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Crítica | Um Homem Chamado Ove

por Ritter Fan
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estrelas 2,5

Ainda que a classificação de um filme como “Sessão da Tarde” não necessariamente carregue conotação negativa, a expressão também é comumente aliada a obras poucos ousadas e que são capazes de agradar a todos indistintamente. Em muitos casos, porém, essa maneira de se enxergar um filme leva à conclusão de que é uma obra mediana ou medíocre na acepção original do adjetivo. Um Homem Chamado Ove é exatamente isso: um filme que provavelmente agradará a todos, mas que jamais sai de sua zona de conforto, entregando exatamente o que se espera dele.

E, de novo, essa característica não é ruim em si, mas se o espectador espera alguma coisa mais do que personagens arquetípicos, situações clichê e níveis altos de sacarina, é melhor passar longe do candidato sueco ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 2017 (e que também concorre à estatueta na categoria Melhor Maquiagem e Cabelo). Por outro lado, se o que se procura é um feel good movie que toca em todas as teclas na ordem correta, sem desafinar, então Um Homem Chamado Ove pode ser uma boa pedida.

Quando a projeção começa, vemos Ove (Rolf Lassgård), um senhor solitário, carrancudo e rabugento seguindo seu imutável ritual diário. Obcecado em manter a ordem no condomínio de casas em que vive, ele verifica cada mínimo detalhe, como lixo no chão, carros mal estacionados, bicicletas largadas, o estado de placas de “proibido” e assim por diante. Se alguém fala com ele, a resposta é, invariavelmente, uma patada seguida de um “dar de costas” que chega a ser engraçado. Mas não há nada verdadeiramente cômico na vida deste homem, que sente muito a falta de sua esposa falecida. Suas tentativas de suicídio para encontrar-se com ela marcam os momentos em que ou somos apresentados a um novo status quo no condomínio, notadamente uma nova família que se muda para a casa em frente a dele ou a um flashback lidando com um trecho importante de sua vida desde os sete anos de idade.

E, assim, a narrativa caminha, aos poucos revelando a rota seguida por Ove até tentar se matar e, também, que, muito diferente do que vemos no início, ele tem é um grande coração. O roteiro de Hannes Holm, que também dirigiu o filme, é baseado no primeiro romance do escritor sueco Carl Fredrik Backman, de 2012, e não esconde nada do espectador, trabalhando absolutamente todos os clichês do gênero em sucessão metódica como o próprio Ove. É como se Holm tivesse seguido um checklist: tem tragédia familiar, jovem simpático e bobalhão (Ove vivido por Filip Berg), encontro romântico atrapalhado, família contagiante, causas nobres e assim por diante. Se, por um lado, o espectador não terá absolutamente nenhuma surpresa e os que forem um pouco mais escolados serão capazes até de prever exatamente cada sequência da obra logo antes de ela começar, por outro esse “conforto” em se sentir no controle absoluto da progressão narrativa tem suas recompensas.

As atuações de Lassgård e de Berg são simpáticas e convincentes, com os dois atores esforçando-se para realmente parecerem duas versões da mesma pessoa. Bahar Pars, que vive Parvaneh, a extremamente grávida imigrante vizinha de Ove, mãe de duas filhas lindas, é a alegria em pessoa, em franco e por vezes engraçado contraste com a o cenho fechado de Lassgård. Ida Engvoll, por sua vez, agradavelmente vive Sonja, a amada esposa do protagonista que é vista em flashback desde a inusitada forma que se conhecem. Todas as peças estão onde devem estar e cumprem bem suas respectivas funções ao longo das longas quase duas horas de rabugices de Ove.

Até mesmo a direção de Holm não tenta ir além do necessário para nos passar um ar familiar. Mas não se enganem, pois seu trabalho é inegavelmente cuidadoso e delicado, inserindo os flashbacks em momentos corretos que contribuem para a fluidez da história, ainda que ele carregue demais na trilha sonora intrusiva que tenta estabelecer a forma como o espectador deve sentir-se. Sua composição de quadros merece também comenda, emprestando um pouco um ar quase teatral ao que vemos desenrolar diante de nossos olhos. A fotografia de Göran Hallberg, também responsável por O Centenário Que Fugiu Pela Janela e Desapareceu, trabalha com tons muito claros, emprestando um ar asséptico – e monótono – à vida de Ove que aos poucos vai ganhando cores mais fortes, mas nunca exagerando. Vê-se uma tentativa óbvia em trabalhar dentro de parâmetros quase universais para comover o espectador, sem carregar excessivamente no melodrama rasgado, ainda que ele esteja presente.

Mas Holm não sabe quando parar. Ao tentar inserir um sub-texto de inclusão social em sua obra, ele acaba forçando demais a narrativa. Funciona bem a inclusão orgânica de Parvaneh, mas a história pregressa de seu amigo que se tornou rival e especialmente a história paralela do amigo gay do entregador de jornal do condomínio, que entra e sai da trama em um piscar de olhos, são mal trabalhadas e acabam pesando no arco de Ove e na duração da projeção, que passa, então, a ser efetivamente sentida. Um pouco mais de economia e um passo mais apressado na montagem de Fredrik Morheden talvez tivessem minorado esses problemas.

Um Homem Chamado Ove é agradável o suficiente para aquecer corações, mas insípido demais para realmente ter um significado além do que se percebe em seu valor de face. Certamente uma boa Sessão da Tarde, mas daquelas que o espectador não parará para assistir novamente se aparecer quando estiver trocando de canais.

Um Homem Chamado Ove (En Man Som Heter Ove, Suécia – 2015)
Direção: Hannes Holm
Roteiro: Hannes Holm (baseado em romance de Carl Fredrik Backman)
Elenco: Rolf Lassgård, Bahar Pars, Filip Berg, Ida Engvoll, Tobias Almborg, Klas Wiljergård, Chatarina Larsson, Börje Lundberg, Stefan Gödicke, Johan Widerberg, Anna-Lena Brundin, Nelly Jamarani, Zozan Akgün, Viktor Baagøe
Duração: 116 min.

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