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Crítica | Um Verão Escaldante

por Luiz Santiago
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estrelas 2

Philippe Garrel é autor de uma filmografia peculiar. Longe do chavão crítico que essa afirmação possa ter, tal peculiaridade se dá nas intenções legítimas do diretor em mostrar de forma seca e quase documental a indecisão, a flutuação do caráter e do amor através do tempo, o medo do insignificante e do desconhecido, o prazer obtido a custo de sacrifício próprio ou coletivo, a corda bamba de vidas dependentes de amor. Embora sempre inserido em um contexto político e social muito específico, seus filmes propõem o trânsito livre entre o ideológico e o patológico, com propensão de maior destaque para a segunda categoria. Ao ver um filme de Philippe Garrel, o espectador precisa esperar sofrer com a falta de respostas, exatamente como sofrem as personagens de seus filmes.

Em Um Verão Escaldante (2011), os elementos caros ao cineasta e muito recorrentes em sua filmografia marcam presença. Temos abundância de silêncios, planos de detalhe aparentemente injustificáveis (o objeto merece maior destaque que o patetismo amoroso de seus indivíduos à beira de um precipício emotivo), e história curiosa, feita de retalhos dramáticos. Mas aqui, há uma diferença: esses retalhos não estão bem costurados. O prólogo doloroso que abre Um Verão Escaldante e a frase lúgubre logo no início são eficientes em construir um clima de apocalipse morno e marasmo inquietantes. Ao passo que as relações de musa-e-artista & amizade-e-amor se desenrolam, percebemos que o filme declina em sua estrutura básica, que é juntar esses pedaços satisfatoriamente e criar um significado universal para a obra. Seria leviano dizer que o roteiro não consegue ao menos um pouco se ajustar à proposta, mas a mínima parte que consegue, se perde mediante ao fastio de vida que toma a película do meio para o final.

Nesse mesmo sentido, os setores técnicos acabam padecendo da mesma doença: não conseguem dar conta do amargor que o próprio roteiro cria. Há, por exemplo, uma falha e demasiada atenção à não-narração, uma proposta que Garrel sustenta, ao tentar mapear a imagem e seu impacto sobre o espectador. E exatamente por isso a história não funciona. Ela titubeia entre a narração e não-narração, tem dúvida do que dizer ao certo, confunde-se em seus propósitos e não se desenvolve satisfatoriamente.

No núcleo, Louis Garrel e Jérôme Robart sustentam com muita competência suas personas… amigos de inclinações políticas distintas e modelos diferentes de encarar a vida e o amor e o matrimônio. Diria até que são como Apolo e Dionísio. Monica Bellucci esbanja beleza, mas seu trabalho resume-se a umas poucas cenas boas. O restante é apenas a boa aplicação do ar blasé que enverniza qualquer cena com um toque de incomunicabilidade. Todavia, o grandioso problema de todo o elenco é Céline Sallette. Há momentos em que é impossível saber se a personagem está chorando, rindo, fazendo careta, sofrendo alguma dor misteriosa ou apenas fingindo atuar. É lamentável que o diretor tenha deixado passar esse tipo de “atuação” em um papel de tamanha importância para o filme.

Entre más resoluções do roteiro, fotografia pouco apurada (um pecado em se tratando de Philippe Garrel) e elenco dividido entre boas e péssimas atuações, Um Verão Escaldante decepciona até o mais positivo dos espectadores. Vindo de quem veio e com a intenção que tinha, era para o filme fazer o público sair ardendo da sala de cinema, mas o máximo que consegue é nos causar uma língua amarga e um olhar de tédio no final de tudo.

Um Verão Escaldante (Un Été Brûlant, França, Itália, Suíça, 2011)
Direção: Philippe Garrel
Roteiro: Marc Cholodenko, Philippe Garre, Caroline Deruas-Garrel
Elenco: Louis Garrel, Monica Bellucci, Céline Sallette, Jérôme Robart, Vladislav Galard, Vincent Macaigne, Maurice Garrel
Duração: 95 min.

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