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Crítica | Whity (1971)

por Luiz Santiago
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A história de Whity se passa nos Estados Unidos, em 1878. O personagem-título, vivido por Günther Kaufmann, é filho bastardo de um rancheiro nada escrupuloso e vive em um ambiente onde um de seus irmãos e sua madrasta tentam se livrar o mais rápido possível do patriarca para gozarem da herança. Paralelamente, o relacionamento de Whity com uma cantora e prostituta do saloon (vivida por Hanna Schygulla, estonteante, como sempre) ganha contornos sociais na obra e aparece como o segundo ponto de um roteiro que não tem intenção nenhuma de contar uma história com corpo identificável e lógica dramática. Whity é, acima de tudo, um assalto criativo a um gênero cinematográfico, um filme inacabado sobre relações de poder e sexo no Velho Oeste.

Desde a cena de abertura, duas coisas saltam aos olhos do espectador. A primeira é a construção de um set com várias tendências de estilo, como o vitoriano, o kitsch-barroco e o básico do western, cada um deles com uma fotografia sutilmente distinta e paleta de cores próprias, com exceção da onipresença do vermelho em algum ponto dos cenários. A segunda é a ausência de um critério fixo para que a história seja desenvolvida. O público é jogado de lá para cá em um interessante mar de imagens e situações que sabe ter ligação entre si mas que não são, a rigor, exploradas pelo diretor, como se o filme fosse uma ‘leitura diagonal’ de um determinado período na vida da família Nicholson.

Mas essa estrutura solta não é necessariamente negativa. Através dela, podemos enxergar de maneira diferente o mundo do faroeste americano, algo bem diferente das comédias satíricas realizadas sobre o gênero, mesmo as mais críticas como Banzé no Oeste e Lemonade Joe. É claro que versões críticas e questionadoras do gênero já foram feitas fora da comédia, como El Topo e Une Aventure de Billy le Kid, por exemplo, mas o caso de Whity não reside unicamente na contestação. Fassbinder escolhe alguns elementos da existência humana e trabalha com suas diversas possibilidades, ridicularizando ou exagerando a maior parte delas na tela.

A música de Peer Raben ajuda a formular a aparência de pluralidade de gêneros, adicionando tons teatrais à fita. É interessante observarmos que as canções entoadas pela prostituta Hanna não parecem números fora do enredo. Como o roteiro já carrega o encadeamento de crônica, a inserção das canções aparecem de forma orgânica nas sequências do saloon, que também ganha abordagens diferentes cada vez que Fassbinder resolve trazê-lo novamente para a tela.

Com maquiagem pesada, figurinos anacrônicos, maneirismos, perversões e manipulação de eventos ou características históricas e culturais, Whity é um filme que dificilmente agradará aos que não estão familiarizados com o trabalho de Fassbinder (especialmente sua relação jamais interrompida com o teatro), e pode escandalizar aos que não conseguem ver o western “fora da caixa”. A direção de Fassbinder é louvável, especialmente em espaços internos, e seu roteiro conceitualmente falho consegue um resultado final bem mais interessante do que obras ditas bem acabadas por aí. Whity é um filme incompleto, mas suas interrogações alcançam notáveis respostas se o espectador se deixar respondê-las honestamente e dentro do “assalto de gênero” que deve ser respondido.

Em tempo: o filme foi rodado, em parte, em Almería, na Espanha, o paraíso dos diretores que resolviam fazer westerns na Europa (Sergio Leone que o diga). A cena final, com Günther Kaufmann e Hanna Schygulla dançando no deserto, esperando morrerem de sede, geralmente deixa alguns espectadores em dúvida se é algum lugar da Alemanha ou não.

Whity (Alemanha Ocidental, 1971)
Direção: Rainer Werner Fassbinder
Roteiro: Rainer Werner Fassbinder
Elenco: Günther Kaufmann, Ron Randell, Hanna Schygulla, Katrin Schaake, Harry Baer, Ulli Lommel, Tomás Martín Blanco, Stefano Capriati, Elaine Baker, Mark Salvage, Helga Ballhaus
Duração: 95 min.

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