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Crítica | Os Assassinos, de Ernest Hemingway

por Luiz Santiago
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plano critico quadro hooper

estrelas 4,5

Escrito em 1926 e publicado apenas um ano depois, Os Assassinos é um dos contos mais conhecidos e queridos do escritor americano Ernest Hemingway. Adaptada diversas vezes para os cinemas, a obra aborda de forma clara e direta a violência urbana e a posição de um determinado indivíduo diante da morte iminente. A história tem um tom claustrofóbico, mas é mascarada por uma narrativa ágil, com diálogos sarcásticos, quase cômicos.

Ao entrarem no restaurante, os dois assassinos não gritam ou ameaçam imediatamente o proprietário e o outro cliente do local. Há uma interação quase amigável na conversa que se segue. Eles fazem um pedido e provocam o proprietário, deixando clara certa animosidade, mas mesmo assim, desprovida de tom e atitudes agressivas. Aliás, a ação mais agressiva que temos no conto está entre o negro cozinheiro e Nick Adams na cozinha, enquanto os assassinos esperam pelo sueco, a vítima anunciada.

Hemingway pinta de normalidade toda a ação transcorrida no restaurante. George, o proprietário, chega a rir das atitudes de Al e Max, os assassinos. Nem durante e nem depois da espera cheia de tensão temos o indício de alguma surpresa frente a atitude dos criminosos. Todos aceitam essa abordagem e a ameaça de morte a um cliente como se fizesse parte do cotidiano da cidade, uma cidade quente e “cheia de gente espertinha“, segundo a dupla.

O autor estampa uma realidade evidente nos Estados Unidos ao final dos anos 1920: a existência da Lei Seca (o proprietário do restaurante chega a dizer que tem cerveja sem álcool e, quando provocado por um dos assassinos, como se estivesse escondendo o que realmente tinha pra beber, ele reafirma: só tem o que eu disse) e a livre circulação e ação da máfia. Esta opressão dos marginais é tão grande sobre a população que o próprio sueco marcado para morrer se entrega passivamente a esse destino, como se nada que ele fizesse fosse livrá-lo da possibilidade de ser morto.

A essas questões, temos ainda a posição do cenário externo ao restaurante, que também mantém uma característica claustrofóbica. Lemos que se trata de uma noite escura e os caminhos pouco convidativos percorridos por Nick Adams quando vai contar ao sueco o que acontecera no restaurante corroboram essa visão de opressão do local sobre as pessoas. Talvez seja por isso que o pessimismo contido dos últimos diálogos dão conta de que talvez a morte não seja tão ruim assim….

Os Assassinos nos mostra uma realidade social tensa trabalhada de maneira bastante leve pelo autor, mas que na verdade, esconde uma prisão a céu aberto, onde algumas pessoas conseguem se virar melhor que outras. A lei dos fortes impera e é sob essa lei que temos a definição de quem vive ou quem morre – a preocupação do proprietário em saber o que aconteceria com o negro cozinheiro ou com todos eles, depois que assassinassem o sueco, é um bom exemplo disso.

Hemingway faz um trabalho muito interessante com esses personagens à margem, e lhe basta um pequeno cenário e pouco mais de uma hora na vida de todos eles para fincar uma reflexão sobre o que é viver num lugar onde não se tem controle sobre a própria vida. Todos seriam perdedores, derrotados à espera de um destino fatal? Bem, não necessariamente. É claro que há a intenção de mostrar uma existência pessimista, mas o destino das coisas é posto em suspensão, cabendo ao leitor definir o que acontece ao sr. Ole Anderson e, por tabela, a todas as outras personagens próximas a ele.

Os Assassinos (The Killers) — EUA, 1927
Publicação original: Scribner’s Magazine
Autor: Ernest Hemingway
15 páginas

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