestre do Suspense, mas não uma pedra preciosa como os diamantes que pontilham em profusão a carreira do diretor, mas uma pedra semipreciosa mesmo. Bonita, agradável, bem talhada, mas não no mesmo nível de seus melhores trabalhos. Mas, em se tratando de Hitchcock, mesmo obras menos que perfeitas merecem a atenção de qualquer cinéfilo, não é mesmo?

Em sua essência, Topázio é um filme de espionagem, mas um que surpreenderá o espectador pela sua verossimilhança. Baseado em romance de Leon Uris que, por sua vez, foi baseado no caso verdadeiro de espionagem conhecido como Caso Safira, Hitchcock nos apresenta, primeiro, ao sisudo Boris Kusenov (Per-Axel Arosenius) e sua família em 1962, em Copenhague. Ele é um agente do alto escalão da KGB que deseja desertar para os Estados Unidos e, para isso, conta com o agente Michael Nordstrom (John Forsythe) da CIA. Depois de uma tensa sequência de fuga – mas sem pirotecnias – ele é levado para os EUA, mais especificamente Washington D.C. onde, relutantemente, começa a revelar segredos aterradores sobre a presença soviética em Cuba, presença essa que deflagraria a chamada Crise dos Mísseis de Cuba naquele mesmo ano.

Apesar de todos os espectadores saberem o final da Crise dos Mísseis, o filme não fica desinteressante. Nordstrom, por diversas razões, é obrigado a pedir ajuda de Andre Deveraux (Frederick Stafford), espião francês residente em Washington que realmente gosta dos americanos. É Deveraux que toma os holofotes a partir desse ponto, tentando obter cópias de documentos sensíveis da delegação cubana em Nova York para um evento. Esse momento, que conta com a fundamental ajuda do simpático e eficiente espião “florista” Philippe Dubois (Roscoe Lee Browne) é, literalmente, a única sequência de ação de todo o filme.

Por todo o resto, que conta ainda com Deveraux viajando para Cuba para espionar a presença soviética por lá com ajuda da bela Juanita de Cordoba (Karin Dor), inspirada na sensata Juanita Castro, irmã de Fidel que fugiu para os EUA depois da chamada Revolução Cubana, além de um clímax esticado em Paris com Deveraux tentando desbaratar a rede “Topázio”, Hitchcock nos apresenta a uma fita que faz das tripas coração para parecer verdadeira e nos convencer que a vida dos espiões é assim, desse jeito, e não como a de James Bond. Com isso, a ação é substituída por diálogos e, especialmente, por um ar procedimental, que explica para os espectadores os detalhes de operações de espionagem. Deveraux, bonitão e charmoso, até reflete aquilo que aprendemos a esperar de James Bond, mas, ao contrário do agente britânico, ele raramente está à frente da ação, se é que podemos chamar as sequências tensas de Topázio de sequências de ação propriamente ditas.

A cadência do filme é lenta, esticada e detalhada. Esse é um dos raros exemplos hitchcockianos de uma produção filmada substancialmente em locação, sem muito uso de cenários de estúdio. Mesmo assim, o cuidado com a direção de arte, figurino e montagem é característico do Mestre do Suspense e, se o espectador estiver preparado para o que verá, certamente sairá satisfeito da experiência, notadamente uma sequência magnífica em que vemos, em plongée, um dos mais “lindos” assassinatos do Cinema.

Mas Topázio sofreu na bilheteria justamente por ser considerado “chato” e “longo demais”. Sem dúvida alguma que a duração de 143 minutos, pouco comum na filmografia de Hitchcock, poderia ter se beneficiado de cortes mais econômicos, com menos detalhes procedimentais. Além disso, a narrativa tem uma estrutura episódica, com personagens específicos para cada parte. Acaba funcionando, mas esse aspecto retira um pouco da fluidez de Topázio, especialmente ao nos depararmos com o clímax mais anti-clímax que já vi em um filme. Sim, o final da obra é, se pensarmos bem, o mais crível dentro da proposta da narrativa, mas deixará aqueles que precisam de uma boa dose de ação ou de algum tipo de surpresa coçando a cabeça. Tanto é assim que o final original continha um duelo entre Deveraux e Topázio, mas ele foi filmado por Herbert Coleman, pois Hitchcock, diante de uma emergência familiar, teve que voltar aos EUA. Quando o diretor viu o resultado, não gostou e, sob pressão da Universal, filmou um final mais apressado que é justamente esse que mencionei (sem revelar segredos para não estragar a experiência de ninguém). Acontece que esse final confundiu a audiência e a Universal o pressionou novamente, levando o diretor a montar um novo final – com ação – usando trechos já filmados de Topázio, é que é bem inferior ao final anti-climático.

Topázio, provavelmente, permanecerá sendo considerada uma obra menor de Hitchcock e, provavelmente por muitos, uma obra ruim mesmo. No entanto, é possível que uma visão mais calma e menos ansiosa sobre o que costuma ser um filme do Mestre do Suspense leve o espectador a apreciar esse esforço do diretor no crepúsculo de sua sensacional carreira.

  • Crítica originalmente publicada em 05 de julho de 2014. Revisada para republicação em 31/07/2020, como parte da versão definitiva do Especial Alfred Hitchcock aqui no Plano Crítico.

Topázio (Topaz, EUA – 1969)
Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Samuel A. Taylor (baseado em romance de Leon Uris)
Elenco: Frederick Stafford, John Forsythe, Dany Robin, John Vernon, Karin Dor, Michel Piccoli, Philippe Noiret, Claude Jade, Per-Axel Arosenius, Roscoe Lee Browne, George Skaff
Duração: 143 min.

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