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Crítica | Tron – Uma Odisseia Eletrônica

por Ritter Fan
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estrelas 2,5

Alguns filmes que se vê na infância e que ativam o “setor nostálgico” do cérebro não deveriam jamais ser revistos. Muito sobrevivem intactos, claro (O Exterminador do Futuro, por exemplo, na opinião desse crítico), outros exigem um pouco mais de esforço, mas resistem bem, como Os Goonies. Outros, no entanto, não sobrevivem ao teste temporal e Tron – Uma Odisseia Eletrônica (esse subtítulo pomposo chega a ser engraçado), definitivamente está nessa categoria. Mas Tron, diferente de muitas obras esquecidas nas brumas do tempo, tem o seu valor mesmo que não seja uma tarefa fácil reassisti-lo mais de 30 anos depois de seu lançamento nos cinemas, quando queixos de crianças e adultos caíram no chão dos cinemas com o mergulho para dentro do então ainda insipiente e misterioso mundo do computador e da computação gráfica.

Mesmo considerando sua coragem à época, a produção da Disney não foi bem recebida. Na verdade, usei um eufemismo aqui, pois Tron foi um verdadeiro fracasso de bilheteria, sem nem chegar a cobrir seus custos durante sua permanência nos cinemas. O filme custou, sem atualização da moeda, 17 milhões de dólares e fez pífios 33 milhões que, se retirada a parcela dos exibidores e outros dispêndios, não chegam ao que foi gasto. Não por acaso, ele somente viria a ser laureado com uma continuação 28 anos depois de lançado. O que aconteceu, porém, foi que, com o tempo, Tron alcançou um certo status cult de alcance limitado e restrito a saudosistas e a curiosos sem nunca realmente chegar a gozar de uma espécie de veneração universal como aconteceu, por exemplo, com Blade Runner, do mesmo ano e com o mesmo grau de receptividade original.

Tron nos conta a história de Kevin Flynn (um jovem Jeff Bridges) que invade a rede de computadores da empresa da qual foi expulso, com a ajuda de Alan Bradley (Bruce Boxleitner). Ao contrário do que se pode imaginar, TRON não é um programa criado por Kevin Flynn, mas sim por Alan e ele é um coadjuvante na trama. Quando criança, lembro-me que tive dificuldades de entender o porquê do titulo do filme ser Tron, já que o programa criado por Flynn – o protagonista – chamava-se CLU. Acontece que, depois de uma tentativa frustrada de hackear os computadores da empresa com CLU, Flynn invade fisicamente o local e acaba sendo lançado para dentro da “grade”, ou seja, para dentro do programa de computador comandado por Master Control. Lá, Flynn, um usuário, tem que se aliar aos programas TRON e YORI (o avatar de Lori, vivida por Cindy Morgan) para derrotar Master Control e seu comandado (que pensa que manda) Sark (o avatar de Ed Dillinger, vivido por David Warner).

É no mundo eletrônico que vemos as já antológicas sequências com as motos de luz (lightcycles) e da luta gladiatorial com os discos na arena. Vemos, também, as luminosas roupas dos programas que, na verdade, foram pintadas a mão, quadro a quadro, diretamente no celuloide, pelos técnicos em efeitos especiais. São efeitos que, hoje, acabam não se sustentando, mas que precisam ser avaliados com os olhos da época para que seja possível perceber o quão fascinante e importante eles foram para a Sétima Arte até que Hollywood decidiu extrapolar e usar a computação gráfica como bengala criativa de grande maioria de seus blockbusters atuais.

Tron, vale lembrar, tem o grande trunfo de ser o primeiro filme a usar computação gráfica em larga escala. Só para se ter uma ideia da magnitude, a produção estava tão a frente de seu tempo que ela chegou a ser desqualificada do prêmio de melhores efeitos especiais na cerimônia do Oscar, pois a computação gráfica, da maneira como empregada, efetivamente criando sequências inteiras sem qualquer fotografia tradicional, foi considerada uma forma “ilegal” de se fazer efeitos. Incrível, não?

Mas o grande problema de Tron, que o leva para a categoria de filmes que não sobreviveram bem sua década,  é mesmo o roteiro de Steven Lisberger, que também dirigiu o filme. Lisberger, que antes nunca fizera e depois nunca viria a fazer nada de artisticamente relevante, escreve uma história que parte de uma ótima ideia e não a desenvolve. Os personagens são rasos e clichês ao ponto de eles não gerarem empatia. A ação é genérica, destacando-se única e exclusivamente pelo visual então inédito, nada mais. A estrutura narrativa é também lenta e descompassada, mesmo considerando que a fita é relativamente curta. Não se percebe um trabalho para engajar o espectador além do visual deslumbrante que, não demora, cansa. As motivações de Master Control, Ed Dillinger e Kevin Flynn nunca são exatas ou mesmo bem construídas ou de alguma maneira geradoras de excitação ou senso de urgência e perigo. É o clássico exemplo da preponderância da forma sobre o conteúdo, o que seria ótimo se Tron fosse um curta-metragem experimental de 15 minutos.

No entanto, mesmo com seus incuráveis problemas, ninguém pode tirar de Tron seu lugar no panteão de filmes memoráveis simplesmente porque foram muito além de seu tempo. Falar de mundos virtuais, vidas dentro de computadores, avatares e computação gráfica em 1982 é algo impressionante sob qualquer ponto de vista e, por essa razão, Tron merece uma saudação.

Tron – Uma Odisseia Eletrônica (TRON, EUA – 1982)
Direção: Steve Lisberger
Roteiro: Steven Lisberger
Elenco: Jeff Bridges, Bruce Boxleitner, David Warner, Cindy Morgan, Barnard Hughes, Dan Shor, Peter Jurasik, Tony Stephano
Duração: 96 min.

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