Home FilmesCríticasCatálogos Crítica | Uma Cidade que Surge

Crítica | Uma Cidade que Surge

O mundo encantador do faroeste.

por Felipe Oliveira
465 views

Embora John Wayne fosse um dos nomes mais fortes quando se falava do western, à medida que o famigerado No Tempo das Diligências, de John Ford, nascia – e seria tido mais tarde como referência no gênero – no auge da era dourada do cinema, um concorrente quase imbatível, um risco à altura do seu estrelato, entrava para o nicho clássico em Uma Cidade que Surge. Naquele momento, Errol Flynn era um galã em estourando em Hollywood, passeando em várias categorias da filmografia de Michael Curtiz, o que gerou um burburinho de dúvidas nos executivos da Warner quando Flynn não se desfez do bigode fino – nem mesmo na pele Robin Hood – para viver um mocinho super atraente, de pele lisinha, bronzeada e muita vaidade no clima quente e empoeirado no Velho Oeste.

Dodge City foi um daqueles filmes que fez um compêndio do gênero a que pertence, porém, sendo ele o responsável por servir de modelo para reprodução da fórmula, e com charme inegável, tanto que Curtiz fez do longa um exemplar ilustre, empolgante no seu seu visual de cores estonteantes enquanto originava os tropos do western com paixão. Para quem não era familiarizado – uma chance mínima – com o gênero, Uma Cidade que Surge valia como uma viagem que atravessava todos os traços característicos que definiram esse gênero clássico; para o público fiel, a película funcionava como uma atração que reafirmava o que era aspecto fundamental no cinema faroeste da maneira mais divertida possível, a começar pela chegada das ferrovias, o que Curtiz lançava a luz do humor com uma corrida contrapondo o embate entre o conservadorismo e as novas ideias: o trem trazendo os empresários que iriam inaugurar a cidade que nomeia o filme e ao lado, a diligência.

Mesmo tendo o humor como uma ferramenta para a trama, de forma “leve”, Curtiz introduziu um dos tópicos-base para o funcionamento da mola moral da história, isso, para os tropos da figura sensata de Wade Hatton (Flynn). Assim, Curtiz tratou os elementos que tange a mitologia do cinema western de maneira inocente, superficial, sem deixar se tornar o foco da sua abordagem que transitava em blocos teatrais, estereótipos dramáticos, romance e lutas maniqueístas. Do mesmo modo rápido com que a co-protagonista, Abbie (Olivia de Havilland) surgia na narrativa, com os eventos que a insere sendo imediatos – a morte do irmão inconsequente -, Curtiz apresentava aquele universo e criava os conflitos para os rumos do roteiro de maneira objetiva, sem sacrificar o sentido do contexto – iniciar o filme em 1866, um ano após o fim da Guerra Civil Americana e com os sulistas migrando para a fronteira, e avançar para 1872, com o idealismo de uma cidade moralista e honesta ofuscado.

A escolha de seguir uma estrutura movimentada repleta de blocos envolvendo os personagens, permitia Curtiz a navegar pela narrativa de maneira ágil, exercitando um excelente timing enquanto entrava e saía de cenas românticas, breves trechos dramáticos ou nos desastres cômicos que o braço direito de Hatton, Rusty (Alan Hale) se metia. Essa característica pouco aprofundada caia também sobre o protagonismo de Errol Flynn, que era difícil de convencer como um cowboy e depois xerife, mas tinha um carisma o suficiente que tornava Dodge City um entretenimento, brincando com as nuances chave do western. De toda forma, tinha em Hatton uma análise de personagem que aos poucos ia cumprindo seu destino como o homem cortez ideal para colocar ordem na babilônia do Velho Oeste.

O ápice para a transformação de Hatton como um homem do gado para xerife, é ao ver o garotinho órfão que interagia com a comunidade e sonhava ser um agente da lei, ser vítima da violência banal. O evento em si, além de ter um paralelo sobre a jornada de Hatton, é o que marca a formação da figura heroica do protagonista, agora motivado pela compaixão, nobreza e senso de justiça para vencer um velho inimigo da fronteira: Jeff Surrett (Bruce Cabot). Mesmo com um esquema melodramático calculado sendo posto, com os conflitos e resoluções instantâneos, Curtiz não perdia de vista a capacidade de continuar divertindo com seu western categórico e charmoso refletindo o processo de civilização.

Acompanhando o sentimento encantador desse exemplar do cinema faroeste, a fotografia de Sol Polito pedia por uma atenção extra com toda a vitalidade que destacava o cenário do Velho Oeste com as paletas de cores ricas em technicolor. Mesmo com a incredulidade em torno de seu astro principal, Uma Cidade que Surge superou as expectativas, se tornando o esqueleto-base para a fórmula dos filmes de cowboys, ainda que tivesse sido uma típica história romântica do herói personificado de Wyatt Earp, com seu bigode aparadinho e fininho.

Uma Cidade que Surge (Dodge City – EUA,1939)
Direção: Michael Curtiz
Roteiro: Robert Buckner
Elenco: Errol Flynn, Olivia de Havilland, Ann Sheridan, Bruce Cabot, Alan Hale, Frank McHugh, John Litel, Henry Travers, Henry O’Neill, Victor Jory, Bobs Watson
Duração: 104 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais