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Crítica | Vikings – 4ª Temporada: Parte 1

por Daniel Tristao
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  • spoilers. Leia as críticas das demais temporadas da série aqui.

Devo confessar que não esperava nada além do que Vikings já havia mostrado. Claro, a série é boa e muita coisa legal aconteceu até aqui, mas o salto de qualidade que vi neste ano foi uma grande e bem vinda surpresa. Quando terminei de assistir fiquei realmente estupefato, como até então não havia ficado em nenhum momento da série. Temos uma história com ritmo ágil (assim como no primeiro ano), excelentes personagens, plot twists sensacionais e ótimas referências históricas, tudo funcionando em harmonia para presentear o público com a melhor temporada até o momento.

O mais novo ano da série dos devotos de Odin reúne tudo que de melhor já passou por aqui desde o episódio de estreia de uma forma orgânica e crescente. Orgânica porque a trama flui naturalmente, sem forçação de barra, com os personagens tomando decisões e rumos coerentes, mas sem serem óbvios; e crescente porque a cada episódio a tensão aumenta, gradativa e ininterruptamente, culminando num incrível episódio de encerramento antes da pausa de meio de ano.

Isso mesmo, pausa, porque agora Vikings possui temporada de vinte episódios (dez a mais do que as anteriores) dividida em dois períodos de lançamento, um no primeiro e outro no segundo semestre, seguindo o mesmo formato de outras séries de sucesso. Inicialmente torci o nariz e pensei “já vão querer encher linguiça”, mas me surpreendi ao perceber que essa primeira parte ficou excelente. E um ponto positivo é que funciona como uma temporada completa: de certa forma autocontida, sem enrolação pra estender a história além do necessário e com ganchos sensacionais para a segunda parte. Se continuar assim, melhor para os fãs, que terão de esperar menos para acompanharem a continuidade da saga.

Se nas temporadas 2 e 3 critiquei algumas decisões de roteiro, agora não tenho do que reclamar. Tudo encaixadinho e com a história bem amarrada, pode não ser perfeito (e não é), mas nada que salte aos olhos ou que se sobressaia em relação aos acertos. Se antes os deslizes eram razoáveis com bons acertos, agora os deslizes são mínimos com acertos enormes!

O que chama atenção é a habilidade do roteirista Michael Hirst em conduzir diversas subtramas de maneira consistente, desenvolvendo os personagens suficientemente bem para que o público se interesse por tudo o que vê na tela. Esta capacidade encontra agora um elevado nível de maturidade, que podemos observar na forma como estas subtramas se interligam e evoluem, e também no resgate de elementos abordados anteriormente e deixados para utilização posterior.

Veja, por exemplo, como aos poucos nós podemos perceber que não só o corpo de Ivar é defeituoso, mas há também um problemático aspecto psicológico envolvido, alimentado pelo seu ambiente familiar. Ainda recém-nascido, Ragnar quase o sacrificou por causa de sua deficiência física, sendo impedido por Aslaug; em diversas cenas vemos Ragnar sem paciência, demonstrando certo desgosto pelo seu estado, enquanto Aslaug é superprotetora; ele tem dificuldade para interagir com outras crianças, inclusive se envolvendo num incidente que leva uma delas à morte; Aslaug, mais tarde, abre mão de educá-lo na religião viking, confiando a Floki tal tarefa (estranho não?). Há aqui elementos que me fazem lembrar o filme Precisamos Falar Sobre Kevin, principalmente no comportamento dos pais, que no filme é um fator chave e interfere diretamente na conduta do filho. Tudo isso ao longo de vários episódios, desde temporadas anteriores. Não sei se o personagem vai de alguma forma possuir traços semelhantes ao Kevin do filme, pois ainda o veremos interagir com seus pais durante sua adolescência e vida adulta, mas as deixas foram plantadas.

Outro exemplo é a questão da religiosidade, que sempre foi tema bastante presente na história (falei mais sobre isso na crítica da primeira temporada), mas agora vemos claros sinais de fragmentação da fé em personagens importantes. Rollo e Ragnar aparentemente romperam seus laços de fé com a religião nórdica para abraçar princípios cristãos. Rollo por puro oportunismo; ele não buscou este caminho, mas viu no matrimônio com Gisla uma ótima oportunidade para finalmente sair da sombra do irmão. E Ragnar, por sua vez, aprendeu muito com Athelstan, inclusive a valorizar outras culturas e estilos e vida. Isso leva o personagem, em alguns momentos, a sugerir que está cansado da vida de guerreiro. A visão que teve às margens do Sena indica um desejo interno de levar uma vida pacífica e dedicada à sua família. Ou ainda, seu vício no remédio dado por Yidu é claramente uma forma de fuga da realidade, um breve momento no qual consegue ficar alheio às responsabilidades de sua vida de rei.

Além disso, incrível como ninguém pode confiar em ninguém. Seja irmão, amigo, esposa, pai, filho, tanto faz, o que vale mesmo é a luta pelo poder (salvo pouquíssimas e interessantes exceções). Se você não confia em alguém, não pense duas vezes, planeje logo a morte desse indivíduo e evite problemas futuros. Esta é a lógica de Vikings. E isso abre muitas possibilidades, pois tudo pode mudar e o espectador não consegue ter certeza de nada. Michael Hirst inteligentemente explora este aspecto (agora mais ainda do que em temporadas passadas), mas sempre apoiado numa ótima história e em personagens muito críveis e bem trabalhados. Isso faz com que as reviravoltas da trama não sejam puros caprichos, pelo contrário, fazem sentido e têm muito peso dramático.

No elenco quem rouba a cena é Alexander Ludwig no papel de Bjorn. Seu personagem vinha ganhando cada vez mais espaço desde a segunda temporada e agora o ator encontrou o tom ideal; ele convence facilmente sendo um exímio guerreiro, duro, sisudo, sempre de cara fechada e que ao mesmo tempo vive em constante busca pela aprovação do pai, tentando mostrar seu valor. Na verdade, eu vejo este aspecto mais como uma tentativa de provar algo a si mesmo; talvez Bjorn queira se convencer de que é digno de ser filho de Ragnar, pai que ele tanto adora e tem como exemplo, apesar de alguns desentendimentos. Inclusive, sua relação com o pai é uma das exceções em relação à confiança (pelo menos por enquanto, haha). O personagem mudou e amadureceu bastante após a partida de Porunn, seu primeiro interesse amoroso, e isso ficou evidente ao espectador; fruto do bom trabalho do ator, que soube dar cadência a Bjorn, sem apressar tais mudanças de uma cena pra outra.

Mas a cereja do bolo é mesmo o episódio final, que encerra os principais dilemas apresentados e cria excelentes desdobramentos a serem explorados na segunda parte. Parece que Hirst deixou para este episódio tudo de mais legal que o público aguardava (além de surpresas adicionais), só pra nos deixar com o coração na mão. Não vou entregar o que acontece, mas adianto que é realmente excelente, valeu a pena ter assistido a quase 40 episódios para chegar até aqui.

Fora isso, esta bateu o recorde de cenas memoráveis por temporada. Lembro-me de pelo menos umas cinco que dificilmente ficariam de fora de um ranking de melhores da série. Não vou elencá-las aqui porque algumas são do final, seria spoiler demais, mas deixem nos comentários as suas preferidas.

Vikings – Season 4 (Canadá/ Irlanda, 2016)
Criador/ Roteirista: Michael Hirst
Direção: Ken Girotti, Ciaran Donnelly, Jeff Woolnough, Helen Shaver
Elenco: Travis Fimmel, Katheryn Winnick, Clive Standen, Gustaf Skarsgård, Alexander Ludwig, Linus Roache, Alyssa Sutherland, Amy Bailey, Moe Dunford, Georgia Hirst, Jennie Jacques, Morgane Polanski, Ben Robson, Owen Roe, Dianne Doan, Kevin Durand, Lothaire Bluteau
Duração: 43 min por episódio
Episódios: 10 (primeira metade da temporada)

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