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Crítica | Twin Peaks – The Return: Part 15

por Luiz Santiago
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E tudo tem a ver com ELETRICIDADE, não tem? Para quem assistiu ao filme Os Últimos Dias de Laura Palmer (1992) certamente há referências e elementos simbólicos que estão torando a parte final deste retorno uma boa mistura de nostalgia e revelações de um grande plano das coisas, como já era de se esperar vindo da mente de Lynch e Frost nos roteiros. Aliás, a eletricidade é um ponto referencial na filmografia de Lynch, sempre aparecendo ligada a três coisas distintas, porém, relacionadas: mudanças de estado de um corpo (normalmente marcado pela relação vida-morte); grandes transformações de comportamento de alguém ou aparição de uma força/personagem até então desconhecido e que torna tudo ainda mais misterioso e, de certa forma, ameaçador.

Mesmo que este 15º episódio não tenha sido tão bom quanto o anterior e tenha se contentado com falsos avanços — a rigor, a história não avança em praticamente nada… vemos apenas a movimentação de alguns personagens, mas suas ações não nos dizem nada mais sólido em relação ao tema central, ao contrário, adiciona ainda mais mistério, a esta altura do campeonato, como no caso da estranha conversa do Sr. C com Phillip Jeffries, agora em forma de chaleira gigante — as indicações de retorno ou apontamentos para o futuro são realmente marcantes, o que não será nada espantoso que alguns espectadores perdoem os tropeços do enredo e abracem com todo o carinho possível este episódio, elevando-o a um status bem mais alto do que ele realmente merece.

O que de fato esta Parte 15  tem de destaque é o nível de elementos macabros que cercam Twin Peaks e alguns personagens. Neste sentido, entendemos que Lynch quis dar um passo atrás no desenvolvimento do plano maior e resolveu estacionar um pouco para mostrar caminhos maiores pelos quais cada um dos blocos dramáticos da série deverão seguir. Aí colocaríamos o caso de Nadine/Ed e, logo em seguida, Ed/Norma, enfim, juntos. Mas o verdadeiro impacto que temos no capítulo, algo que realmente me fez lacrimejar, foi a belíssima sequência com a Senhora do Tronco, que se despede de nós, sendo essa despedida ainda mais intensa se levarmos interação que a atriz morreu pouco tempo depois de ter gravado as suas cenas e que ela e Lynch, após terem conversado muito, resolveram usar a inevitável partida que viria — a atriz já estava em uma luta que sabia perdida contra o câncer — como algo também dentro da arte.

David Lynch conhecia Catherine E. Coulson desde que trabalharam juntos no curta O Amputado (1974), mas a grande amizade entre os dois começou mesmo três anos depois, quando filmaram Eraserhead, onde ela trabalhou como assistente de direção e de câmera. Foi nos intervalos, brincadeiras e conversas que tiveram durante as filmagens que os dois criaram o conceito de uma história onde uma mulher normal (“a mulher mais normal de uma cidade“) carregava um pequeno tronco de árvore nos braços, para onde quer que fosse. Quatorze anos depois isso daria origem à Senhora do Tronco, personagem por quem Lynch tinha enorme carinho, não apenas por ser interpretada por uma amiga, mas também porque ele via a Senhora do Tronco como uma conexão harmônica entre os dois mundos de Twin Peaks. É por isso que a partida da personagem foi tratada com imenso respeito, não só no significado mas no encadeamento do texto, interpretações e direção (a cena do telefonema e principalmente a cena em que Hawk anuncia a morte da personagem são soberbas).

Aqui vemos voltar também a Loja de Conveniências de um posto de gasolina abandonado, um portal para um dos Lodges que já havíamos visto na Parte 8, mas agora mostrado com uma verdadeira funcionalidade, não apenas como contemplação inútil. O encontro entre o Sr. C e o Jeffries-chaleira traz à tona o mistério sobre outra personagem de Os Últimos Dias de Laura Palmer: Judy. Assim como Bill, procurado por Audrey, temos Judy, procurada pelo Sr. C, uma caçada que certamente nos trará o afunilamento de todos os blocos para um único lugar, como era de se esperar.

Com Dougie colocando o garfo na tomada (então ele vai acordar como Cooper? É isso mesmo, produção? Antes tarde do que nunca, não é mesmo?) parece que os episódios seguintes da série serão de encontros e de um número bem maior de ação, com as respostas vindo aos borbotões, o que também era o temor de qualquer pessoa equilibrada que viu o número de 18 episódios e achou que um diretor incrível como David Lynch iria usar essa oportunidade para explorar um drama metafísico de maneira orgânica, usando muito bem cada momento. Não foi o caso, mas parece que ainda assim, as coisas deverão funcionar bem no encerramento. Veremos.

Twin Peaks – The Return (3ª Temporada): Part 15 (EUA, 20 de agosto de 2017)
Direção: David Lynch
Roteiro: Mark Frost, David Lynch
Elenco: Kyle MacLachlan, Jay Aaseng, Joe Adler, Mädchen Amick, Dana Ashbrook, Owain Rhys Davies, Eamon Farren, Sherilyn Fenn, Jay R. Ferguson, Patrick Fischler, Robert Forster, Nathan Frizzell, Harry Goaz, Michael Horse, Caleb Landry Jones, Jennifer Jason Leigh, Peggy Lipton, James Marshall, Everett McGill, Clark Middleton, John Pirruccello, Kimmy Robertson, Wendy Robie, Tim Roth, Rodney Rowland, Harry Dean Stanton, J.R. Starr, Naomi Watts, Nae
Duração: 54 min.

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