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Crítica | Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência

por Luiz Santiago
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O super hypado Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência, filme vencedor do Leão de Ouro no Festival de Veneza em 2014, conclui uma trilogia sobre a humanidade realizada por Roy Andersson, cujas obras anteriores são Canções do Segundo Andar (2000) e Vocês, os Vivos (2007). Apostando na linha do absurdo cotidiano, na comédia de humor negro e na fragilidade da vida, o diretor faz aqui um filme que tenta marcar território o tempo inteiro, reafirmando ideias que já haviam ficado claras para o espectador nos primeiros minutos da projeção. Essa repetição e o olhar viciado para suas próprias entranhas são alguns dos elementos que fazem a fita, que poderia sim ser sensacional, apenas uma obra mediana sobre a existência humana. E dito isto, algo que certamente desagradará aos que viram aqui uma obra-prima, vamos olhar mais de perto.

Roy Andersson citou duas grandes referências para a escrita do roteiro de Um Pombo… A primeira, mais estética, foi o quadro Os Caçadores na Neve (1565), de Pieter Bruegel, o velho. A segunda, mais dramática, foi o filme Ladrões de Bicicleta (1948), de Vittorio De Sica. A estas fontes inspiradoras, o cineasta adicionou a miséria da existência humana a um cenário onde cabe política, filosofia, sociologia e até crítica social, a mais contundente feita à mineradora sueca Boliden AB, na cena em que [SPOILER!] as pessoas são queimadas vivas dentro de um cilindro, uma referência do diretor ao desastre protagonizado pela empresa no Chile, em meados dos anos 1980.

Olhando assim, parece-nos que a obra é um sensacional retrato íntimo do nosso cotidiano. Mas as coisas não funcionam exatamente desta forma no filme. A obra possui um início bastante peculiar – não podemos culpar ninguém por não apreciar o estilo descontínuo do diretor – e um desenvolvimento curioso, mas entre esta metade e o final, as coisas parecem se sobrepor em camadas da mesma tinta. As situações dentro das casas e apartamentos e uma certa catchphrase são os pontos principais desta repetição desnecessária. O próprio filme nos mostra que é possível explorar de maneira inovadora o marasmo que toma conta de certas fases de nossas vidas, mas isso aqui é levado a um nível praticamente insuportável. Há humor, há conteúdo, mas do início ao final, temos o em tela o mais estranho exercício de tema e variações que eu vi no cinema da última década.

E o problema nem é necessariamente a montagem arrastada e a direção de Roy Andersson, que, ao lado de seu diretor de fotografia, optou por planos fixos e cores patéis/desbotadas em todas as cenas, dando um ar de envelhecimento precoce ou morte para algo que deveria estar vivo. Veja como esse padrão é expandido para o comportamento dos “protagonistas” do longa. Os maneirismos, as falas pela metade, os tons mortos, o andar lento… a maioria das coisas parece arrastar-se sobre um filete de vida e viver este pouco que resta com o máximo de patetismo possível. Isso tem um valor enorme para a obra, é claro, e eu adoraria ver como Roy Andersson, que certamente é um grande diretor, dirigiria isso se não quisesse finalizar sua trilogia com esquetes quase siamesas de uma mesma unidade dramática.

Talvez o filme tenha agradado pelo seu ar de novidade e pela coragem do diretor. Mesmo que ele não tenha um estilo fácil de ser degustado por todo mundo, é visível para qualquer um que alumas partes da obra merece destaque. Mas eu sou da escola que diz que não é de pequenas partes boas que se faz um filme bom, mas sim de um conjunto uníssono de partes boas. Mesmo que o diretor impusesse aqui a sua cadência alinear, sua desconexão para os fatos narrados e seus absurdos, encontros com a morte e estranhamentos, tudo faria sentido se a obra se fechasse bem, sem o bater incessantemente em uma tecla dentre tantas que poderiam ser batidas ao longo da trama.

Minha sessão de Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência foi uma das mais sonolentas que tive desde Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas (2010). Parecia que o tal pombo do título pousava sobre o fio narrativo da fita toda vez que ela deveria decolar e, ao invés de refletir, fazia o que o pombo faz de mais inconveniente em ambientes urbanos, lá de cima de seus fios e beiradas de prédios. É muito potencial jogado fora. O que me faz pensar como este filme seria se não repetisse praticamente a mesma ideia durante 101 minutos… Provavelmente o animal do título seria outro. E o número de bocejos e sensações de déjà-vu durante a sessão também.

Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência (En duva satt på en gren och funderade på tillvaron) — Suécia, Alemanha, Noruega, França, 2014
Direção: Roy Andersson
Roteiro: Roy Andersson
Elenco: Holger Andersson, Nils Westblom, Viktor Gyllenberg, Lotti Törnros, Jonas Gerholm, Ola Stensson, Oscar Salomonsson, Roger Olsen Likvern
Duração: 101 min.

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