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Fora de Plano #08 | Raça de Víboras

por Luiz Santiago
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O apóstolo S. João não estava para brincadeira. Fosse um espertinho se batizar sem a devida preparação, logo vinha o belo discurso repreensivo e um bom número de apelidos. “Filhos de serpente” e “raça de víboras” são os meus favoritos.

O apóstolo era uma espécie de filtro entre dois estágios da vida de uma pessoa. Para que o indivíduo pudesse passar adiante era necessário “produzir frutos dignos”.

Produzir. Frutos. Dignos.

A metáfora bíblica pode não ser a mais lembrada, mas nos fazer pensar. E muito. Porque de filhos de serpente e raça de víboras o mundo está cheio. Gente que não deveria estar lá (ou aqui), mas está.

É possível encontrar essas espécies escondidas em repartições públicas, atrás dos guichês e dos telefones, atendendo mal e reclamando de como tudo está ruim demais. É possível vê-las reclamando nas redes sociais que tem um cachorro ganindo de dor em frente a uma casa, mas elas são boas demais para sair da sala e ajudar. Basta fingir que se importam na rede, com posts fofos e hashtags revolucionárias. Como políticos de todas as espécies. Aspirantes a estadistas. E pessoas que terceirizam culpas.

Deveria haver um S. João Batista em todo óvulo no momento da fecundação. O espermatozoide candidato só passava para o próximo nível se tivesse a possibilidade de produzir frutos dignos. Assim, nos veríamos livres de alguns tipos bem dispensáveis de seres humanos, alguns deles com sensibilidade tão comprometida e afetada que até uma ironia lhes soa como ofensa. Ou que poderiam desenvolver distúrbios ético-morais de toda ordem durante a vida, como é o caso dos racistas. Preconceituosos patológicos. Fanáticos religiosos. Eleitores de candidatos bandidos. Caloteiros e traidores. Pessoas que acham que sabem cantar e escrever. Mulheres e homens mal amados. Pessoas que brigam no metrô. Divas iludidas.

A tal raça de víboras serpenteia devagar por entre os humanos, disfarçada de parceira, de sócia, de colega de trabalho. Finge substituir alguém antes de arrancar-lhe o cargo de maneira infame. Ou se chamam cristãs mas vivem gritando aos vários ventos que queriam que tais e tais grupos de pessoas morressem, afinal de contas, faz todo sentido professar uma fé de um fundador pacifista e pregar a morte de seus filhos espirituais não é mesmo?

Mas acima de tudo, a raça de víboras não reconhece erros e nunca se arrepende. Esta é uma parte da metáfora que eu ocultei no início. Produzir frutos como um egoísta que se clama dono da verdade por todo o tempo, de nada adianta. É um trabalho de sabor amargo. O reconhecer de uma falha e assumir de uma fraqueza dá toda a dignidade necessária àquilo que alguém produz na vida. E dá ainda mais força para brigar quando não há pelo que se arrepender.

Mas não são todos os que entendem quando é um momento ou outro. Quando um lugar ocupado temporariamente não é seu. Quando deve-se pagar o que se deve, falar o que se pensa, achar o momento certo para cada coisa, olhar pra trás e avaliar o que se fez da vida. Esta é a grande diferença entre homens e víboras. Um grupo realmente faz. Já o outro…

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